SECRETARIA DE EDUCAÇÃO DE GOIÁS
COORDENAÇÃO
REGIONAL METROPOLITANA DE EDUCAÇÃO DE GOIÂNIA
COLÉGIO
ESTADUAL DEPUTADO JOSÉ DE ASSIS
ENSINO
MÉDIO E PROFISSIONALIZANTE – PRIMEIROS ANOS E EP1
SOCIOLOGIA
– PROF. JOSÉ ANTÔNIO BRAZÃO.
AULAS ZOOM 19 e 20
DE SOCIOLOGIA DOS PRIMEIROS ANOS E EP1:
VER:
http://filosofianodia-a-dia.blogspot.com/2021/05/aula-zoom-17-parte-ii-da-aula-16-de_30.html
Diálogo interdisciplinar com a
FILOSOFIA.
CULTURA E
SOCIEDADE: CULTURA, PODER E DIVERSIDADE NAS RELAÇÕES COTIDIANAS – CULTURA E
IDEOLOGIA:
A moda é algo que encontra no dia a
dia de todas as pessoas. De acordo com as Definições Oxford Languages, do
Google:
“moda (substantivo feminino)
1.conjunto de opiniões, gostos,
assim como modos de agir, viver e sentir coletivos. Ex.: "moda
masculina". 2. o uso de novos tecidos, cores, matérias-primas etc.
sugeridos para a indumentária humana por costureiros e figurinistas de renome.
Ex.: "a moda outono-inverno".
Semelhantes: mania; uso; voga; costume.”
(www.google.com.br
)
IMAGENS (MODA DE ROUPAS):
CULTURA, IDEOLOGIA E MODA
(Prof. José Antônio Brazão.):
EU, ETIQUETA (de
Carlos Drummond de Andrade):
Em minha calça está grudado um nome
que não é meu de batismo ou de
cartório,
um nome... estranho.
Meu blusão traz lembrete de bebida
que jamais pus na boca, nesta vida.
Em minha camiseta, a marca de
cigarro
que não fumo, até hoje não fumei.
Minhas meias falam de produto
que nunca experimentei
mas são comunicados a meus pés.
Meu tênis é proclama colorido
de alguma coisa não provada
por este provador de longa idade.
Meu lenço, meu relógio, meu
chaveiro,
minha gravata e cinto e escova e
pente,
meu copo, minha xícara,
minha toalha de banho e sabonete,
meu isso, meu aquilo,
desde a cabeça ao bico dos sapatos,
são mensagens,
letras falantes,
gritos visuais,
ordens de uso, abuso, reincidência,
costume, hábito, premência,
indispensabilidade,
e fazem de mim homem-anúncio
itinerante,
escravo da matéria anunciada.
Estou, estou na moda.
É duro andar na moda, ainda que a
moda
seja negar minha identidade,
trocá-la por mil, açambarcando
todas as marcas registradas,
todos os logotipos do mercado.
Com que inocência demito-me de ser
eu que antes era e me sabia
tão diverso de outros, tão mim
mesmo,
ser pensante, sentinte e solidário
com outros seres diversos e
conscientes
de sua humana, invencível condição.
Agora sou anúncio,
ora vulgar ora bizarro,
em língua nacional ou em qualquer
língua
(qualquer, principalmente).
E nisto me comparo, tiro glória
de minha anulação.
Não sou - vê lá - anúncio
contratado.
Eu é que mimosamente pago
para anunciar, para vender
em bares festas praias pérgulas
piscinas,
e bem à vista exibo esta etiqueta
global no corpo que desiste
de ser veste e sandália de uma
essência
tão viva, independente,
que moda ou suborno algum a
compromete.
Onde terei jogado fora
meu gosto e capacidade de escolher,
minhas idiossincrasias tão
pessoais,
tão minhas que no rosto se
espelhavam
e cada gesto, cada olhar
cada vinco da roupa
sou gravado de forma universal,
saio da estamparia, não de casa,
da vitrine me tiram, recolocam,
objeto pulsante mas objeto
que se oferece como signo de outros
objetos estáticos, tarifados.
Por me ostentar assim, tão
orgulhoso
de ser não eu, mas artigo
industrial,
peço que meu nome retifiquem.
Já não me convém o título de homem.
Meu nome novo é coisa.
Eu sou a coisa, coisamente.
Carlos Drummond de Andrade ANDRADE,
C. D. Obra poética, Volumes 4-6. Lisboa: Publicações Europa-América, 1989.
IMAGENS (LOGOTIPOS, MARCAS):
Conjunto 1 (logotipos):
Conjunto 2 (marcas consagradas):
Conjunto 3 (ETIQUETAS famosas):
POEMA EU, ETIQUETA, DE CARLOS D. DE ANDRADE
[comentário]: (Comentário do Prof. José Antônio Brazão.)
