segunda-feira, 13 de abril de 2020

VÍDEO-DOCUMENTÁRIO COSMOS EPISÓDIO 7: A ESPINHA DORSAL DA NOITE, DE CARL SAGAN (Prof. José Antônio Brazão.)


O Nascimento da Filosofia na Grécia Antiga.
Vídeo COSMOS, episódio 7: A Espinha Dorsal da Noite [O Esqueleto da Noite], de Carl Sagan, no YouTube. Site: https://www.youtube.com/watch?v=V2B0ofcckIc
RESUMO-COMENTÁRIO COMPLEMENTAR DO PROFESSOR JOSÉ ANTÔNIO BRAZÃO:
Dando continuidade ao estudo do vídeo-documentário COSMOS, episódio 7: A Espinha Dorsal da Noite [ou O Esqueleto da Noite], do astrônomo norte-americano Carl Sagan (1934 – 1996), pode-se ver que o cientista (astrônomo) propõe-se buscar as origens da ciência ocidental. Curiosamente, tais origens, são, exatamente, as da filosofia.
Carl Sagan toma como ponto de partida, inicialmente, o bairro em que viveu em Nova Iorque. Sagan fala de seu interesse científico desde a infância. Exemplifica esse interesse com uma pergunta que fez a adultos: “O que são as estrelas?”. Descontente com as respostas simples dadas pelas pessoas, que lhe diziam serem as estrelas luzes no céu, resolveu investigar por conta própria e se dirigiu a uma biblioteca não muito distante do local onde morava. Ali encontrou um livro que lhe disse que elas são sóis, porém estando muito distantes. O Sol seria, pois, uma estrela próxima.
A seguir, para demonstrar como a curiosidade é inerente às crianças, foi até a escola em que estudou naquele bairro e visitou a turma que, naquele ano, ocupava uma sala de aula em que ele mesmo havia estudado. Sagan conversou com as crianças a respeito da astronomia e da ciência, tendo-lhes dado inclusive fotos tiradas pelas naves Voyager, referentes a planetas, à Via Láctea e ao Sistema Solar. Tirou dúvidas das crianças – “O que é a Via Láctea?”, “Por que a Terra é redonda e não de outra forma?”, etc. A Via láctea, esclareceu, é uma galáxia onde se encontram milhões e milhões de estrelas. A Terra é redonda por causa da força da gravidade, que puxa tudo para o centro.
Sagan elogia os pais e os professores que teve, os quais o incentivaram e instigaram sua curiosidade. A respeito da curiosidade das crianças, Sagan afirma que elas têm um grande senso de curiosidade e uma mente aberta.
Na cena seguinte, Sagan aparece em um ancoradouro junto ao mar, onde, através da fala, faz uma volta ao passado da história humana, até sociedades tribais. Segundo ele, no passado distante, pessoas devem ter-se perguntado acerca do que seriam aquelas luzes no céu. Para uma tribo de caçadores, por exemplo, poderiam ter sido consideradas fogueiras no céu, mantidas por seres que deveriam ter, portanto, imensos poderes. Com isto, Sagan faz uma consideração a respeito da origem de deuses e mitos (relatos sagrados a respeito de deuses, deusas e outros seres divinos e/ou semi-divinos).
Continuando, Sagan cita o exemplo de uma tribo africana para a qual a Via Láctea era considerada a espinha dorsal dos céus noturnos. Daí o nome do episódio deste documentário. Por sua vez, para os gregos antigos, ela seria o leite derramado da deusa Hera. Isto demonstra que os mitos e as religiões são formas explicativas da realidade. Ambos nasceram a partir de perguntas como aquela a respeito das estrelas, fruto da curiosidade humana. Acreditando na existência de seres celestiais, cujos poderes seriam enormes, relatos foram sendo criados, frutos da imaginação. Deuses e deusas foram surgindo, bem como a necessidade de cultuá-los. Com isto, também sacerdotes, mediadores do culto.
Na Ilha de Samos, no Mar Mediterrâneo, próxima à Turquia (Ásia Menor, na antiguidade), Sagan mostra ruínas de um antigo templo dedicado à deusa Hera, feito com uma simetria e uma precisão muito grandes. Sagan fala de cultos sangrentos e de outros que, por sua vez, eram simples e suaves.
