COMANDO DE
ENSINO POLICIAL MILITAR
CEPMG -
VASCO DOS REIS
Divisão de
Ensino / Coordenação Pedagógica
PRIMEIRO BIMESTRE
AULA 7 DE FILOSOFIA DOS PRIMEIROS ANOS:
CONTEÚDO: OS PRIMEIROS FILÓSOFOS GREGOS
ZENÃO DE ELEIA (séc. V a.C.): (Prof. José Antônio Brazão.)
Diálogo interdisciplinar com a Arte, a Sociologia e a História.
*Discípulo de Parmênides de Eleia.
*Defendeu as ideias de Parmênides quanto à ilusão da crença no
movimento.
*O movimento é uma ilusão.
*Para provar a tese da ilusão do movimento, Zenão apresentou quatro
argumentos. Vejamos:
ARGUMENTO 1:
“Fragmento 8 – Há quatro argumentos de Zenão sobre o movimento de
dificuldades para quem os quiser resolver. No primeiro a impossibilidade do
movimento é deduzida do seguinte modo: o móvel transportado deve atingir
primeiro a metade antes de atingir o termo (...).” (BORNHEIM, 1998, p. 63).
Um esclarecimento preliminar: argumento é uma
exposição (afirmação ou negação) que tem uma ideia ou sequência de ideias
apresentada de forma a defender, reforçar ou derrubar uma outra ideia ou
conjunto de ideias, uma teoria ou uma tese (afirmação).
A tese (afirmação) de Parmênides defendida por
Zenão, como vimos antes, é que o movimento é uma ilusão ou, como o texto acima
diz, uma “impossibilidade” (frag. 8 de Zenão de Eleia). De acordo com
Parmênides, de fato, só o caminho do SER (eterno, perfeito, esférico, imóvel,
...) é que é verdadeiro.
O argumento de Zenão para comprovar a tese de Parmênides
e sua crença na impossibilidade do movimento é que “o móvel transportado deve
atingir primeiro a metade antes de atingir o termo” (frag. 8 de Zenão de
Eleia). Como assim? Móvel é aquilo que move. Esse móvel é transportado –
carregado ou impulsionado. “Termo”, aqui, é final, indicando o final do
caminho. Entre o início do movimento e o seu “termo” (fim, ponto de chegada) há
o meio do caminho (“a metade”). Se o
movimento é o deslocamento de um lugar inicial a outro final, há uma
metade do caminho (50%). Depois dessa metade, entre ela e o fim, há uma metade
(25%). Depois desta segunda metade, há uma outra (12,5%), e assim por diante.
Ora, de acordo com o argumento, tendo o móvel que atravessar metades, ainda que
cada vez menores, jamais chegará ao fim (o “termo”). PORTANTO, isto prova que O
MOVIMENTO É IMPOSSÍVEL.
IMAGENS (Zenão de Eleia): https://en.wikipedia.org/wiki/Zeno_of_Elea
Conjunto 1 de
slides:
https://en.wikipedia.org/wiki/Zeno_of_Elea#/media/File:Zeno_of_Elea_Tibaldi_or_Carducci_Escorial.jpg
Conjunto 2 de
slides:
https://en.wikipedia.org/wiki/Zeno_of_Elea#/media/File:Zeno_Achilles_Paradox.png
ARGUMENTO 2:
Frag. 8 (contin.) – “O segundo [argumento] chama-se de Aquiles. É o
seguinte: o mais lento em uma corrida jamais será alcançado pelo mais rápido;
pois este, o perseguidor, deverá primeiro atingir o ponto de onde partiu o
fugitivo e assim o lento estará sempre mais adiantado. É o mesmo raciocínio que
o da dicotomia [divisão]: a única diferença está em que, se a grandeza
sucessivamente acrescentada estiver bem dividida, ela não o será em dois.
Conclui-se do argumento que o mais lento não será alcançado pelo mais rápido; e
isto pela mesma razão da dicotomia [divisão]: nos dois casos conclui-se pela
impossibilidade em atingir o limite, estando a grandeza de uma e mesma maneira;
mas, neste, acrescenta-se que mesmo este herói [Aquiles] em velocidade não
poderá alcançar, em sua perseguição, o mais lento [a tartaruga] (...).”
(BORNHEIM, 1998, p. 63). (O que está entre colchetes foi posto para
esclarecimento pelo Prof. José Antônio Brazão.)