O poema Eu, etiqueta, de Carlos Drummond de
Andrade, trata da transformação das pessoas em objetos, marcas, anúncios, de
sua perda de identidade, transformando-se em coisas, abandonando o ser, sua
essência.
O ser aparece no
poema na forma de verbo conjugado no presente do indicativo, apontando para a
realidade da coisificação (reificação) pessoal, e como substantivo (o nome
ser), referindo-se ao gênero humano (ser humano, ser pessoa).
De tanto fazer uso
de vestes e acessórios para o corpo contendo marcas de produtos do mercado e,
por vontade própria (“eu é que mimosamente pago”), propagandeiam aquelas
mercadorias, as pessoas acabam perdendo aquilo que as identifica(m). Em vez de
mostrar o que são, mostram coisas, nomes de produtos, de mercadorias), acabando
por identificar-se com elas, ainda que não as comprem ou usem. A moda impõe-se,
a personalidade obedece, a moda entra, a personalidade sai, esvaindo-se,
perdendo-se.
O poema expõe a
antítese (oposição) entre o ser (ser humano, pessoa) e o não-ser, isto é, a
perda da identidade humana, que acaba por tornar-se coisa, objeto de anúncio
mercadológico. O mercado, com suas marcas (etiquetas), impõe-se sobre a pessoa,
levando-a a identificar-se com as mercadorias, alienando-se de seu ser.
No século 19
(XIX), Karl Marx estudou as ideias de Ludwig Feuerbach (filósofo alemão também
do mesmo século). Este, ao estudar as religiões, concluiu que os homens criam
os deuses, prestando-lhes culto e criando doutrinas ao redor de suas crenças.
Com o passar do tempo, os criadores (pessoas) se tornaram criaturas daqueles
que, na verdade, haviam criado, isto é, tornaram-se criaturas dos deuses e
deusas. Desta forma, os seres humanos alienaram-se.
Aliu(s), no latim,
é outro. Alienação é a ação de tornar-se outro (aliu[s]), deixando de ser o que
se é e perdendo, portanto, sua identidade humana, de criador, passando a identificar-se
como criaturas dos deuses. Por meio dessa alienação surgiram, pois, os deuses e
as deusas, cabendo às criaturas alienadas (pessoas) submeter-se àqueles e aos
seus representantes religiosos, os sacerdotes.
Marx aplicou as
ideias de Feuerbach na análise da mercadoria. Toda mercadoria é algo produzido
por trabalhadores e trabalhadores, principalmente em fábricas (indústrias),
muitas vezes com o auxílio de máquinas – de fato, na época de Marx, a Revolução
Industrial já havia avançado muito e, com ela, também a exploração de tais
produtores(as). Mercadoria é um produto que vai para o mercado, a fim de ser
vendido, conferindo lucros aos donos da produção (comerciantes, industriais e
outros), ou seja, aos capitalistas.
A exploração de
cada trabalhador e trabalhadora, de todos(as) os(as) trabalhadores(as) ocorria
(e ocorre) de diferentes modos, com destaque para a mais valia – um valor a
mais produzido que é apropriado pelos capitalistas –, seja através do aumento
das horas trabalhadas (horas extras) e não pagas, seja pelo incremento da
produção, tornando-a mais rápida e em maior escala, com o auxílio de máquinas e
da colocação dos(as) trabalhadores(as) em linha. Também salários baixos – os
salários eram tão baixos, no século 19 (XIX), que mulheres e crianças tinham
que postas para trabalhar a fim de dar condições de sobrevivência às famílias,
e recebiam salários menores que os dos homens. Não havia previdência social. As
condições de trabalho nas fábricas eram péssimas, até mesmo insalubres. Havia
crianças e adultos que perdiam mãos e até braços, estraçalhados pelas máquinas
em momentos de descuido. Pior: perdiam o emprego quando isso ocorria, sem
qualquer direito. Muitas vezes, todos(as) trabalhavam mais de 12 horas por dia!
Férias inexistiam. Relógios eram manipulados para que cada trabalhador(a), com
sua mulher e seus filhos trabalhassem a mais.
E as mercadorias?
Postas no mercado, passaram a ser vistas como objetos de necessidade e, muitas
vezes, até de desejos. O trabalhador e a trabalhadora (operários, operárias e
outros) deixaram de ver as mercadorias como produtos do trabalho explorado. As
mercadorias, com o tempo, foram se tornando fetiches. A alienação estava em
curso: a mercadoria fetichizada perdeu seu caráter de produto e se tornou um
bem em si, inclusive como objeto de desejo, de culto, como os deuses de
Feuerbach. Cada trabalhador(a) se tornou um outro ser diante da mercadoria
exposta na vitrine e no mercado, não enxergando nela um produto, fruto da
exploração que enriquece os capitalistas. Só para dar alguns exemplos atuais:
as mercadorias aparecem na televisão, em outdoors, vitrines de shoppings e
mercados, lojas, etc., desejáveis e até mesmo idolatráveis, fetiches! Aquele
carro do ano, aquela roupa da moda, aquele tênis, aquela grife, etc., como bem
apresenta também o poema de Carlos Drummond de Andrade.
