domingo, 8 de maio de 2016

HISTÓRIAS DE MARINHEIROS: O CANTO DAS SEREIAS. (Prof. José Antônio Brazão.)

Desde a antiguidade, os mares e as grandes águas sempre admiraram os seres humanos. Águas salgadas, águas doces, águas calmas e águas tempestuosas. A água encontra-se no receptáculo da vida.
 
Junto com a água, histórias de marinheiros e pescadores, histórias recheadas de elementos míticos.
Em torno da água, com efeito, muitas crenças se desenvolveram, no Oriente, na África, na Europa, nas Américas e em tantos outros cantos deste vasto mundo.
 
As ninfas, as náiades, deusas do mar, o deus do Oceano (Poseidon), Iemanjá, mães d'água e tantos outros seres divinos.
 
Apesar dos perigos, as águas sempre atraíram pescadores e marinheiros. Uma atração-necessidade, mas também atração-desejo: desejo do desconhecido, desejo de adentrar-se nas origens, desejo de vida, de aventurar-se num mundo novo, de novas descobertas.
 
Elas atraíram e atraem também escritores, poetas, criadores e investigadores de histórias e de mitos.
Entre os mitos, um dos mais famosos é o que se encontra na Odisseia, livro do antigo poeta grego Homero, que viveu alguns séculos antes de Cristo.
 
No retorno à sua ilha-reino, Ítaca, Odisseu (Ulisses), com seus companheiros de embarcação, tiveram que enfrentar o momento de cruzar as águas em que viviam as sereias. Sabedor do perigo de seu canto, Odisseu ordenou que seus marinheiros tapassem os ouvidos com cera, a fim de que não ouvissem o canto e não ficassem encantados, enfeitiçados por ele. Um canto de imenso poder, de imensa atração, tão forte que o próprio Odisseu pediu que o amarrassem no mastro do barco, a fim de que não caísse na tentação das sereias, mergulhasse nas águas e ali morresse.
 
O canto das sereias, como se vê, é extremamente tentador, poderoso, belo e intenso.
 
Mas também as águas, desde tempos antigos, representam purificação. As águas do batismo de Cristo, no Rio Jordão, em Israel. As águas purificadoras do Rio Ganges, na Índia, segundo o hinduísmo. As águas purificadoras presentes em tantas outras religiões e crenças. Águas bentas, benéficas até contra vampiros.
 
As águas são carregadas da lembrança arquetípica das origens da vida: o Éden bíblico era cercado por rios, o homem foi feito do barro da terra, uma mistura de terra e água, os filhos de Eva (ou das Evas primeiras, segundo estudos arqueo-biológicos), e seus descendentes, que nasceram e nascem de uma bolsa cheia de água;  a espuma da água, da qual nasceu, magnífica, a deusa Vênus (deusa grega do amor), bem representada pelo pintor renascentista Sandro Botticelli; as águas da Mãe Iemanjá, para a qual, ano após anos, são oferecidas flores e cestas com perfumes e outros presentes, no fim-início de cada ano.
 
As águas cantadas por poetas e poetisas, como Luís Vaz de Camões, o português, no século XVI, Clarice Lispector, José Saramago e tantos outros e outras, ao tratar de viagens, de enfrentamentos de tempestades, ao tratar do amor, da efemeridade, da beleza e dos desafios da vida humana.
 
A água origem da vida na Terra, em seus primórdios, no tratar filosófico de um Tales de Mileto, para quem tudo tem sua origem na água e tudo é formado, em sua estrutura, pela água; no tratar de Empédocles de Agrigento, que juntou-a a outros três elementos (ar, terra e fogo); no tratar de Nietzsche, ao estudar Tales e ao falar, na arte, do poder do dionisíaco (Dioniso ou Dionísio, o deus grego das vinhas, encontrava-se na natureza, auxiliada pelas águas refrescantes de riachos); no tratar de cientistas, como Darwin, Wallace e evolucionistas do passado e do presente.

As águas que são uma bênção, quando chegam nas lavouras, e que se tornam motivos de preocupação na época das secas, em todo o mundo. Motivos de rezas e orações em diferentes religiões. Águas que trazem vida, mas também destruição: enchentes, tsunamis, temporais e outros fenômenos, tratados por cientistas, climatologistas, autoridades, até por historiadoras e historiadores. Água desafio.

Água escasseando-se, pondo em alerta o mundo e com gente que afirma que sua falta, no futuro, poderá ser motivo de guerras. Oxalá isto não aconteça.
 
Águas que levam homens por caminhos diversos, traçados por barcos de pequeno porte e por navios gigantes.
 
E o canto das sereias continua, sempre contado, recontado, revivido, num misto de desejo e de perigo, sempre belo, atraente, tentador.

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