Até
o século XVI, os seres humanos ocupavam o centro do universo, numa visão
geocêntrica muito antiga, anterior ao tempo do próprio Cristo. O geocentrismo
foi um sistema astronômico que predominou por mais de dois milênios, até mais,
no mundo ocidental. A Terra, Geia\Geo, em grego, ocupava o centro, em torno da
qual giravam todos os demais astros, inclusive o Sol e as estrelas fixas.
Eudoxo de Cnido e Aristóteles de Estagira, discípulos de Platão, na Academia,
no século IV a.C., defenderam e buscaram sistematizar o conhecimento em torno
no universo geocêntrico. No século II da era cristã, na Biblioteca de
Alexandria, o astrônomo e geógrafo Cláudio Ptolomeu, no livro Almagesto, sistematizou, mais ainda, o
geocentrismo, acrescentando epiciclos para explicar as variações nas órbitas
planetárias. A voz de Aristarco de Samos, matemático e astrônomo grego do
século III a.C., que defendera o heliocentrismo, foi silenciada. No século XVI,
em seu magnífico poema Os Lusíadas,
Luís Vaz de Camões, o português, descreve poeticamente o sistema geocêntrico!
No
século XVI, um sacerdote, matemático e astrônomo, depois de muitas observações,
cálculos e anotações, usando os olhos e ferramentas astronômicas rudimentares,
chegou à conclusão ousada de que a Terra nada mais é do que um planeta, que,
como quaisquer outros, gira em torno do glorioso e iluminado Sol! Chamava-se
Nicolau Copérnico, era polonês. Seu livro, Da
Revolução dos Orbes Celestes, foi, inclusive, posto no Índice dos Livros Proibidos (em latim, Index Librorum Prohibitorum), pela Inquisição Católica e criticado
até por Martinho Lutero, o reformista. Mas, mesmo proibido, foi lido e, com
muita argúcia, conhecimentos profundos dos céus e muitas experiências, cálculos
e observações, Galileu Galilei, no século XVII, concluiu e provou que Copérnico
estava certíssimo. Aristarco também. O HELIOCENTRISMO é uma realidade. O ser
humano perdia, então, o privilégio de viver no centro do universo, onde fora
colocado por Deus, conforme o livro do Gênesis,
da Bíblia.
Até
o século XVIII e parte do XIX, além de ser imagem e semelhança de Deus, o ser
humano era visto como um ser racional por excelência. Partindo do século XVII,
até o XIX, René Descartes, Immanuel Kant e Friedrich Hegel, por exemplo, foram
grandes defensores e estudiosos da racionalidade humana! O próprio Iluminismo
tratou muito das luzes da razão. No entanto, no século XIX e início do XX, um
médico e psicoterapeuta alemão, chamado Sigmund Freud, descobriu algo
impressionante: o INCONSCIENTE, isto é, uma estrutura que existe na mente
humana, na qual ficam escondidos desejos, pulsões, lembranças e uma porção de
informações aparentemente esquecidas, que atuam sobre o ser humano e conduzem,
muitas vezes, suas ações e seus traumas psicológicos. Muitas das ações humanas
têm, na verdade, motivações inconscientes. O ser humano deixou de ser visto
como um ser puramente racional! Deslocou-se do pedestal da racionalidade pura.
Ainda,
mais uma vez. Até os séculos XVIII e parte do XIX da era cristã, o ser humano
era visto pela maioria das pessoas como o centro da criação divina, conforme o
Gênesis bíblico, em seus capítulos 1 a 3 (um a três), imagem e semelhança de
Deus, do Criador (Gênesis, cap. 1). No século XIX, os estudos, as observações e
as descobertas de dois naturalistas ingleses, Charles Darwin e Alfred Russel
Wallace, demonstraram e provaram a existência de um mecanismo de evolução de todos os seres vivos,
incluindo o próprio ser humano, dentro da natureza. Um mecanismo regido por
meio da SELEÇÃO NATURAL, numa luta constante, da qual somente os mais fortes e
os mais bem adaptados sobrevivem, evoluem e passam suas características a seus
descendentes.
O
evolucionismo prova que o homem (homens e mulheres) é um ser vivo, um animal,
que sofreu (e sofre), ao longo de milhões de anos, um processo evolutivo,
provocado pela seleção natural e a adaptação das espécies vivas.
Com
o advento da genética, nascida, já no século XIX, com Gregor Mendel, um
sacerdote católico, botânico e cientista, a descoberta do DNA nos inícios da
segunda metade do século XX, outras descobertas genéticas, descobertas
geológicas (tempo da Terra), biológicas (fósseis) e a teoria comprovada, no
campo da astronomia, do BIG BANG, descobriu-se que todo o universo passou por
um processo de expansão (astronomia), de formação de galáxias e estrelas e de
sistemas estelares, como o do Sol, e, juntamente com este, a Terra (astronomia
e geologia), o que levou avante o surgimento e a evolução natural dos seres
vivos.
Na
sequência da evolução do universo, na evolução da Terra, com a água e os
materiais orgânicos básicos necessários, o surgimento da vida e sua paulatina
evolução, no transcurso de 3,5 (três e meio) bilhões de anos, aproximadamente,
até hoje (biologia). Aliás, os seres
vivos continuam e continuarão evoluindo. No entanto, como as mudanças não ocorrem de uma vez, as
pessoas têm a sensação de que as coisas sempre foram assim, do modo como são.
Contudo, os fósseis e as descobertas genéticas estão aí para provar, de fato,
inegavelmente, o evoluir das espécies. O ser humano, visto como um animal como
qualquer outro, melhor que os demais por conta de seu intelecto evoluído,
perdeu seu lugar primordial, sendo deslocado do centro da Criação.
No campo das
relações humanas, o deslocamento do homem, literalmente dito, o masculino, do
lugar central no ambiente familiar. Lutas femininas, guerras terríveis, nas
quais morreram muitos homens, a colocação da mulher no mundo do mercado e do
trabalho, sua formação educativa maior, entre outras mudanças, puseram o
machismo em xeque. Não que ele ainda não exista, mas que perdeu parte da força
que teve no decorrer de milênios de história humana.
Por
sua vez, tem-se também a aparência de que Deus perdeu seu lugar. Muito pelo
contrário, a fé é algo tão arraigado na imensa maioria dos seres humanos que se
torna dificílimo, ou talvez impossível, querer-se afirmar seu fim. Cabe aqui,
portanto, a busca de um mútuo respeito, entre os que têm fé, os ateus\ateias e
os mais diversos fiéis de muitas religiões existentes, de todos entre si, tendo
em vista um bem maior: o bem comum. Independentemente de crer num Deus criador
ou em uma evolução criadora e puramente natural, desafios se põem a todos,
hoje, mais do que nunca: aquecimento global, novas doenças e antigas doenças
que agora manifestam-se com mais força,
poluição, devastação secular do meio ambiente, causados pelo uso intenso
da natureza, pelo consumismo constante, que mina inexoravelmente o mundo
natural, guerras, conflitos, terrorismos de diferentes tipos e em muitos
lugares, fome, corrupção, dentre outros males, demandam DE TODOS, homens e mulheres, independentemente de
crenças religiosas e científicas, a união e o diálogo, fundamentados numa
percepção ética e humanística, aberta, tolerante e clara, de mundo e de
humanidade.
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