Sagan adentra na origem da ciência – e, com ela, da filosofia ocidental – e diz que ela surgiu nas “remotas ilhas do Mar Egeu”. Mas por que ali? Justamente porque ali houve liberdade de pensar suficiente para o surgimento de novas ideias. Aquelas ilhas não eram sedes de grandes impérios, nem de estados em que a religião já havia se cristalizado e nos quais tinha poder. Além disto, aquela foi uma região em que aportavam mercadores e marinheiros de diversos lugares dos mares próximos, do Mediterrâneo (e mares adjacentes). Havia ali também pescadores. O comércio incrementou o movimento e os contatos entre culturas e ideias diferentes. A soma desses fatores tornou possível o livre pensar e o viajar da mente em busca de outras respostas para as perguntas acerca das coisas e do mundo, de acordo com Sagan.
Dois deuses ou mais reivindicando a origem: um deles deve estar certo e o outro errado. “Por que não os dois?” Dúvidas surgiram e com elas a busca de respostas, não mais partindo da religião e dos mitos, mas da própria natureza.
Sagan informa que a Ilha de Samos, séculos antes de Cristo, foi governada por Polícrates, um ditador que fez construir uma extensa muralha e um canal subterrâneo de água que levou cerca de quinze anos para ser construído, projeto do arquiteto Teodoro, fruto do uso brilhante da mente. Diz Sagan que, segundo relatos antigos, Teodoro teria também sido o criador da chave, da régua e do esquadro. E se pergunta por que não há um monumento a esse homem.
Nesse contexto histórico e cultural, por volta de 600 e 500 antes de Cristo, surgiram os primeiros cientistas – os primeiros filósofos do Ocidente, gregos – em Mileto, junto ao Mar Egeu: Tales, Anaximandro e Anaxímenes. Apareceram também, em outras cidades, Empédocles, Pitágoras, Demócrito, além de outros.
Sagan fala, então, de Tales de Mileto, que acreditava ser a água o elemento primordial de tudo que existe. Mas como explicar a terra seca? De acordo com o mito babilônico, o deus Marduk teria lançado um manto sobre as águas e com ele fez a terra seca. Tales, não admitindo as explicações míticas, deve ter partido de informações de que as águas do rio Nilo, na África, durante as inundações, depositavam sedimentos sobre as terras. Conforme Sagan, para Tales, nos princípios, a formação da terra seca deve ter seguido um processo similar.
Sagan refere-se, a seguir, a Anaximandro, conterrâneo de Tales, que aprendeu a fazer uso de um bastão para medir o tempo, por meio da sombra (relógio solar), servindo-lhe inclusive para medir as estações do ano. Sagan diz, então, que, durante séculos, os seres humanos usaram bastões para ferir, machucar. Anaximandro aprendeu a utilizá-lo para medir o tempo.
Na sequência, Sagan fala de Anaxímenes, que fez uma descoberta impressionante: a de que o ar é uma matéria extremamente fina. Um raciocínio desse tipo viria a permitir, posteriormente, o lampejar daquilo que Demócrito afirmaria ser o átomo.
Na linha de Anaxímenes, Empédocles de Agrigento [no Sul da Itália – Magna Grécia] fez uma experiência interessante – retomada por Sagan: colocou em um balde de água um instrumento de cozinha chamado “ladrão de água”, composto de uma esfera metálica perfurada contendo um gargalo com um furo que dá para o exterior. Ao colocá-lo na água, ele se enchia. Tapando com o dedo o orifício do gargalo era possível retirar água do balde e despejá-la em outro utensílio ou mesmo no balde. Colocando esse instrumento com o gargalo fechado, não havia possibilidade de entrada de água. O que isto queria dizer? Que havia algo que bloqueava a entrada. O quê? Empédocles identificou-o com o ar. Estudando-o, percebeu sua finura, de modo até mesmo a permitir ver através dele. O caminho para o levantamento daquela hipótese do átomo estava assim aberto.
