SECRETARIA DA EDUCAÇÃO DE GOIÁS
COORDENAÇÃO REGIONAL METROPOLITANA DE EDUCAÇÃO DE
GOIÂNIA
COLÉGIO ESTADUAL DEPUTADO JOSÉ DE ASSIS
ENSINO MÉDIO –
SEGUNDOS ANOS e EP2
FILOSOFIA e SOCIOLOGIA – PROF. JOSÉ ANTÔNIO BRAZÃO.
AULA DE 16 DE SETEMBRO DE 2020.
IMMANUEL KANT
(1724 – 1804) (Prof. José Antônio Brazão.)
Por
que estudar Immanuel Kant hoje, no século XXI? Kant foi um dos maiores
filósofos iluministas do século XVIII e início do XIX. Foi um homem devotado
aos estudos, servindo, ainda hoje, como exemplo de dedicação, de esforço, de
grande empenho em tudo que fazia. E tudo que fazia procurava fazer muito bem
feito. Exemplo de vida para todos, no mundo atual. Kant estudou o conhecimento,
a moral/ética, o poder, a educação, as ciências, entre outras tantas áreas da
cultura e do conhecimento humanos. Escreveu: CRÍTICA DA RAZÃO PURA (sobre o
conhecimento), CRÍTICA DA RAZÃO PRÁTICA (sobre a moral, a ética), O QUE É
ILUMINISMO?, À PAZ PERPÉTUA e uma boa
porção de outros livros. Homem extremante culto e disciplinado. Fazia caminhadas
na praça perto de sua casa, em Konnigsberg, na Alemanha (hoje, na Rússia), e
era tão exato na chegada àquele lugar que as pessoas vizinhas e comerciantes
até acertavam a hora como base nisto. Isto e os cuidados com a saúde, como o
sono e a alimentação simples, permitiram a ele que vivesse até os oitenta anos
de idade! Hoje, vivemos em um tempo em que as pessoas fazem caminhadas, vão às
academias de ginástica e tomam outros cuidados parecidos com os de Kant.
E
por que o conhecimento? Ora, cientistas querem saber das leis que regem o
universo, como funciona a estrutura de um vírus, como funciona o corpo humano e
como este reage a enfermidades, como os planetas giram em torno do Sol, entre
uma infinidade de outros estudos e pesquisas. Os filósofos, como Descartes,
Locke, Hume, Kant e outros tantos se perguntaram e se perguntam: como é
possível o conhecimento? De onde o conhecimento provém? Como é possível
entender as leis naturais e as descobrir? Perguntas destes tipos e outras!
Para
entender o pensamento complexo (complicado) de Kant, correndo o risco de o
simplificarmos demasiadamente, vamos partir de um exemplo simples, nascido do
dia a dia de casa: a história da elaboração de um bolo de peras com maçãs.
Contudo, sem dúvida, apesar do risco de simplificação, haverá de valer a pena.
Enfrentemos
o desafio!
Um
grande chef de cozinha precisou fazer um bolo de peras. Encontrou três peras
que não amaciavam, duras. Não as podendo comer, resolveu usá-las no bolo que ia
fazer. Inicialmente, o bolo ia ser somente de pera. Porém, como ia precisar de
cinco, mas apenas três estavam disponíveis, decidiu colocar duas maçãs para
complementar. Cortou as frutas cuidadosamente, acomodou as partes cortadas no
fundo de uma forma devidamente untada e esfarinhada, fez uma massa e a colocou
por cima. No meio da massa, antes, acrescentou rum com um pouco de canela. Que
explosão de sensações!
O
aroma do rum com um pouco de canela, unido ao das peras e das maçãs, a textura
do bolo, a configuração redonda (não havia forma de bolo inglês, como a receita
pedia), com aquelas tiras das frutas em cima, depois de pronto o bolo e uma
leve calda de açúcar que fez parte, o barulhinho da espátula a cortar cada
camada do bolo e, depois, do garfo ao bater no prato, reforçavam a água na boca
do cliente, tornando o bolo convidativo e aumentando o prazer do conjunto dos
sabores experimentados pela língua e pela boca. Uma experiência sensorial e
tanto, como aquelas que levaram René Descartes, John Locke, David Hume e
Immanuel [Emmanuel] Kant a filosofar a respeito do conhecimento humano.
(Filosofia do bolo! Kkk)
“Penso,
logo existo”, dizia o racionalista Descartes. Ora, o ser que pensa é o mesmo
ser que experimenta, que faz a experiência do mundo com seus cinco sentidos e a
formação de ideias na mente humana, como defendia, para além de Descartes, John
Locke, como o bolo gostoso feito e que passou pelo crivo da experiência
sensorial. Um bolo tornado possível pelo
hábito, desde longa data, de uso dos sentidos e do acúmulo de informações, como
dizia Hume. O cozinheiro e o cliente tinham largo hábito nascido de
experiências sensoriais, mas sempre descobrindo algo novo, no sabor, na cor, na
textura, na visualização e noutras informações advindas das gostosuras
culinárias. E Immanuel Kant, a que se o pode comparar?