Fetiche significa,
originalmente, feitiço, encantamento. A mercadoria, que se tornou um objeto
encantado pelo mercado, objeto de profundo desejo e de adoração. E o que é uma
crise econômica? Uma crise dessa adoração, desse encantamento, momento em que,
por causa da falta de compra e redução nas vendas (muitas vezes, pela falta de
dinheiro pela maioria das pessoa), o mercado entra em colapso. Então, os
capitalistas, com o mercado, fazem? Em sua adoração à riqueza e à ambição
desenfreadas, sacrifica a vida de milhões e milhões de pessoas, desempregadas
e, muitas, levadas de volta à miséria.
No século 19
(XIX), crises de superprodução eram comuns. Produzia-se além do poder de
consumo das pessoas, então sobrava muito, perdas podiam ser grandes. E a
solução? Reduzir a produção, diminuindo a quantidade de trabalhadores(as),
levados(as) ao desemprego e sujeitos, mais ainda, a salários curtíssimos – algo
similar ao que ocorre no mundo atual –, no intuito de manter as riquezas do
capital. O capital transforma as pessoas em coisas, palavra que aparece tanto
no poema de Drummond (século 20 [XX]) quanto, antes dele, em Karl Marx (século
19 [XIX]).
O ser humano
alienado – tornado outro –, ou seja, alguém sem identidade, torna-se coisa.
Marx usa o termo reificação, ação de tornar-se res (palavra do latim que significa coisa) – coisificação. Daí,
como bem aparece no poema, o Eu tornar-se “coisa, coisamente”.
A alienação –
perda de identidade de produtor(a) de mercadorias, perda de identidade das
pessoas enquanto pessoas – reforça a exploração, escondendo a realidade dessa
exploração. Uma crise econômica, como a atual, no Brasil e no mundo, por
exemplo, aparece ideologicamente como crise da falta de venda de mercadorias,
como fruto do desaquecimento do mercado, não como fruto da reificação, da
coisificação de milhões e milhões de trabalhadores(as) e de suas famílias. Ao
deus mercado, junto com a ambição desenfreada em busca do aumento das riquezas
de empresas e bancos, sacrificam-se vidas, famílias inteiras. Criam-se
aparências, como a de que a culpa é também da Previdência ou das leis
trabalhistas ditas antigas ou ultrapassadas. Esconde-se que, por trás, existe,
no fundo, a exploração e milhões de pessoas cujo trabalho sustenta o modo de
produção capitalista. Mexer em direitos de trabalhadores(as) para aumentar as
riquezas e o poder econômico e político de grandes empresários, empresas
multinacionais, investidores nacionais e estrangeiros, latifundiários e outros,
a quem as reformas diretamente vão beneficiar e que não sofrerão com as perdas
sofridas por aqueles(as).
Além dos seres
humanos (operários e outros trabalhadores), o próprio mundo natural continua a
ser sacrificado pelo capital. Uma das razões dos impasses em conferências
climáticas, das saídas de grandes poluidores mundiais de tratados
internacionais, é a produção de mercadorias e bens, sejam estes de compra e
venda diretas, em mercados comuns, sejam eles bens financeiros (ações e outros
produtos presentes em bolsas de valores). Uma produção fundada na exploração,
de muitas formas, como as já apresentadas: mais valia, salários baixíssimos,
horas extras não pagas, perda de direitos trabalhistas (na previdência, nas
leis, etc.), etc. A própria corrupção, nas negociações e até na política aliada
aos interesses do capital, é um meio de exploração – pessoas e grupos ricos se
enriquecem às custas também do roubo do que é coletivo. Dentre os resultados,
igualmente se encontram milhares de mortes em hospitais e serviços públicos de
saúde, pessoas morrendo de fome em continentes inteiros, como é o caso da
África, das Américas e outros, e tantos desmandos.
As mercadorias
fetichizadas, não vistas mais como produtos frutos do trabalho explorado mas
como bens de consumo, tornam-se objetos de desejo e de adoração, reforçados
pela propaganda constante, seja na televisão, seja no rádio, em outdoors e por
outros meios de comunicação, seja, como mostra bem o poema de Drummond, através
da própria roupa, ou melhor, do próprio corpo, que estampa marcas e ideias de
consumo, realizando gratuita e escravizadamente (“escravo da matéria
anunciada”) a tal propaganda. Ao fetiche reforçado da mercadoria todos estão
sujeitos: adultos, idosos, jovens, homens, mulheres e crianças. Aos fundamentos
e às consequências do mercado e até de seu descontrole também!