IMAGEM:
https://en.wikipedia.org/wiki/Zeno_of_Elea#/media/File:Zeno_Dichotomy_Paradox_alt.png
Também:
http://filosofianodia-a-dia.blogspot.com/2014/03/
Resumindo: Aquiles, que foi um herói e corredor,
que lutou na Guerra de Troia (mencionada na Ilíada, de Homero), ao disputar
corrida com uma tartaruga, se esta der o primeiro passo, ele jamais a
alcançará. Portanto: O MOVIMENTO É ILUSÃO, É IMPOSSÍVEL.
Que absurdo! Absurdo se visto pela visão (um dos
cinco sentidos do corpo). Mas Zenão de Eleia apela para a matemática, ou seja,
para a abstração (o que está fora do nível concreto, que está a nível de
pensamento). Como assim? A matemática, como aprendemos, diz que uma reta é
constituída por infinitos pontos. Aquiles e a tartaruga correndo numa reta, com
ponto de saída e ponto de chegada (início e fim do movimento – algo parecido
com o argumento 1, mas um pouquinho diferente, por vir a apelar para frações do
espaço menores que a metade).
(Lembra a história da Lebre e a Tartaruga, ainda
que um pouco diferente também.)
Vejamos aqui uma reta constituída de infinitos
pontos, mesmo uma semirreta também é subdivisível ao infinito:
.......................................................................................
Início...................................................................Chegada.
*A tartaruga deu um passo à frente de Aquiles.
*Aquele passo é um pedaço de reta, uma semirreta.
*Aquiles tem que passar ponto por ponto para alcançar a tartaruga.
*A tartaruga dá um passo adiante.
*Aquiles tem que atravessar cada ponto desse segundo passo.
*E assim por diante.
*Como a matemática mostra, O ESPAÇO É SUBDIVÍSVEL: divisível em partes
cada vez menores, ao infinito, em frações (pedaços menores).
Deste modo, como a matemática prova, é
matematicamente impossível Aquiles alcançar a tartaruga. Portanto: O
MOVIMENTO É UMA ILUSÃO, É IMPOSSÍVEL! Parmênides acertou!
(O argumento 1 também é matemático.)
ARGUMENTO 3:
Fragmento 8 (contin.): “Estes são dois dos
argumentos. O terceiro
[argumento] (...) pretende que a flecha, em voo, esteja imóvel. Deriva-se
da suposição de um tempo composto de instantes; recusada essa hipótese [quase
tese; possibilidade], cessa o silogismo [argumento, conjunto de afirmações de
onde se tira uma conclusão].” (BORNHEIM, 1998, p. 63). (O que está
entre colchetes foi posto para esclarecimento pelo Prof. José Antônio Brazão. O
grifado e sublinhado é meu também.)
IMAGEM (na Wikipédia):
https://en.wikipedia.org/wiki/Zeno_of_Elea#/media/File:Zeno_Arrow_Paradox.png
Também: http://filosofianodia-a-dia.blogspot.com/2014/03/
Explicando:
*Um arqueiro, no dia a dia, estica o arco e lança uma flecha.
*A flecha percorre um caminho do arqueiro (A) até o alvo (B).
*Pelos olhos sensíveis (olhos do corpo) a flecha aparece como ter estado
em movimento o tempo todo, do ponto A (arqueiro) até o ponto B (alvo), tendo
parado somente ao atingir este.
*Mas Zenão pensa matematicamente.
*Entre o ponto A e o ponto B há um espaço. Ora, o espaço, na matemática,
pode ser subdivido (divido em espaços menores). Quais espaços? No caso, os
espaços compostos pelo comprimento da flecha. Cada pedaço do espaço é o
comprimento da flecha. Vejamos:
PONTO A (ARQUEIRO)-ESPAÇO 1 [FLECHA]-ESPAÇO 2[FLECHA]-ESPAÇO 3
[FLECHA]-ESPAÇO 4 [FLECHA]-ESPAÇO 5, etc. .... –ESPAÇO 20 [FLECHA] – PONTO B
(ALVO).
*Em cada espaço a flecha esteve parada, em cada instante.
*Esteve parada, num instante, no espaço 1.
*Esteve parada, num outro instante, no espaço 2.
*Esteve parada, num outro instante, no espaço 3.
*Esteve parada, num outro instante, no espaço 4.
*Nos espaços 5, 6, 7,...20.
*No alvo: parada.
*Ora, se em todos esses espaços a flecha esteve PARADA, isto indica que O MOVIMENTO NÃO EXISTE, É UMA
ILUSÃO, É IMPOSSÍVEL. Parmênides está certo.
ARGUMENTO 4:
As imagens a seguir ajudarão a entender parte do argumento 4 de Zenão.
