COMANDO DE
ENSINO POLICIAL MILITAR
CEPMG -
VASCO DOS REIS
Divisão de
Ensino / Coordenação Pedagógica
SEGUNDO BIMESTRE
AULA 20 DE TÓPICOS DE CIÊNCIAS HUMANAS DO
SEGUNDO ANO:
Há diferentes comunidades
quilombolas e indígenas espalhadas pelo Brasil afora, inclusive em Goiás. Essas
comunidades são remanescentes (descendentes) de diferentes comunidades de
negros e tribos de índios que se formaram no decurso dos séculos anteriores,
particularmente a partir do período colonial brasileiro (séculos XVI a XVIII) e
também nos períodos imperial e republicano.
Para suprir a necessidade
de força de trabalho, a fim de atender a demanda (cobrança, exigência, pedido)
constante de madeira, açúcar, especiarias e outros produtos que eram levados
daqui para a metrópole portuguesa, empregou-se, inicialmente, a força de
trabalho dos índios e, na sequência e até concomitantemente, a força dos negros
africanos, homens e mulheres.
O sofrimento imposto
sobre esses povos foi terrível: espancamentos, chicotadas, uso de instrumentos
de tortura, chegando ao extremo do assassinato, em alguns casos, no intuito de
dar exemplo aos demais escravizados. Houve tribos indígenas que foram
dizimadas, literalmente, tendo suas terras ocupadas por gente da metrópole
daqueles tempos e fazendeiros posteriores. Por exemplo: fazendas de cana de
açúcar, também fazendas de café entre os séculos XIX e XX (hoje, ainda,
infelizmente, com invasões a terras indígenas: fazendeiros, garimpeiros,
serralheiros...).
Com o decorrer do tempo, movimentos de resistência contra a escravidão foram surgindo, como a
fuga para outras regiões. No caso dos negros africanos, a fuga para locais onde
vieram a formar os chamados QUILOMBOS (palavra proveniente do idioma africano
banto, significando: “local de descanso ou local para acampamento”, segundo a Folha de São
Paulo, de 24 de março de 2023), ou seja, comunidades de negros escravos
fugidos. Muitas dessas comunidades foram destruídas pelos
escravizadores, mas algumas resistiram e continuam existindo, através de seus
descendentes, até hoje – sendo, justamente, as comunidades chamadas
quilombolas.
Tanto as aldeias
indígenas quanto as comunidades quilombolas têm um modo próprio de tratar a
natureza e o mundo que as rodeia. Em muitas delas, não marcadas pela cobiça
desvairada do capital, a convivência com a natureza é até muito positiva.
Índios e negros quilombolas, neste caso, buscam tratar bem a natureza em suas
terras, sabendo que dali tiram e tirarão os alimentos e o materiais necessários
à sua vida. Essa convivência é um exemplo vivo de como se pode produzir bem
sem, obrigatoriamente, ficar destruindo o meio ambiente a todo tempo.
Há, com certeza, muito
que aprender com esses grupos humanos.
Em GOIÁS, a comunidade
quilombola KALUNGA tem um destaque especial. Veja-se como ela surgiu:
“Na região norte e nordeste de Goiás se formaram
vários quilombos entre os séculos 18 e 19. Em sua maior parte eram escravos
fugitivos das minas de ouro que abundavam nas redondezas. Estes formaram
comunidades autossuficientes que permaneceram isoladas por muito tempo em
regiões remotas e de difícil aceso. Os quilombos registrados na região foram os
de Acaba Vida, Muquém e Papuã (Niquelândia, GO), Forte (São João d'Aliança,
GO), Mesquita (Luziânia, GO), Pilar (Goiás) e Kalunga (Cavalcante, Teresina e
Monte Alegre). O estado de Goiás ainda teve outros quilombos, sendo que o
Quilombo do Cedro, em Mineiros, oeste do estado, existe ainda hoje e também foi
reconhecido como território quilombola.