Sagan aparece em meio a um grupo de pessoas que estavam festejando, ali na ilha. Fala, então, de Demócrito, que afirmava que na escala do muito pequeno existe uma partícula diminuta e não cortável, indivisível, à qual deu o nome de átomo. Os átomos seriam, segundo Demócrito, portanto, os elementos primordiais a comporem todas as coisas.  E por que Sagan aparece numa festa para falar de Demócrito? Uma razão é que ele menciona o fato deste antigo pensador ter dito que uma vida sem festas é comparável a um longo caminho sem hospedarias, demonstrando assim que Demócrito sabia aliar a ciência e o gosto pelas coisas boas da vida.
A longo dos séculos seguintes, as descobertas daqueles primeiros cientistas (FILÓSOFOS) foram avante? De acordo com Sagan, não. Por quê? Em razão do pensar científico-filosófico ter tomado um outro rumo: o do misticismo. A título de exemplo, Sagan cita um grupo de filósofos místicos que se reuniam, de acordo com a tradição, em uma caverna: os pitagóricos. Pitágoras e seus discípulos fizeram vários estudos matemáticos, tendo descoberto as propriedades de figuras matemáticas como o cubo, a pirâmide (tetraedro), o dodecaedro, o icosaedro e o octaedro. O cubo representando a terra. O tetraedro, o fogo. O icosaedro, a água. O octaedro, o ar. Por fim, o dodecaedro, o cosmos.
 Ao trabalhar com cálculos relacionados ao dodecaedro, os pitagóricos depararam-se com uma raiz quadrada de dois, cujo resultado era irracional. Ora, o irracional não seria admissível. Portanto, a raiz quadrada de dois e o dodecaedro deveriam ficar escondidos do público. Aliás, segundo Sagan, as próprias reuniões realizadas pelos pitagóricos eram secretas. Para eles o mundo material era passageiro e enganador. Caíram no misticismo.
O misticismo pitagórico entrou em cheio no pensamento de Platão, filósofo ateniense que viveu entre os séculos V e IV antes de Cristo. Platão radicalizou o idealismo pitagórico e suprimiu a pesquisa com experimentos, criticou e não retomou as ideias dos filósofos que o precederam, como as de Demócrito, por se voltarem em direção ao mundo material. (Uma curiosidade, os sólidos mencionados de Pitágoras, por Sagan, hoje são conhecidos como sólidos [ou poliedros] de Platão.)
Platão e seu discípulo Aristóteles, menciona Sagan, concordavam com a escravidão, dada a diversidade natural das pessoas, sendo que algumas nasceram para mandar e outras para obedecer.
Muitos séculos depois, na época moderna (séculos XV d.C. em diante), segundo Sagan, as ideias daqueles primeiros filósofos foram redescobertas, aparecendo no novo estilo de pesquisar e explicar o mundo, sem idealismo nem misticismo. Sagan cita como exemplo Christian Huygens, cientistas holandês do século XVII, que fez estudos sobre o universo e as estrelas. Para demonstrar as grandezas das estrelas, Huygens fez furos, com tamanhos diferentes, em um disco de metal. Por meio deles, Huygens estudou a intensidade do brilho de estrelas e pôde determinar a grandeza de muitas delas.
Sagan, enfim, conclui dizendo que, no passado, fomos navegantes – como aqueles marinheiros e pescadores das antigas colônias gregas – e assim continuamos a ser, sempre buscando o conhecimento do mundo que nos rodeia.
O vídeo-documentário de Sagan é muito rico. Ao tratar das origens da ciência – e, portanto, da filosofia – ocidental, traça um percurso que parte desde sua própria experiência pessoal, de sua curiosidade infantil, passando pela escola em que estudou, chegando à Grécia e voltando ao presente.


