segunda-feira, 19 de junho de 2023

SEGUNDO BIMESTRE - AULA 20 DE TÓPICOS DE CIÊNCIAS HUMANAS DO SEGUNDO ANO: O POVOAMENTO DE GOIÁS E AS MIGRAÇÕES: AS COMUNIDADES QUILOMBOLAS (Prof. José Antônio Brazão.)

  

SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA/SECRETARIA DE EDUCAÇÃO

COMANDO DE ENSINO POLICIAL MILITAR

 CEPMG - VASCO DOS REIS

Divisão de Ensino / Coordenação Pedagógica


SEGUNDO BIMESTRE

AULA 20 DE TÓPICOS DE CIÊNCIAS HUMANAS DO SEGUNDO ANO:

 O POVOAMENTO DE GOIÁS E AS MIGRAÇÕES: AS COMUNIDADES QUILOMBOLAS (Prof. José Antônio Brazão.):

Há diferentes comunidades quilombolas e indígenas espalhadas pelo Brasil afora, inclusive em Goiás. Essas comunidades são remanescentes (descendentes) de diferentes comunidades de negros e tribos de índios que se formaram no decurso dos séculos anteriores, particularmente a partir do período colonial brasileiro (séculos XVI a XVIII) e também nos períodos imperial e republicano.

Para suprir a necessidade de força de trabalho, a fim de atender a demanda (cobrança, exigência, pedido) constante de madeira, açúcar, especiarias e outros produtos que eram levados daqui para a metrópole portuguesa, empregou-se, inicialmente, a força de trabalho dos índios e, na sequência e até concomitantemente, a força dos negros africanos, homens e mulheres.

O sofrimento imposto sobre esses povos foi terrível: espancamentos, chicotadas, uso de instrumentos de tortura, chegando ao extremo do assassinato, em alguns casos, no intuito de dar exemplo aos demais escravizados. Houve tribos indígenas que foram dizimadas, literalmente, tendo suas terras ocupadas por gente da metrópole daqueles tempos e fazendeiros posteriores. Por exemplo: fazendas de cana de açúcar, também fazendas de café entre os séculos XIX e XX (hoje, ainda, infelizmente, com invasões a terras indígenas: fazendeiros, garimpeiros, serralheiros...).

Com o decorrer do tempo, movimentos de resistência contra a escravidão foram surgindo, como a fuga para outras regiões. No caso dos negros africanos, a fuga para locais onde vieram a formar os chamados QUILOMBOS (palavra proveniente do idioma africano banto, significando: “local de descanso ou local para acampamento”, segundo a Folha de São Paulo, de 24 de março de 2023), ou seja, comunidades de negros escravos fugidos. Muitas dessas comunidades foram destruídas pelos escravizadores, mas algumas resistiram e continuam existindo, através de seus descendentes, até hoje – sendo, justamente, as comunidades chamadas quilombolas.

Tanto as aldeias indígenas quanto as comunidades quilombolas têm um modo próprio de tratar a natureza e o mundo que as rodeia. Em muitas delas, não marcadas pela cobiça desvairada do capital, a convivência com a natureza é até muito positiva. Índios e negros quilombolas, neste caso, buscam tratar bem a natureza em suas terras, sabendo que dali tiram e tirarão os alimentos e o materiais necessários à sua vida. Essa convivência é um exemplo vivo de como se pode produzir bem sem, obrigatoriamente, ficar destruindo o meio ambiente a todo tempo.

Há, com certeza, muito que aprender com esses grupos humanos.

Em GOIÁS, a comunidade quilombola KALUNGA tem um destaque especial. Veja-se como ela surgiu:

“Na região norte e nordeste de Goiás se formaram vários quilombos entre os séculos 18 e 19. Em sua maior parte eram escravos fugitivos das minas de ouro que abundavam nas redondezas. Estes formaram comunidades autossuficientes que permaneceram isoladas por muito tempo em regiões remotas e de difícil aceso. Os quilombos registrados na região foram os de Acaba Vida, Muquém e Papuã (Niquelândia, GO), Forte (São João d'Aliança, GO), Mesquita (Luziânia, GO), Pilar (Goiás) e Kalunga (Cavalcante, Teresina e Monte Alegre). O estado de Goiás ainda teve outros quilombos, sendo que o Quilombo do Cedro, em Mineiros, oeste do estado, existe ainda hoje e também foi reconhecido como território quilombola.