IMAGENS (Estádio e Olímpia [cidade das Olimpíadas
antigas]):
https://pt.wikipedia.org/wiki/Est%C3%A1dio
https://pt.wikipedia.org/wiki/Ol%C3%ADmpia
Conjunto 1 de slides:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Est%C3%A1dio#/media/Ficheiro:Est%C3%A1dio_da_Luz_em_dia_de_jogo.jpg
Conjunto 2 de
slides:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Ol%C3%ADmpia#/media/Ficheiro:Olympie_Temple_Zeus.JPG
Conjunto 3 de
slides:
Conjunto 4 de
slides:
https://en.wikipedia.org/wiki/Olympia,_Greece#/media/File:Ancient_Olympia,_Greece2.jpg
Fragmento 8 (contin.): “O quarto [argumento] baseia-se no movimento em
sentido contrário de massas iguais, em um estádio, ao longo de outras massas
iguais, umas a partir do fim do estádio, outras no meio, em velocidades iguais;
pretende-se na conclusão que a metade do tempo seja igual ao seu dobro. O
paralogismo [raciocínio falso, de acordo com Aristóteles, que citou este
argumento] consiste em aceitar que uma grandeza igual move-se, com igual velocidade,
em um tempo igual, quer seja ao longo do que é movido, quer ao longo do que
está em repouso. Isto, contudo, [dirá Aristóteles], é um erro. (Aristóteles,
Física, VI, 9, 239b)” (BORNHEIM, 1998, p. 63). (O que está entre colchetes foi posto para
esclarecimento pelo Prof. José Antônio Brazão.)
VER IMAGENS EM: https://en.wikipedia.org/wiki/Zeno_of_Elea
Também: https://it.wikipedia.org/wiki/Paradossi_di_Zenone
Conjunto 1 (slides):
https://en.wikipedia.org/wiki/Zeno_of_Elea#/media/File:Zeno_of_Elea_Tibaldi_or_Carducci_Escorial.jpg
Conjunto 2 (slides):
https://it.wikipedia.org/wiki/Paradossi_di_Zenone#/media/File:Due_masse_nello_stadio_Zenone.png (Ver explicação embaixo.)
*”(...)movimento em sentido contrário de massas iguais, em um estádio,
ao longo de outras massas iguais(...)” (p. 63). No caso citado da Wikipédia,
com o estádio de futebol: os jogadores, em sentidos contrários, têm a mesma
massa (conteúdo e peso), ainda que, no desenho para ilustrar, com cores de
peles diferentes. Um se move em direção ao outro: só para lembrar, no caso do
futebol, certamente, seria para tomar a bola do outro, impedindo-o de fazer gol,
por exemplo.
https://it.wikipedia.org/wiki/Paradossi_di_Zenone#/media/File:Due_masse_nello_stadio_Zenone.png
*”(...) ao longo de
outras massas iguais, umas a partir do fim do estádio, outras no meio, em
velocidades iguais(...)” (p.63). No caso do desenho da Wikipédia, no estádio de
futebol: dois jogadores, em outra posição , mas igualmente opostos (parte dos
times adversários), no meio do caminho.
*Conclusão: “(...)pretende-se na conclusão que a metade do tempo seja igual ao seu dobro.” (p. 63). (Grifo e sublinhado meus.) A Wikipédia
mostra uma explicação interessante, através do futebol, que, vale lembrar,
não existia na Grécia Antiga:
“Na imagem, os dois corredores, A e B, correm na direção oposta: A terá,
portanto, a sensação de se mover muito mais rápido do que na realidade, ou
seja, uma velocidade igual à sua somada à do corredor B; o mesmo acontece com
B. O observador C, por outro lado, está parado e consegue perceber a velocidade
real dos dois corredores.” (WIKIPÉDIA, 2021, verbete Paradossi di Zenone [Paradoxos
de Zenão, na versão brasileira do nome dado Wikipédia italiana]. Texto
traduzido diretamente pelo Google Tradutor.)
Explicação complementar (Prof. José Antônio.): Por que os jogadores A e
B têm “a sensação de se mover
muito mais rápido do que na realidade, ou seja, uma velocidade igual à somada à
do corredor B”? Um: Porque, estando na mesma velocidade um do outro (ver o
argumento), a velocidade é somada (no caso, 10 mais 10 = 20 km/h.), dando a
impressão (sensação) de que estão correndo mais rápido em direção ao outro (no
futebol em si, um com a bola para fazer gol, o outro para impedir e tentar
fazer gol no campo adversário).
*O paralogismo (raciocínio falso): “uma grandeza
[número, valor, valor numérico, quantidade...] igual move-se, com igual
velocidade, em um tempo igual, quer seja ao longo do que é movido, quer ao
longo do que está em repouso” (p.63). Ver a explicação do futebol acima.