quinta-feira, 9 de abril de 2020

FILOSOFIA EM POESIA: ALCUÍNO DE IORQUE (YORK) (Prof. José Antônio Brazão.)


FILOSOFIA EM POESIA: ALCUÍNO DE IORQUE (YORK) (Prof. José Antônio Brazão.)

Nos tempos de Carlos Magno,
Rei do Império Franco,
Para cuidar da cultura
Alcuíno de Iorque foi chamado.
Para tamanho empreendimento,
Um homem à altura.

Organizou ele os estudos,
Bibliotecas e instituições.
Pelo currículo de Platão influenciado,
Contra a ignorância os escudos
Das sete artes liberais,
Criando mais homens letrados.

As sete Artes Liberais
Em dois conjuntos se dividiam:
Retórica, Dialética e Gramática
Formavam o Trivium (Três Vias).
O outro conjunto, o Quadrivium:
Geometria, Astronomia, Música e Aritmética.

O grupo da linguagem,
Necessário ao domínio da escrita e da fala,
Da boa expressão e da lógica.
O das ciências, diga-se de passagem,
Essencial à compreensão da natureza
E ao interpretar da realidade cósmica.

Para manter o grande império,
De reinos a dominação,
Carlos Magno bem sabia
Precisar de forte exército,
Mas também da instrução:
Força corporal e mentes sadias.

Cercando-se de bons generais,
Dispondo de muitos impostos,
Restava ainda ao Magno
Rodear-se de intelectuais,
Homens bem dispostos
Ao filosófico e científico trato.

Naquele tempo,
No oitavo século,
Da cultura a maior parte
Quem detinha o conhecimento
Eram os eclesiásticos
A dominar das ciências a arte.

Da Igreja Alcuíno era membro,
Mui dedicado a tudo
Que fazer lhe coubesse,
A qualquer empreendimento,
Da responsabilidade um senso agudo,
Sem exigir vãs benesses.

Cópias de densos textos
De filósofos, de religião,
De Astronomia e Matemática,
De inúmeras ciências, com apreço,
Alcuíno pôs em ação,
Traduções para o latim e da língua a gramática.

Dos melhores Alcuíno circundou-se,
Para alcançar a excelência no trabalho,
Dedicados e brilhantes professores.
A talentosos sábios apegou-se,
Na sapiência forjados
Copistas e tradutores.


Do classicismo greco-romano
Dispunha de excelente entendimento,
O domínio das artes e da ciência,
Preocupou-se, ano após ano,
Em oferecer grande conhecimento
Aos estudantes com grande frequência.

Na arte de escrever talhado,
À de escrever cartas,
Com grande maestria,
Sempre se punha ao trabalho.
E guardava informações detalhadas
De tudo quanto fazia.

Em uma Europa de estrutura feudal,
Na qual cidades e comércio floresciam,
A cultura, em grande parte, nas mãos da Igreja,
Uma sociedade de estrutura estamental
Os servos arduamente mantinham,
A trabalhar para os senhores, reis e clero.

Nesse mundo, o Renascimento Carolíngio,
Ao trazer certas mudanças e novidades,
Preparava do futuro os caminhos,
Com a ajuda do sábio Alcuíno,
Incluso o das posteriores universidades,
Que de ideias e transformações seriam ninhos.

VÍDEO-DOCUMENTÁRIO COSMOS, EPISÓDIO 7: A ESPINHA DORSAL DA NOITE, DE CARL SAGAN (Breve comentário do Prof. José Antônio Brazão.)