O Quilombo Kalunga foi o maior e mais importante da região. Aos habitantes foi dado o nome de Kalunga ou Calunga, que na língua banto - uma das diversas línguas africanas que eram faladas pelos negros trazidos na diáspora, principalmente de Angola, Congo e Moçambique - significa lugar sagrado e de proteção.

A formação do Quilombo remonta ao início do século 18. Em 1722, com a ocupação das terras do planalto central e a criação do estado de Goiás por bandeirantes descendentes de Portugueses, em pleno ciclo de ouro e da garimpagem, começaram a ser trazidos para o estado de Goiás milhares de escravos negros provenientes da costa da África Ocidental para servir de mão de obra na mineração. O trabalho árduo e a violência a que eram submetidos gerava constante resistência, revoltas e fugas para locais de difícil acesso, como fundos de vale, serras e morros, onde os que conseguiam escapar se organizavam em locais que foram chamados de Quilombos.

Uma vez fugidos, nos Quilombos, os escravos se abrigavam para se defender da escravidão, resgatar a cosmovisão africana e os laços familiares perdidos. Assim iniciou-se a formação dos quilombos no município de Cavalcante, onde encontraram o local com todas as condições necessárias para o estabelecimento da comunidade.

‘O povo Kalunga tinha ali um território com clima, fauna e flora apropriado e retirava quase tudo que precisavam da natureza.’ (Dona Lereci, Kalunga, moradora de Cavalcante e da comunidade Engenho II).

Na década de 1980, a pesquisadora Mari de Nasaré Baiocchi, da Universidade Federal de Goiás, mapeou quase toda a região onde habitava o povo Kalunga e o seu modo de vida. A partir deste momento começou a movimentação pelo reconhecimento da comunidade como território tradicional. A área foi reconhecida em 1991 pelo Governo do Estado de Goiás como sítio histórico e patrimônio cultural Kalunga, que também é reconhecido como parte do patrimônio histórico e cultural do Brasil.” (PORTAL TIERRA. ESTUDO DE CASO - Comunidade Quilombola Kalunga. Disponível em: < https://porlatierra.org/docs/a72dac0268841fe42cab6fe0380d039d.pdf > Acesso em 17/06/2023.)

O próprio nome Kalunga, assim como quilombo, lembra origem africana, indicando a presença de negros vindos a África e trazidos para Goiás, na época colonial, mais especificamente entre os séculos XVIII e XIX. Como se pode ver no texto, não foi o único, mas que tem grande destaque pela área que ocupa. Quilombo é o local de descanso, de acampamento (ver citação acima), sem dúvida: diante da realidade que os negros viviam nas fazendas e na mineração aurífera, com espancamentos e sofrimentos os mais variados possíveis, a revolta levou um número significativo de negros escravos a fugirem.

Os quilombos eram, sem dúvida, locais de descanso para eles, podendo conviver livremente com membros de sua raça, buscar resgatar seus antigos valores religiosos, terra para que pudessem caçar, plantar, pescar e realizar outras atividades para mantimento do agrupamento que, progressivamente, foi-se formando.

Com certeza, isto incomodou muito as autoridades, que se empenharam em destruir quilombos. Aqueles que eram mais bem escondidos e difíceis de se encontrar podiam ainda ter alguma condição de sobrevivência. O quilombo de Palmares, no Pernambuco, só para lembrar, havia sido totalmente destruído, arrasado.

O fato de ainda continuarem existindo comunidades quilombolas em Goiás, ainda hoje, assinala que esses quilombos não foram destruídos, conseguindo sobreviver, ainda que com dificuldades, em diversos momentos, e ainda hoje com desafios, permitindo que sua cultura viesse a permanecer.  Inclusive, conhecimentos provenientes do contato com o mundo natural e do entendimento das plantas e dos animais.