Conjunto 2 (slides):
https://it.wikipedia.org/wiki/Paradossi_di_Zenone#/media/File:Due_masse_nello_stadio_Zenone.png
Comentário
complementar do Prof. José Antônio:
O
que este quarto argumento quer reforçar? Além dos outros três, que os
sentidos são enganosos. Não se pode confiar neles. O movimento
percebido pelos sentidos pode enganar – para dar um outro exemplo bem atual de
móveis se movendo em direção um do outro, com massas iguais: dois carros da
mesma marca, um em direção ao outro, numa rodovia. No caso, o descuido dos
motoristas pode ser fruto dos sentidos, entre os quais, a visão – um motorista
acredita que pode sair de sua faixa para ultrapassar outro veículo, acreditando
que o carro que vem do lado oposto vem em velocidade menor, mas, na verdade,
velocidade igual. O risco de choque, portanto, será grande, mesmo porque as
velocidades terão se somado, fazendo o dobro: suponhamos que 100 km/h mais 100
km/h, dando 200 km/h. (Acreditamos que a perícia de um dos motoristas, usando a
RAZÃO e a destreza, virá, efetivamente a evitar o acidente!)
A RAZÃO matematicamente, de forma abstrata (não
concreta, a partir de que o exemplo é concreto), consegue apreender (captar) o
que os sentidos não conseguem, indo além do que estes podem mostrar. A razão
tem o poder de PENSAR, libertando-se das coisas sensíveis e elevando o
PENSAMENTO até o SER que, de acordo com Parmênides, é eterno, perfeito, imóvel,
completo, pleno (cheio) em si mesmo, esférico (completo). Como diz Parmênides
em seu poema, através da deusa Têmis: “Pensar e ser são o mesmo”.
Aristóteles, filósofo greco-macedônico, que viveu
no século IV a.C., vê o raciocínio (trabalho da razão passando de um ponto a
outro até atingir uma conclusão) de Zenão como um paralogismo, isto é, um
raciocínio enganoso. Na verdade, o que Zenão queria é levar seus leitores e
ouvintes, no caso de uma exposição oral ou textual, a perceberem o caráter
enganoso dos sentidos, que o movimento percebido pelos sentidos, principalmente
a visão, é enganoso (exemplo citado: a visão do movimento do carro B que vem na
direção oposta, que dá a falsa impressão de se poder ultrapassar e ter tempo
para voltar à faixa da estrada original do carro A).
Hoje, a teoria da relatividade de Einstein
(cientista que viveu entre os séculos XIX e XX), que fala de dois móveis (seres
em movimento) ou um em movimento e outro parado, em posições diferentes e que,
dependendo de quem vê, a percepção do tempo-espaço é diferente. Curiosamente, a
teoria de Einstein é fundamental para o sistema de GPS (Global Positioning System – Sistema Global de Posicionamento),
reunindo os movimentos relativos (relacionados um com o outro) da Terra (em
contínuo movimento) e do veículo, graças ao posicionamento de satélites.
Como se vê, os paradoxos (raciocínios incomuns) de
Zenão de Eleia, mesmo não sendo científicos no sentido atual de ciência, são
capazes de pôr a RAZÃO para trabalhar, apontando uma visão que vai além da
posição das pessoas comuns, em seu dia a dia. Apontam para a certeza e a
veracidade (caráter verdadeiro) do SER DE PARMÊNIDES, em contraposição ao
engano dos cinco sentidos (ainda que o mundo das coisas sensíveis deva ser
conhecido também, de acordo com o que diz a deusa Têmis a Parmênides) e ao
movimento (devir, vir a ser) heracliteano (como concebeu Heráclito de Éfeso). Outros
filósofos tiveram que se haver (lidar) com as posições de Heráclito e
Parmênides, entre eles, além de pré-socráticos como Leucipo e Demócrito,
especialmente Platão, que será estudado num futuro próximo.
Para mais detalhes, o livro de Gerd Bornheim é indicado.
REFERÊNCIAS:
ARANHA, Maria L. de A. e MARTINS, Maria H.
P. Filosofando: Introdução à Filosofia.
4.ed. São Paulo, Moderna, 2009.
BORNHEIM, Gerd. Os Filósofos Pré-Socráticos. 14.ed. São Paulo, Cultrix, 1998.
CHAUÍ, Marilena. Iniciação à
Filosofia. 3.ed. São Paulo, Ática, 2017.
WIKIPÉDIA. Verbetes: ZENÃO DE ELEIA,
PARADOXOS DE ZENÃO. Disponível em: < https://pt.wikipedia.org/wiki/Wikip%C3%A9dia:P%C3%A1gina_principal > Acesso em 07 de março de 2021.
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