COSMOS, EPISÓDIO 7: A ESPINHA DORSAL DA NOITE, DE CARL SAGAN:
Vídeo COSMOS, episódio 7: A Espinha Dorsal da Noite [O Esqueleto da Noite], de Carl Sagan, no YouTube. Site: https://www.youtube.com/watch?v=V2B0ofcckIc
COMENTÁRIO DO PROFESSOR JOSÉ ANTÔNIO BRAZÃO:
O vídeo-documentário COSMOS, episódio 7: A Espinha Dorsal da Noite [ou O Esqueleto da Noite], do astrônomo norte-americano Carl Sagan (1934 – 1996), é um vídeo riquíssimo. Sagan busca as origens da ciência ocidental, indo até locais onde houve colônias gregas, com destaque para a ilha de Samos, na atual Turquia (esta era chamada, na antiguidade, de Ásia Menor). Na verdade, ao buscar as origens da ciência, aponta igualmente para as ORIGENS DA FILOSOFIA.
Mas o que é filosofia e o que tem ela haver com a Ásia Menor (atual Turquia)? A filosofia é a busca racional de entendimento do mundo, da realidade. Como assim? Racional porque é baseada na razão (em grego, logos; em latim, ratio – donde, passando para o português: RACIOnal). Logos, palavra grega, significa: palavra, discurso, razão.
LOGOS é PALAVRA através da qual as pessoas se comunicam umas com as outras. Um termo que também traduz LOGOS é VERBO (do latim, VERBUM) – Só para lembrar: Jesus é chamado de LOGOS de Deus que habitou entre nós, logo no início do Evangelho Segundo João (dê uma olhadinha na Bíblia). O Novo Testamento inteiro foi escrito em grego.
LOGOS é DISCURSO, ou seja, um conjunto de palavras encadeadas, reunidas, de forma existir transmissão de ideias entre as pessoas. Só para lembrar, lá na língua portuguesa temos o DISCURSO DIRETO e o DISCURSO INDIRETO! Ao pé da letra, discurso é o curso em várias direções, o caminho, que seguem as palavras, como o curso do rio que se movimenta por várias direções até chegar ao mar. Aliás, mar é o que havia e há naqueles lados da Ásia Menor (atual Turquia) e da Magna Grécia (Sul da Itália), onde houve colônias gregas, nas quais nasceram diferentes filósofos que refletiram sobre o mundo.
LOGOS é também RAZÃO! E o que é razão? É a capacidade humana de pensar, refletir, analisar, avaliar, compreender, investigar, etc. É a inteligência humana! Ora, a CIÊNCIA e a FILOSOFIA fazem largo uso da razão para investigar e compreender o universo e a realidade do dia a dia, bem como fazem uso da palavra e do discurso (direto, indireto, etc.) para transmitir para outras pessoas suas descobertas.
Veja o quanto devemos ao povo grego! Ao povo romano antigo também, que falava latim. Os romanos, que dominaram a Grécia, gostaram tanto da língua grega e da cultura desse povo que assimilaram parte de sua arquitetura, de seus deuses e deusas (com nomes um pouco diferentes), de sua arte e até de sua língua, além de outros elementos! O latim ficou carregado de palavras gregas! O latim, misturado com línguas de povos dominados, deu origem ao francês, ao espanhol, ao romeno, ao italiano, a parte do inglês, etc., e ao PORTUGUÊS! Pegue uma gramática e um dicionário e veja o montão de palavras, prefixos, sufixos e outros termos da língua portuguesa que têm sua origem grega!
Carl Sagan, no seu documentário, fala da passagem dos MITOS (explicações religiosas) ao pensamento científico (FILOSOFIA, ainda que ele não use esse termo). Sagan fala de PITÁGORAS, que usou o termo COSMOS (Pitágoras era grego) para definir o universo harmônico! E foi um grande matemático. Você se lembra do Teorema de Pitágoras? Ele não o criou, pois tem uma origem que remonta até os antigos babilônicos! Mas foi ele que fez CIÊNCIA matemática usando esse teorema. Sagan também mostra os sólidos dos pitagóricos que representam a terra (cubo), a água (icosaedro), o ar (octaedro) e o fogo (pirâmide) (os quatro elementos de Empédocles!) e o cosmos (dodecaedro).  São conhecidos, principalmente, como SÓLIDOS DE PLATÃO (no livro Timeu, de acordo com a Wikipédia). Veja que os gregos influenciaram também nossa Matemática! Além de outros, como Tales e Anaximandro de Mileto, Sagan menciona outro importante filósofo da natureza: DEMÓCRITO, o descobridor, junto com LEUCIPO, do átomo!
Vale lembrar que o ÁTOMO tem esse nome porque Leucipo e Demócrito acreditavam que era uma partícula minúscula, a menor da matéria, mas indivisível (átomos, em grego, indivisível, de acordo com o Google). A Química e a Física contemporâneas trataram de usar o termo átomo também, advindo de Leucipo e Demócrito, que passou para um filósofo posterior chamado Epicuro de Samos, foi registrado por escritores da antiguidade e chegou aos nossos dias. Mas a Química e a Física atuais sabem bem que o próprio átomo é composto de partículas menores, como os prótons, elétrons, nêutrons, quarks, entre um punhado de outras. Dê uma olhada nos livros de Química e Física que você verá! Livros científicos, internet ...
O vídeo de Sagan é riquíssimo! Veja e reveja-o e você descobrirá coisas m

