Um recurso didático que tem aparecido
com frequência nos livros didáticos de Filosofia é a pintura: quadros, afrescos
e outras pinturas de artistas diversos e até muito renomados. E, para além dos
livros didáticos, esse material encontra-se também em livros de arte, banners,
na internet e outras formas de apresentação.
O uso de obras artísticas pictóricas
pode ajudar a desenvolver a capacidade de análise de elementos
estético-filosóficos, aguçar o uso dos sentidos (principalmente a visão),
aprimorar o conhecimento e a apreciação da arte, aprender como a filosofia e a
arte frequentemente adentram uma no campo da outra, dialogando entre si, junto
com outras habilidades.
O que se ser aqui, é claro, é o
aprendizado de Filosofia, mas o uso de pinturas de artistas comuns e outros
reconhecidos até mesmo internacionalmente vem de encontro ao aprofundamento no
aprendizado filosófico e vice-versa. Além disto, vale lembrar que a filosofia,
igualmente, analisa a arte: Platão via nela uma cópia da cópia do Mundo
Inteligível, Adorno e Horkheimer perceberam que ela, em diferentes modos de
expressão, foi assimilada pela indústria cultural, Kant avaliou o caráter
sublime da arte, e assim por diante.
As obras de arte (neste caso,
pinturas) contidas, retratadas, nos livros didáticos expõem elementos da
filosofia que serão objeto de discussão e estudo em cada capítulo, aparecendo
no início e/ou ao longo deste(s). Portanto, podem ajudar no entendimento das
ideias filosóficas em estudo nos capítulos, contribuindo para sua melhor
compreensão e assimilação.
Além do livro didático, ao estudar
textos de filósofos diretamente, pinturas em livros de arte, bem avaliadas e
escolhidas, podem ser muito úteis no entendimento daqueles. Abaixo seguem duas
análises de pinturas, com estudantes, em sala de aula, em 2013:
ANÁLISE BÁSICA DA IMAGEM DO
AFRESCO “A ESCOLA DE ATENAS”, DE RAFAEL SANZIO, QUE CONSTA NO LIVRO FILOSOFANDO, PÁG. 149:
*Pessoas (estudiosos, figuras de destaque no mundo do pensamento e das
ciências) dentro de um salão.
*O salão é decorado com várias estátuas.
*O corredor que conduz para o centro e se estende para fora e para
dentro, dando impressão, a quem vê, de estar dentro dele ou que o quadro seja
uma extensão do exterior.
*Visão de profundidade = perspectiva.
*Pintura detalhada, com vivacidade: naturalismo.
*Atenas: cidade da Grécia, sede da Academia, de Platão, e do Liceu, de
Aristóteles.
*No centro: à esquerda, Platão; à direita, Aristóteles. Dois grandes
filósofos do mundo grego antigo. Com eles, dois grupos reunidos e separados.
*Escada: pode estar indicando, como imagem, subida, elevação de nível,
tendo, em cima e ao centro, Platão e Aristóteles; possibilita a visão de
diferentes estudiosos, evitando que fiquem escondidos atrás de outros.
*Por que Platão (de barba clara) e Aristóteles (de barba escura)
aparecem centralizados? Porque representam a culminância do pensamento antigo,
tendo deixado escritos e ideias que tiveram grande repercussão no mundo
ocidental. Deixaram grande legado intelectual.
*Espaço geométrico ao redor dos estudiosos, no salão, e, ao fundo,
natural.
*Cores vivas e claras, até mesmo das vestimentas.
*Vestimentas: em sua maioria, longas, indicando sobriedade e alguma
formalidade, porém com cores alegres (vermelha, azul, branca, verde, bege,
marrom clara, dentre outras).
*Céu, ao fundo: azul claro, com nuvens brancas, indicando dia.
*Luminosidade e clareza.
*Retorno renascentista à cultura greco-latina (Grécia e Roma antigas).
*Platão aponta com o dedo direito para cima, referindo-se ao Mundo das
Ideias. Aristóteles aponta com a palma para baixo, valorizando a realidade
sensível. Descrevem embate de tendências no mundo filosófico.
Essa análise simples, básica, foi feita com turmas do primeiro ano do
Ensino Médio, introduzindo o estudo de Platão e Aristóteles. Tal análise contou
com a participação das respectivas turmas, com boa parte das e dos estudantes
tendo o livro em mãos.