O Quilombo Kalunga foi o maior e mais importante da
região. Aos habitantes foi dado o nome de Kalunga ou Calunga, que na língua
banto - uma das diversas línguas africanas que eram faladas pelos negros
trazidos na diáspora, principalmente de Angola, Congo e Moçambique - significa
lugar sagrado e de proteção.
A formação do Quilombo remonta ao início do século
18. Em 1722, com a ocupação das terras do planalto central e a criação do
estado de Goiás por bandeirantes descendentes de Portugueses, em pleno ciclo de
ouro e da garimpagem, começaram a ser trazidos para o estado de Goiás milhares
de escravos negros provenientes da costa da África Ocidental para servir de mão
de obra na mineração. O trabalho árduo e a violência a que eram submetidos
gerava constante resistência, revoltas e fugas para locais de difícil acesso,
como fundos de vale, serras e morros, onde os que conseguiam escapar se
organizavam em locais que foram chamados de Quilombos.
Uma vez fugidos, nos Quilombos, os escravos se
abrigavam para se defender da escravidão, resgatar a cosmovisão africana e os
laços familiares perdidos. Assim iniciou-se a formação dos quilombos no
município de Cavalcante, onde encontraram o local com todas as condições
necessárias para o estabelecimento da comunidade.
‘O povo Kalunga tinha ali um território com clima,
fauna e flora apropriado e retirava quase tudo que precisavam da natureza.’
(Dona Lereci, Kalunga, moradora de Cavalcante e da comunidade Engenho II).
Na década de 1980, a pesquisadora Mari de Nasaré
Baiocchi, da Universidade Federal de Goiás, mapeou quase toda a região onde habitava
o povo Kalunga e o seu modo de vida. A partir deste momento começou a
movimentação pelo reconhecimento da comunidade como território tradicional. A
área foi reconhecida em 1991 pelo Governo do Estado de Goiás como sítio
histórico e patrimônio cultural Kalunga, que também é reconhecido como parte do
patrimônio histórico e cultural do Brasil.” (PORTAL
TIERRA. ESTUDO DE CASO - Comunidade
Quilombola Kalunga. Disponível em: < https://porlatierra.org/docs/a72dac0268841fe42cab6fe0380d039d.pdf >
Acesso em 17/06/2023.)
O próprio nome Kalunga,
assim como quilombo, lembra origem africana, indicando a presença de negros
vindos a África e trazidos para Goiás, na época colonial, mais especificamente
entre os séculos XVIII e XIX. Como se pode ver no texto, não foi o único, mas
que tem grande destaque pela área que ocupa. Quilombo é o local de descanso, de
acampamento (ver citação acima), sem dúvida: diante da realidade que os negros
viviam nas fazendas e na mineração aurífera, com espancamentos e sofrimentos os
mais variados possíveis, a revolta levou um número significativo de negros
escravos a fugirem.
Os quilombos eram, sem
dúvida, locais de descanso para eles, podendo conviver livremente com membros
de sua raça, buscar resgatar seus antigos valores religiosos, terra para que
pudessem caçar, plantar, pescar e realizar outras atividades para mantimento do
agrupamento que, progressivamente, foi-se formando.
Com certeza, isto
incomodou muito as autoridades, que se empenharam em destruir quilombos.
Aqueles que eram mais bem escondidos e difíceis de se encontrar podiam ainda
ter alguma condição de sobrevivência. O quilombo de Palmares, no Pernambuco, só
para lembrar, havia sido totalmente destruído, arrasado.
O fato de ainda
continuarem existindo comunidades quilombolas em Goiás, ainda hoje, assinala
que esses quilombos não foram destruídos, conseguindo sobreviver, ainda que com
dificuldades, em diversos momentos, e ainda hoje com desafios, permitindo que
sua cultura viesse a permanecer.
Inclusive, conhecimentos provenientes do contato com o mundo natural e
do entendimento das plantas e dos animais.