Kant
defende o pensamento de que todo conhecimento, de fato, tem sua raiz na
experiência sensorial (experiência dos cinco sentidos: olfato, tato, paladar,
audição e visão). Isto é o que ele chama de conhecimento a posteriori, isto é,
conhecimento que advém da experiência, que se segue após a experiência (que vem
depois da experiência) por meio do trabalho da razão em cima das informações
sensoriais (sabores/gostos, texturas, formas vistas, barulhos, odores [o cheiro
do bolo!], etc.). Mas poderia haver algum conhecimento a priori? A
priori [expressão do latim] é todo conhecimento que antecede a
experiência, que vem antes desta. Curioso, Kant se pôs a refletir.
Ora,
uma criança que já queimou o dedo por tê-lo posto na parede da panela quente ou
diretamente no fogo não o colocará de novo. Sabe que o fogo queima. Portanto,
esse conhecimento vai anteceder outra possível experiência do fogo e ajudar a
evitar queimar o dedo de novo! Um conhecimento que é fruto da experiência (o
toque anterior do dedo no fogo ou na panela quente), mas que, ao mesmo tempo,
em outra, a antecede (portanto, a priori) e evita um mal.
A
experiência do bolo citado põe outro fato interessante estudado por Kant: o
conhecimento como SÍNTESE. Que é isto? Síntese é uma palavra grega que significa
COMPOSIÇÃO (ação de por junto [com]). Vejamos o bolo: no início era um conjunto
de materiais que forneciam variadas sensações (cores, odores, sabores...). Mas,
pondo tudo junto, ocorreu uma SÍNTESE, que deu origem a um conhecimento de
algo novo, o bolo, fruto da união daqueles diferentes elementos. Síntese
fruto da experiência sensível, a posteriori. Mas, Kant vai além:
seria possível uma SÍNTESE A PRIORI
ou um CONHECIMENTO SINTÉTICO A PRIORI?
Um conhecimento puro, não ligado diretamente à experiência? Pondo-se a
refletir, Kant encontrou alguns exemplos.
Um
desses exemplos, na Matemática: 1 + 1 = 2. Dois é fruto da síntese (composição,
união) entre 1 e 1. Esses números são unidos no mundo sensível? Não. São unidos
pela mente, de forma abstrata (= não concreta). Oh, que interessante! A síntese
a priori é possível, como provado pela Matemática. Mas e na Física? Como é
possível a Física constituir-se como ciência, com leis rigorosas acerca do
universo e da natureza?
Vamos
tomar o exemplo da teoria da gravidade, de Isaac Newton, que viveu bem próximo
do tempo de Kant e cuja ciência foi muito estudada por este. A lei da gravidade
diz que matéria atrai matéria na razão direta de suas massas e na razão inversa
dos quadrados de suas distâncias, isto é, quanto mais perto uma da outra maior
o poder de atração de uma massa sobre a outras, quanto mais longo, menor o
poder. Mas massa é matéria visível. Ah! De fato, todo conhecimento nasce da
experiência (lá no início do livro Crítica
da Razão Pura, livro de Kant), mas, no caso, vai além. É preciso abstrair
(separar mentalmente do concreto) para se conseguir unir fenômenos diversos
como a queda da maçã e o movimento dos planetas em torno de uma lei única a
explicar esses diferentes fenômenos. Para tanto, é preciso juntar (sintetizar)
esses diferentes fenômenos, mas de modo abstrato (separado do concreto, na
mente). Ocorre uma SÍNTESE (composição, união) desses elementos pela mente do
cientista. E o A PRIORI, como fica? O
trabalho da mente vai além do que é dado pela experiência (observação,
percepção dos fenômenos). A síntese a priori nasce do trabalho com os elementos
da experiência, mais o trabalho da razão.
Ora,
o trabalho da razão de dá de forma organizada. Como? Com a ajuda das FORMAS A PRIORI DA SENSIBILIDADE. Quais? O
TEMPO e o ESPAÇO. Essas duas formas são A
PRIORI, independentes da experiência. Então, as informações experimentais
de Newton foram organizadas pela mente com a ajuda das formas a priori da
sensibilidade! O CONHECIMENTO COMO
SÍNTESE A PRIORI é possível, portanto, também na Física!
No entanto, vamos esmiuçar (detalhar)
um pouquinho mais o que são as FORMAS A
PRIORI DA SENSIBILIDADE. Quem poderá nos ajudar? O cozinheiro lá do início!
Como? Vejamos.
Para fazer o bolo, que é uma síntese
(composição) dos materiais sensíveis (farinha, ovos, peras, maçãs, gordura,
etc.), experienciáveis. Mas são necessários também um bom forno e formas! Pois
bem, vamos comparar:
Os materiais sensíveis do bolo seriam
os materiais advindos (provindos) da experiência sensível, início do
conhecimento).