ANÁLISE SIMPLES DA PINTURA “O SENTIDO DA VISÃO”, DE
JAN BRUEGEL, O VELHO, E PETER PAUL RUBENS, DE 1617, QUE APARECE NO LIVRO FILOSOFANDO, PÁG. 364:
*Detalhista e vívida: naturalismo.
*Apresenta o uso da perspectiva, isto é, visão de profundidade.
*Manifesta o classicismo greco-romano: mitologia (ex.: Cupido e sua mãe
Vênus), estátuas desenhadas de personagens do mundo antigo).
*Valorização do humano: traço marcante do humanismo.
*Nudez ou seminudez do corpo humano.
*Precisão matemática nos traços e nas imagens, na disposição destas e
nas figuras.
*Um quadro menor, à direita, mostra Maria (Madona) e o menino Jesus.
*A pintura mostra instrumentos científicos, como, por exemplo: o
telescópio (luneta), um globo terrestre e outro celeste, astrolábio, compasso,
dentre outros.
*Cores vivas.
*Presença da natureza.
*A pintura mostra um salão cheio de obras de arte e outras. Do lado de
fora do salão: jardim, prédio (possivelmente um castelo), nuvens, fonte, água.
*Do lado direito do corredor, um corredor também cheio de obras de
arte.
*O salão mostrado na pintura parece elevado em relação ao exterior,
dando visão para fora.
*Aparecem animais: cachorros, macaco, pássaros..., enfim, a natureza.
A pintura “O sentido da visão”, de Bruegel
e Rubens, de 1617, como o próprio nome indica, faz um apelo à visão humana e
demonstra, através de muitas imagens, como esse sentido humano é capaz de
captar imagens, formas (figuras), cores, tonalidades, elementos luminosos
diversos, seja simultaneamente (em conjunto), seja separadamente (cada aspecto
separado, singular, de uma imagem), aqui, particularmente, de uma obra
artística. Acima, pode-se ver alguns elementos observados e anotados.
Curiosamente, os autores (Bruegel e
Rubens), em sua pintura, deixam entrever aspectos vitais e históricos de seu
tempo. Por exemplo: navegações (globos terrestre e celeste, luneta, astrolábio
e outros instrumentos usados por
navegadores); desenvolvimento científico (os instrumentos já citados, p. ex.);
classicismo greco-romano (ver os elementos indicados no início); Renascimento
Artístico-Cultural (algumas de suas características foram, de fato: o
classicismo, o humanismo, o uso da perspectiva, o naturalismo, o
antropocentrismo); religiosidade (ex.: Maria e o menino Jesus); conflitos (um
quadro menor, acima, na pintura, exalta os feitos em uma batalha, a luta); a
riqueza acumulada com o comércio (ex.: moedas espalhadas pelo chão, quadros
artísticos – ostentação de ricos daquela época, muitos dos quais eram mecenas, isto
é protetores e financiadores de artistas, aos quais solicitavam obras).
(Comentário do Prof. José Antônio Brazão.)
Essa análise simples, básica, foi feita com turmas do
segundo ano do Ensino Médio, introduzindo o estudo do Renascimento e da
Filosofia Moderna. Tal análise contou com a participação das respectivas
turmas, com boa parte das e dos estudantes tendo o livro em mãos.
Cada asterisco indica uma colaboração de estudantes,
estimulados(as) pelo professor.
Vale ainda lembrar que, às vezes, uma
imagem rica, presente no livro didático, pode passar despercebida. É preciso,
pois, que professoras e professores de Filosofia atentem para imagens
pictóricas. Livros (os livros didáticos de Filosofia inclusive) e até mesmo a
internet costumam trazer interpretações boas, bem feitas daquelas obras
artísticas. Cabe, pois, aos e às docentes fazerem uma integração entre a arte e
a Filosofia.
O trabalho interdisciplinar, com o
conteúdo curricular Arte, pode enriquecer mais ainda o aprendizado. Deste modo,
o diálogo entre professores(as) de Filosofia e Arte pode ser de grande valor,
ajudando-se mutuamente. Isto permite que as e os estudantes percebam que os
conteúdos escolares não são estanques, isto é, separados, mas adentram-se e
contribuem uns com os outros.