terça-feira, 25 de fevereiro de 2020

DEMÓCRITO, O VAZIO, O TURBILHÃO E OS ÁTOMOS: (Prof. José Antônio Brazão.)


DEMÓCRITO, O VAZIO, O TURBILHÃO E OS ÁTOMOS: (Prof. José A. Brazão.)
Este texto é complemento de um ou dois textos que o antecedeu(ram) sobre Demócrito, neste site. Tem por fim tecer algumas considerações sobre o vazio e a ação dos átomos no universo (cosmos).
De acordo com as ideias de Demócrito, bem como de seu mestre Leucipo, tudo é formado por átomos e vazio. Eis o que é dito no fragmento 168: “(Os discípulos de Demócrito chamavam os átomos de:) natureza. (No vazio são) projetados em todas as direções.” (IN: BORNHEIM, Gerd. Os Filósofos Pré-Socráticos, p.114. Ver citação no referencial.) (grifos meus). Átomos, como o próprio nome, no grego, diz, são partículas indivisíveis (Idem. Doxografia, frag. 4, p. 125) de matéria. São as partezinhas constituintes de toda a matéria que existe. São em grande número. E o vazio? No fragmento 10 da Doxografia (conjunto de citações e opiniões de outros filósofos e escritores sobre ele, da antiguidade), de acordo com Demócrito e seus discípulos, “o movimento se dá graças ao vazio”. Sem vazio, sem movimento. Se tudo fosse cheio, não haveria espaço para o movimento.
Já havendo comentado sobre o vazio e os átomos anteriormente, como disse, agora sobre o vazio cósmico. De onde poderia Demócrito ter tido a ideia do vazio no cosmos, convivendo com átomos e corpos por eles formados? Nas colônias gregas da Ásia Menor e próximas dali, como é o caso de Abdera (daí Demócrito de Abdera), os céus estampavam os astros – que Demócrito também cria serem formados de incontáveis átomos. Durante o dia, o Sol majestoso, com sua intensa luminosidade e seu calor. À noite, as estrelas, os planetas e outros astros. Se uma pessoa olhar diretamente para o Sol, durante o dia, verá uma esfera de calor e luz fortes, não havendo nada que atrapalhe a visão dele, exceto alguma nuvem, de vez em quando. Mas sem nuvens a visão é clara. O que pode indicar isto? Que há espaço vazio, muito espaço vazio, entre a Terra e o Sol. Curiosamente, dia após dia, a forma do Sol não muda, nada havendo que interfira em sua visão direta.
Se se observar os céus à noite, em noites de céu claro, ver-se-á, dia após dia, as constelações de estrelas sempre na mesma posição, ainda que se movimentando em conjunto em sua esfera, a Lua, os planetas e outros astros em movimento, girando ao redor da Terra, conforme a crença no geocentrismo. Como na visão do Sol, entre a Terra e os astros celestiais noturnos o que há? Espaço. Espaço VAZIO. O fragmento 16 da Doxografia fornece boas pistas e expõe com clareza: “Demócrito tinha a opinião de que os átomos se movem eternamente em um espaço vazio. Há inumeráveis mundos, que se distinguem pelo seu tamanho. (Hippol. I. 13, 2).” (Ibid., p.126). Como durante o dia, o que poderia atrapalhar a visão direta dos astros celestiais noturnos seriam nuvens, em noites de grande nebulosidade ou chuvas.