De acordo com Maria Geralda de Almeida, pesquisadora:
“O conhecimento é rico
principalmente de plantas medicinais e de alimentos. A presença de raizeiros
produzindo garrafadas para mais diversos usos ainda é comum. Ao longo do ano,
conforme a ‘época’ se encontram frutos como: caju-do-mato, araticum, a cagaita,
pequi, baru, jatobá, buriti entre outros. Os frutos possuem principalmente uma
importância para o consumo familiar, a despeito da existência de uma crescente
demanda pela indústria de sementes ricas em proteínas, sorvetes e de picolés.
Ainda do cerrado retiram a madeira para construções diversas e lenha para
fogão.
A partir dessa leitura da biodiversidade entende-se que o Cerrado,
conjuntamente aos seus habitantes, é rico em diversidade biológica, mas também
de populações com identidades ligadas diretamente a esse bioma. Na região
também estão povos indígenas, grandes pecuaristas, os investidores em grãos
como a soja e o arroz e, a cana-de-açúcar. Esse é um ‘palco de
territorialidades sociais e culturais, um mosaico em constante construção e
revitalização’, afirmam Borges e Almeida (2009, p. 203). Nessa
compreensão, um exemplo de povo, com os quilombolas, os Kalunga, como são
denominados aqueles afrodescendentes, é apresentado. Eles, também, são
populações tradicionais.” (ALMEIDA, Maria
Geralda de. Comunidades tradicionais quilombolas do nordeste de Goiás: quintais como
expressões territoriais. Disponível em: < https://journals.openedition.org/confins/11392 > Acesso em 17/06/2023. Grifos meus.)
Como se pode perceber da leitura dos trechos acima,
de Maria Geralda de Almeida, a presença dos quilombolas, em Goiás, carrega
consigo um grande aprendizado, secular, fruto de muitas observações e
experimentações, além do aprendizado no contato com comunidades indígenas que
em Goiás já viviam há muito tempo.
Enfim, como se pode ver, a migração negra, forçada
pela escravidão, no Brasil e, particularmente, em GOIÁS, apesar de tudo que os
negros passaram, permitiu que pudessem formar comunidades, como os quilombos,
que trariam um conhecimento a mais, a ampliar, significativamente, a CULTURA
GOIANA. Os seus descendentes aprofundaram os conhecimentos trazidos da África
pelos primeiros pais escravizados e contribuem, ainda hoje, com a construção
cultural de Goiás e do próprio Brasil.
Outro ponto importante, a convivência do ser humano
com a natureza. No caso dos quilombos de Goiás, a convivência dos antigos
escravizados e de seus descendentes existentes contemporaneamente com o cerrado,
convivência nascida dos desafios impostos pelo meio ambiente. Os desafios e as
necessidades, junto com as condições disponíveis, fizeram com que cada
comunidade se empenhasse para conhecer a realidade natural, com ela
estabelecendo uma relação que vai além da dominação, fundada no respeito, na
boa convivência, extraindo e aproveitando adequadamente os recursos naturais,
no intuito de se poder produzir a vida material e transmitir o necessário à
vida das gerações futuras, tanto do passado para os atuais, como destes para
com os descendentes que virão.
REFERÊNCIAS BÁSICAS:
ALMEIDA, Maria Geralda de. Comunidades tradicionais quilombolas do nordeste de
Goiás: quintais como expressões territoriais.
Disponível em: < https://journals.openedition.org/confins/11392 > Acesso em 17/06/2023.
PORTAL
TIERRA. ESTUDO DE CASO - Comunidade Quilombola Kalunga. Disponível em:
< https://porlatierra.org/docs/a72dac0268841fe42cab6fe0380d039d.pdf > Acesso em 17/06/2023.
RIBEIRO, Tayguara. O que significa a palavra quilombo? São Paulo, Folha de São Paulo, 24/03/2023. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2023/03/o-que-significa-a-palavra-quilombo.shtml#:~:text=A%20palavra%20quilombo%20tem%20origem,descanso%20ou%20local%20para%20acampamento. > Acesso em 17/06/2023.)
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