E aqui um
comentário sobre a “matéria anunciada”, da qual se torna escravo, perdendo a
identidade, como aparece no poema. Matéria é o estofo, o conteúdo de que que
uma mercadoria é feita. Curiosamente, a mercadoria é apresentada como matéria.
Tem-se aqui uma metonímia – figura de linguagem que troca, neste caso, o
contido (o bem, mercadoria) pelo conteúdo de que ele é composto. E não aparece
à toa. A matéria transformada pelo trabalho se torna mercadoria, que é
anunciada por meio das etiquetas. As mercadorias expostas à venda nos mercados,
em sua imensa maioria, são, na verdade, matérias anunciadas, matérias em sua
essência – diferentemente da essência humana, responsável pela identidade das
pessoas enquanto seres inigualáveis, em sua “invencível condição”.
Crises econômicas
(e políticas) trazem consigo, entre outros males, o desemprego. Ora, o
desemprego, no sistema capitalista, também faz parte da exploração: empurra
para baixo salários, obriga a realização de horas extras sem reclamação,
oferece um exército de mão-de-obra barata constante, reduz o desejo de greve e
desarticula movimentos de luta em prol dos(as) trabalhadores(as), possibilita
que uma reforma trabalhista injusta – que leva à perda de direitos e ao aumento
da exploração capitalista – seja engolida por goela abaixo pela imensa maioria
daqueles(as) trabalhadores(as) desempregados(as) e também pelos(as) que estão
empregados(as) sem reação e sem reclamação. Obriga a realização também de
reformas político-econômicas injustas, a perda de bens coletivos da maioria,
mas mantendo privilégios de quem dispõe de imensas riquezas nas mãos.
Guerras e
violência entram, igualmente, nesse contexto. Mais de quinhentas mil pessoas
mortas em guerra na Síria, milhares mortas na África, outros milhares pela
violência no Brasil e em países do mundo todo (milhões de pessoas, se somados
os milhares). Invasões, manutenção de exércitos (tropas) e outros meios de
demonstração e sustentação do poder são outros fatos. Pessoas que perderam a
identidade, que se tornaram coisas. Fetiche da mercadoria, fetiche do poder e
da riqueza. Reificação (coisificação) de seres humanos, similar àquela presente
no texto de Carlos Drummond de Andrade e que a reforça. Para que o consumo
reificado de mercadorias e bens ocorra, além da identidade, pessoas perdem a
vida e o mundo natural, com os seres humanos dentro dele, sofre com o
aquecimento global e outros desastres naturais e humanos.
REFERÊNCIAS:
ANDRADE, Carlos Drummond de. Eu,
etiqueta. Apud: PENSADOR UOL. Disponível em: https://www.pensador.com/frase/MjAyODM0/ Acesso em 04 de junho de 2017.
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda e
MARTINS, Maria Helena Pires. Propaganda e Ideologia. IN:
_________________________. FILOSOFANDO:
Introdução à Filosofia. São Paulo, Moderna, 1994.
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda e
MARTINS, Maria Helena Pires. FILOSOFANDO:
Introdução à Filosofia. São Paulo, Moderna, 2012.
O texto acima encontra-se
em:
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda e
MARTINS, Maria Helena Pires. Propaganda e Ideologia. IN: _________________________. FILOSOFANDO:
Introdução à Filosofia. São Paulo, Moderna, 1994. P. 50.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Eu, etiqueta. Apud: PENSADOR UOL.
Disponível em: https://www.pensador.com/frase/MjAyODM0/
Acesso em 04 de junho de 2017.
REFERÊNCIAS:
CHAUÍ, Marilena. Iniciação à Filosofia. (Manual do
Professor) 3.ed. São Paulo, Ática, 2017.
GOOGLE. Google Imagens. Disponível
em: < https://www.google.com.br/imghp?hl=pt-BR&ogbl
> Acessos em 29 de maio de 2021.
SILVA,
Afrânio et alii. Sociologia em Movimento. (Manual do Professor) 2.ed. São Paulo,
Moderna, 2017.
UNITED STATES HOLOCAUST MEMORIAL
MUSEUM. Holocaust Encyclopedia.
Disponível em: < https://encyclopedia.ushmm.org/en
> Acesso em 29 de maio de 2021.
WIKIPÉDIA. Disponível em: < https://pt.wikipedia.org/wiki/Wikip%C3%A9dia:P%C3%A1gina_principal > Acesso em
06/04/2021.
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