Uma parede de tijolos ou um muro de pedras não permitem ver além deles por quê? Porque são reuniões de inúmeros átomos tão agregados que a luz e as imagens não podem passar por eles. E os átomos do ar? Sendo gasoso, o ar tem átomos soltos, espalhados, de tal modo que é possível ver para além do espaço vazio que há entre eles. Quando há fumaça de madeira queimando, esta, como também é gasosa, toma espaços vazios entre os átomos que compõem o ar.
Há dois princípios universais, de acordo com Demócrito: o cheio e o vazio. No fragmento doxográfico 2 aparece o seguinte: “Os princípios são o cheio e o vazio. (Aet. I, 3, 16”). Não existe só o cheio, senão não haveria movimento, nem geração de algo novo. Nem só o vazio, pois não haveria possibilidade sequer de se tratar de Demócrito e Leucipo. Ligando o vazio e o cheio, os átomos, as menores partículas da matéria.
E como Leucipo e Demócrito chegaram à conclusão de que há partículas indivisíveis (átomos)? Observando os fenômenos naturais e fazendo, muito certamente, diferentes experimentos simples, usando, além dos sentidos, a imaginação e a razão. Por exemplo: o tijolo ou uma pedra pode ser esmigalhado(a) em pedaços minúsculos; uma fruta pode ser cortada, com uma faca afiada, até o limite do possível. Para além do limite dos pedacinhos possíveis, cortáveis com a faca ou esmigalháveis, atuam a imaginação e a razão (o intelecto). O corpo de um ser vivo, quando morto, se desfaz, chegando até o pó. Ainda que não fosse da cultura grega, mas da hebraica, a Bíblia diz: “Tu és pó e ao pó voltarás” (Gênesis cap. 3), referindo-se ao corpo humano. Pó é algo muito fino, formado de partículas minúsculas. Um pedaço de madeira, queimado ao fogo, libera gases, calor, luz e vira cinzas (pó, partículas minúsculas).
E a espada e outros instrumentos de metal? Enferrujando-se, após um bom tempo, acabam virando pó (pó de ferrugem). Metais, aliás, podem e costumam ser derretidos e sua composição separada, se se quiser, em pedaços pequeninos (bolinhas de metal, por exemplo). Pedaços de metais, por sua vez, podem ser fundidos pelo calor e vir a formar espadas e ferramentas. Pedaços, partes grandes (torrões) e pequenas de matéria-prima metálica.
Outro ponto interessante dos átomos: reunidos, podem ser moldados, combinados e recombinados, obtendo formas diferentes a cada vez, como se vê no caso dos metais. São reutilizáveis pela natureza ou, como diz o fragmento 168, citado, constituem a própria natureza das coisas, dos seres. O fragmento doxográfico 12 aponta: “Demócrito e Leucipo, tendo estabelecido as formas, derivam destas a mudança e a geração; pela reunião e separação, o nascimento e a destruição; pela ordenação e pela posição, a mudança.” (Arist., De gen. corr. 1, 2, 316) (Ibid., p.126). Tudo, no universo, no cosmos, na natureza, de fato, tem formas: os corpos têm uma simetria, as pedras têm arredondamentos, achatamentos, pontas, os astros são redondos (ex.: Sol, Lua, planetas), etc. A mudança e a geração acompanham as formas. Átomos são reunidos e separados. A árvore que um dia nasceu da sementinha, composta por átomos, um dia pode ser destruída pelo fogo ou pela morte e o apodrecimento consequente. Seus átomos, por sua vez, podem ser recombinados em outra ordem ou servir de alimentos a seres que vão crescer e se desenvolver acompanhando uma forma natural, com cada parte em uma dada posição. