terça-feira, 24 de novembro de 2009

CIÊNCIA MODERNA 2 - Resumo e comentário de um vídeo ilustrativo. Prof. José Antônio Brazão.

Sistema Solar de Kepler. O universo concebido como engastado nos sólidos pitagóricos. Imagem presente em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Kepler

A órbita elíptica, como foi descoberta por Kepler. Na primeira lei de Kepler é dito que os planetas percorrem órbitas elípticas ao redor do Sol. Avanço na compreensão do movimento dos planetas e de outros astros, inclusive galáxias e cometas, do universo.
Imagem presente em: http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%93rbita



Imagem colorida das órbitas elípticas planetárias. (Presente em:
http://www.sobiologia.com.br/conteudos/Universo/sistemasolar.php)

VÍDEO COSMOS, EPISÓDIO 3: “A HARMONIA DOS MUNDOS”, de CARL SAGAN: (Resumo e comentário feitos pelo Prof. José Antônio Brazão.)
No vídeo 3 da série Cosmos, o astrônomo norte-americano Carl Sagan trata de assuntos que vão desde as diferenças entre astronomia e astrologia até as descobertas astronômicas de Johannes Kepler.
De acordo do Sagan, há dois modos de se encarar as estrelas: como elas são de fato e como gostaríamos que elas fossem. Com isto, introduz uma discussão a respeito do embate entre astronomia e astrologia. Para os astrólogos, por exemplo, o planeta Marte representa o deus da guerra, o guerreiro, afetando a vida das pessoas, para os astrônomos, por sua vez, é apenas um planeta, um local do universo que precisa ser explorado e conhecido.
A astrologia é uma pseudo-ciência muito antiga, encontrando-se até na China, na qual os astrólogos estatais que errassem previsões eram punidos severamente. A astrologia, na verdade, é um misto de ciência e misticismo, constituindo-se numa verdadeira fraude. A ciência, como a astronomia, pelo contrário, além de apresentar fatos reais e desvendar claramente os mistérios do universo, pode contribuir com a melhoria da vida.
Nossa conexão com o universo, de acordo com Sagan, é bem mais forte. No universo há regularidade, padrões e regras, conhecidos como leis da natureza. Tal regularidade despertou, no decorrer dos séculos, nos seres humanos de diferentes sociedades a busca por sua compreensão.
Em sociedades diferentes, ao longo de milênios e séculos, os seres humanos aprenderam a ver figuras nos céus, nas constelações, às quais foram dados nomes diferentes, conforme cada sociedade e cada tempo histórico. A regularidade e a previsibilidade das estrelas e dos movimentos dos astros do universo, o intercalar regular entre dia e noite, dava uma ideia de possibilidade de sobrevivência à morte. O povo anasazi, da América do Norte, por exemplo, desenvolveu um templo com um calendário cerimonial no intuito de celebrar o Sol, modelo de precisão no trabalho humano. Ademais, aprenderam a distinguir as estações e aproveitar tal distinção em seu benefício.
O templo dos anasazi tem nichos (buracos nas paredes), conformemente ao número dos dias dos meses. Para se ter uma ideia, no solstício de verão os raios do Sol atingiam um nicho específico somente nesse dia. Outros povos, como os chineses, babilônios, egípcios, de Stonehenge e das Américas, também foram observadores dos céus e desenvolveram calendários naturais. E há aparatos mais sofisticados para a observação dos céus que foram desenvolvidos ao longo dos séculos. No que diz respeito especificamente aos anasazi, apesar de terem atingido cerca de 40.000 gerações no passado, hoje não há deles senão as obras que deixaram.
Nossos ancestrais pré-históricos, bem como outros depois deles, observaram que há astros no céu que não seguem uma regularidade precisa em seu movimento. Chegou-se a acreditar que eram vivos. Os gregos os batizaram PLANETAS, que em grego quer dizer: ANDARILHOS.
No século II da era cristã, Cláudio Ptolomeu, astrônomo, matemático e astrólogo de Alexandria, desenvolveu um modelo aperfeiçoado do geocentrismo, posteriormente apoiado pela Igreja Católica durante a Idade Média. No século XVI, porém, um astrônomo polonês chamado Nicolau Copérnico, com base em observações e percepção de falhas no sistema geocêntrico, propôs o heliocentrismo. O livro de Copérnico Sobre as Revoluções dos Orbes Celestes foi posto no Índice dos Livros Proibidos e criticado duramente até mesmo por Lutero.
Tempos depois, Johannes Kepler, astrônomo e matemático alemão, veio a descobrir o real movimento dos astros ao redor do Sol. Desde bem jovem Kepler queria entender a mente de Deus, até mesmo no seminário protestante de Maulbronn, onde estudou teologia, mas também grego, latim, matemática, música e astronomia. Encontrou na geometria a imagem da perfeição e acreditava que ela preexistia à criação do mundo, na mente de um Deus matemático. Sua curiosidade era maior que o medo que tinha de Deus. Este, por sua vez, era-lhe maior do que punição, era Criador. Se a criação foi fruto da mente de um Deus matemático, o universo harmônico precisa, então, ser entendido.
Em sua juventude Kepler foi enviado para estudar na cidade alemã de Tübingen, onde um dos professores apresentou-lhe o sistema astronômico copernicano. A seguir, foi trabalhar numa cidade da Áustria, como professor. Kepler era incessantemente visitado por especulações que fazia acerca do universo. Durante certa aula, na escola em que trabalhava, ocorreu-lhe uma revelação, a de que a regularidade matemática do universo poderia ser apreendida geometricamente, com auxílio dos cinco sólidos de Pitágoras. A partir desse momento, os esforços de Kepler para entender a geometria do universo tornaram-se ainda mais intensos. No entanto, por maiores que fossem seu cálculos e estudos, não conseguia chegar a conclusões precisas. Precisava de informações mais exatas, baseadas em observações ainda mais precisas.
Tempos depois, foi convidado por Tycho Brahe, astrônomo, astrólogo e matemático dinamarquês, que, de fato, possuía informações e observações anotadas muito precisas sobre o movimento dos astros, dos planetas. Contudo, o medo da genialidade de Kepler, possível rival, fez com que Brahe, apesar de respeitá-lo imensamente, não lhe revelasse os livros em que mantinha anotadas suas precisas, exatas, observações dos céus. Sagan comenta que a ciência moderna surgiu justamente disto: da fusão entre teoria e observação.
Passados alguns meses, Brahe morreu por causa de seus excessos com comida e bebidas alcoólicas. Depois de muita insistência, Kepler acabou conseguindo da família de Tycho seus escritos. Pôde, então, realizar cálculos, corrigir falhas que havia cometido até então. Dentre as observações de Brahe, a dos movimentos do planeta Marte desconcertava Kepler, incomodando-o extremamente. Tais observações, junto com outras informações, não se adequavam a órbitas planetárias circulares. Certo dia, Kepler resolveu empregar a elipse – figura geométrica – como forma orbital. Percebeu, então, que todas aquelas observações se encaixavam perfeitamente a órbitas elípticas.
Depois de algum tempo, após calcular e recalcular, apesar de desejar órbitas circulares, perfeitas, Kepler acabou aceitando as órbitas elípticas. A partir daí, empenhou-se também em formular leis para o movimento planetário em torno do Sol. Ei-las: 1ª) Os planetas movem em elipse ao redor do Sol, que está em um de seus focos. 2ª) Os planetas percorrem áreas iguais em tempos iguais. 3ª) Os quadrados dos períodos dos planetas são proporcionais ao cubo de sua distância em relação ao Sol.
De acordo com Carl Sagan, as leis de Kepler estão presentes em todo o universo, mesmo no movimento de galáxias. Kepler a creditava que uma força mantinha os planetas em suas órbitas ao redor do Sol. O inglês Isaac Newton identificou-a, posteriormente, com a gravidade, alcançando, definitivamente, uma compreensão de como se movem os planetas.
O tempo de Kepler foi um tempo de conflitos e guerras. A mãe de Kepler, Catarina Kepler, foi presa. Kepler levou seis anos para conseguir libertá-la.
Kepler escreveu também um livro de ficção científica, intitulado DE SOMNIUM (O Sonho), a fim de popularizar a ciência. Kepler imaginou barcos que viajariam até a Lua e como os seres que ali viviam.
Kepler, levado pela crença na perfeição de Deus, esperava que o universo fosse circular e que se encaixasse nos sólidos perfeitos. No entanto, levado pelos fatos, acabou aceitando a veracidade das descobertas que fez, de um universo cujos astros se movimentam elipticamente, segundo leis precisas.
O que há de interessante no vídeo-documentário de Sagan é a riqueza de detalhes e informações referentes ao assunto estudado e apresentado: primeiramente a distinção entre astronomia e astrologia, a seguir o surgimento progressivo da astronomia moderna e, ao final, um enfoque particular sobre a pessoa de João Kepler, suas ideias e suas descobertas.
Na fundamentação das diferenças entre astronomia e astrologia, Sagan apresenta, inclusive, textos de jornais referentes aos signos das pessoas, verificando que as informações neles contidas a respeito de Libra e de outros signos não batem, comprovando que a astrologia é uma pseudo-ciência, uma falsa ciência, mais dada à fraude que à verdade. Por sua vez, a astronomia baseia-se em observações e cálculos precisos, obtendo conclusões que são universais, que servem para qualquer lugar tanto no espaço quanto no tempo.
Para mostrar a regularidade do universo em que vivemos, Sagan lança um toco de madeira para cima, que cai, normal e regularmente, no chão. Sagan fala da regularidade que pode ser observada no movimento dos astros, que permite a passagem de dia e noite repetidamente, dia após dia, e comenta que há padrões nos céus, como as constelações estelares. Foi e é justamente essa regularidade que permitiu e permite fazer descobertas e verificações precisas sobre o universo, que permite, em suma, fazer ciência.
Outro fato interessante no vídeo de Sagan é o modo como ele vai ao passado para buscar a compreensão atual do universo, demonstrando que a ciência tem história e que as descobertas científicas não nasceram, nem nascem, por acaso. Tais descobertas, ademais, são fruto de muito esforço, de um tremendo empenho daqueles que pesquisam e observam o universo com curiosidade, como Ptolomeu, Copérnico, Brahe e Kepler, além dos anasazi e outros povos. O esforço desses homens permitiu que tivéssemos hoje uma compreensão mais clara e precisa do universo, com destaque para Copérnico, Brahe e Kepler, modernos.
Para mostrar como funcionam os sistemas astronômicos geocêntrico ptolomaico e heliocêntrico copernicano Sagan fez uso até mesmo de aparelhos que coordenam os movimentos de planetas. Isto é interessante porque mostra o quanto instrumentos científicos fabricados pelos homens podem auxiliá-los na compreensão do mundo, acrescentar e enriquecer informações que antes eram obtidas simplesmente pela simples observação do universo. Soma-se a isto o uso rigoroso da matemática. Galileu Galilei, inclusive, expôs claramente que o universo está escrito em linguagem matemática e que, para que se possa ter uma compreensão clara e precisa dele, é preciso levar em conta tal linguagem, dominá-la e aplicá-la no estudo desse mesmo universo.
Uma outra questão que aparece, aqui e ali, no vídeo de Sagan é a do choque de teorias científicas entre si e destas com ideias e valores arraigados na tradição, fruto da própria história humana: a teoria heliocêntrica bateu direto contra a teoria geocêntrica e, com esta, contra toda uma tradição religiosa cuja base eram textos sagrados antigos, contidos na Bíblia. Ao bater-se contra a tradição científica e religiosa, o heliocentrismo bateu também diretamente contra poderes constituídos que as sustentavam, daí a razão da proibição da leitura do livro de Copérnico, que acabou sendo colocado no Index Librorum Prohibitorum (Índice dos Livros Proibidos) da Igreja.
Curiosamente, Sagan também situa a ciência moderna e, dentro dela, Kepler no tempo em que ela vai surgindo e tomando pulso: um tempo de guerras e conflitos por interesses, principalmente econômicos e políticos, os quais levaram a milhares e milhares de mortes. Com efeito, a ciência não está descontextualizada, ela se encontra, nasce e se desenvolve dentro da história humana concreta, sofrendo com seus avanços e revezes. Ao mesmo tempo, essa mesma ciência pode contribuir para a melhoria da vida humana, ideia que Sagan defende e expõe em seu vídeo. Compreender o universo e os seus mecanismos de funcionamento pode contribuir decisivamente para uma compreensão mais clara da vida humana, nele inserida e dele dependente.
Professor, professora, em sala de aula você pode trabalhar este vídeo de Carl Sagan e abrir para o debate sobre as questões que ele propõe. Explore o máximo que puder esse vídeo e a riqueza nele contida. Seus alunos, inclusive você, só terão a ganhar!