De acordo com Maria Geralda de Almeida, pesquisadora:

O conhecimento é rico principalmente de plantas medicinais e de alimentos. A presença de raizeiros produzindo garrafadas para mais diversos usos ainda é comum. Ao longo do ano, conforme a ‘época’ se encontram frutos como: caju-do-mato, araticum, a cagaita, pequi, baru, jatobá, buriti entre outros. Os frutos possuem principalmente uma importância para o consumo familiar, a despeito da existência de uma crescente demanda pela indústria de sementes ricas em proteínas, sorvetes e de picolés. Ainda do cerrado retiram a madeira para construções diversas e lenha para fogão.

A partir dessa leitura da biodiversidade entende-se que o Cerrado, conjuntamente aos seus habitantes, é rico em diversidade biológica, mas também de populações com identidades ligadas diretamente a esse bioma. Na região também estão povos indígenas, grandes pecuaristas, os investidores em grãos como a soja e o arroz e, a cana-de-açúcar. Esse é um ‘palco de territorialidades sociais e culturais, um mosaico em constante construção e revitalização’, afirmam Borges e Almeida (2009, p. 203). Nessa compreensão, um exemplo de povo, com os quilombolas, os Kalunga, como são denominados aqueles afrodescendentes, é apresentado. Eles, também, são populações tradicionais.” (ALMEIDA, Maria Geralda de. Comunidades tradicionais quilombolas do nordeste de Goiás: quintais como expressões territoriais. Disponível em: < https://journals.openedition.org/confins/11392 > Acesso em 17/06/2023. Grifos meus.)

Como se pode perceber da leitura dos trechos acima, de Maria Geralda de Almeida, a presença dos quilombolas, em Goiás, carrega consigo um grande aprendizado, secular, fruto de muitas observações e experimentações, além do aprendizado no contato com comunidades indígenas que em Goiás já viviam há muito tempo.

Enfim, como se pode ver, a migração negra, forçada pela escravidão, no Brasil e, particularmente, em GOIÁS, apesar de tudo que os negros passaram, permitiu que pudessem formar comunidades, como os quilombos, que trariam um conhecimento a mais, a ampliar, significativamente, a CULTURA GOIANA. Os seus descendentes aprofundaram os conhecimentos trazidos da África pelos primeiros pais escravizados e contribuem, ainda hoje, com a construção cultural de Goiás e do próprio Brasil.

Outro ponto importante, a convivência do ser humano com a natureza. No caso dos quilombos de Goiás, a convivência dos antigos escravizados e de seus descendentes existentes contemporaneamente com o cerrado, convivência nascida dos desafios impostos pelo meio ambiente. Os desafios e as necessidades, junto com as condições disponíveis, fizeram com que cada comunidade se empenhasse para conhecer a realidade natural, com ela estabelecendo uma relação que vai além da dominação, fundada no respeito, na boa convivência, extraindo e aproveitando adequadamente os recursos naturais, no intuito de se poder produzir a vida material e transmitir o necessário à vida das gerações futuras, tanto do passado para os atuais, como destes para com os descendentes que virão.

REFERÊNCIAS BÁSICAS:

ALMEIDA, Maria Geralda de. Comunidades tradicionais quilombolas do nordeste de Goiás: quintais como expressões territoriais. Disponível em: < https://journals.openedition.org/confins/11392 > Acesso em 17/06/2023.

PORTAL TIERRA. ESTUDO DE CASO - Comunidade Quilombola Kalunga. Disponível em: < https://porlatierra.org/docs/a72dac0268841fe42cab6fe0380d039d.pdf > Acesso em 17/06/2023.

RIBEIRO, Tayguara. O que significa a palavra quilombo? São Paulo, Folha de São Paulo, 24/03/2023. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2023/03/o-que-significa-a-palavra-quilombo.shtml#:~:text=A%20palavra%20quilombo%20tem%20origem,descanso%20ou%20local%20para%20acampamento. > Acesso em 17/06/2023.)

 

 

 

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