O fogão com seu forno poderia ser
comparado à mente humana, à razão.
As duas fôrmas onde vai a matéria
misturada do futuro bolo seriam, respectivamente (seguidamente), o TEMPO e o
ESPAÇO. No caso, estando dentro do forno, antes do trabalho dos sentidos
(comparáveis ao trabalho do cozinheiro). O tempo e o espaço vão organizar essa
mistura, transformando-a em algo novo: o bolo! Qual bolo? O bolo do
CONHECIMENTO!
E a degustação (comilança) do bolo? O
uso que se faz do conhecimento!
Então temos a experiência (empiria, em grego), bem apresentada na palavra SENSIBILIDADE (capacidade de perceber elementos sensíveis, como sabores, sons, odores [cheiros], formas visíveis, etc.), e a RAZÃO (o intelecto humano). Esta última, a razão, com as FORMAS A PRIORI DA SENSIBILIDADE. As FORMAS: tempo e espaço. Veja a palavra fôrma (com acento, ainda que não necessário na Nova Ortografia): fôrmas dão forma (estrutura). No caso, uma fôrma de coração dará forma de coração ao bolo. Uma quadrada, forma quadrada ao bolo. E assim por diante. Que delícia! Hummm! A PRIORI sim, mas elas não são inatas, isto é, o tempo e o espaço não nascem com as pessoas. Adriana Pereira comenta: "Ao explicar a origem do espaço e do tempo, perguntando-se sobre serem ambos inatos ou adquiridos, Kant diz não serem eles obtidos através dos sentidos, mas tampouco serem inatos. Para ele (no que repete Locke), o inatismo é a filosofia dos preguiçosos, pois invoca uma causa primeira e abandona qualquer outro questionamento posterior." (PEREIRA, 2004, p. 200).
A
experiência sensível, com o amontoado de materiais que ela oferece (sabores,
odores, sensações táteis, formas visíveis, sons...), é caótica, ou seja, é
bagunçada como a massa do bolo crua! Quem dá forma ao “bolo” (conhecimento que
nascerá do trabalho da razão) são o tempo e o espaço. Deste modo, é possível o
CONHECIMENTO COMO SÍNTESE A PRIORI na Matemática e na Física! As ciências são
possíveis!
Curiosamente,
Immanuel (Emmanuel) Kant faz filosofia do conhecimento e da ciência ao mesmo
tempo.
Como
se pôde ver, Immanuel Kant levanta a possibilidade de que o nosso conhecimento
empírico (fruto da experiência, empiria, em grego) disponha de duas fontes: a
primeira seria constituída pelas impressões sensíveis, como marcas perceptíveis
(= que podem ser percebidas, observadas), impressas na mente humana pelo
contato direto com o mundo; a segunda seria o que nossa capacidade de conhecer
produz por si mesma, ou seja, aquilo que a mente, posta em movimento ou em ação
pelas impressões, pode desenvolver, em termos de apreensão (assimilação...) ou
conhecimento de uma realidade, sem uma conexão (ligação) exclusiva com a
experiência sensíveis, mas sim de forma abstrata (mental, não concreta). A
mente precisa das informações sensíveis, como matéria-prima para a elaboração
do conhecimento, contudo essa mesma mente dispõe de condições que lhe permitem
extrapolar, através da abstração (separação do concreto, transformando em
ideias e pensamentos), os dados imediatos, fornecidos por aquelas impressões
sensíveis (odores, sabores, cores, formas, barulhos, texturas [o que pode ser
sentido pelo toque, tato], etc.). Quem ajuda? Como foi visto: As FORMAS A
PRIORI DA SENSIBILIDADE: o TEMPO e o ESPAÇO.
Que
bolo gostoso!
REFERENCIAIS:
BRAZÃO, José Antônio. O Conhecimento Como Síntese a Priori.
Trabalho Monográfico Qualificado apresentado ao Departamento de Filosofia da
Universidade Federal de Goiânia em 2005.
CHAUÍ, Marilena. Unidade 5: O
conhecimento. In: _________________. Iniciação
à Filosofia. 3.ed. São Paulo, Ática, 2017. (pp. 147 – 193)
PEREIRA, Adriana. Hume e Kant a respeito do inato. In: FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS - UNESP. Revista de Iniciação Científica da FFC, v. 4, n. 3, 2004.
OBSERVAÇÃO: (1) Os
exemplos citados não aparecem, necessariamente, nos textos referenciados. São
frutos da imaginação, no intuito de ajudar estudantes do Ensino Médio num
melhor entendimento da complexidade das ideias de Kant. Podem simplificar
muito, mas podem também ajudar. Quis-se aqui ajudar. (2) Os grifos no texto servem
para reforçar elementos de destaque a ajudar na compreensão das ideias
apresentadas e discutidas.
OBS.: Diálogo interdisciplinar FILOSOFIA, SOCIOLOGIA e HISTÓRIA.
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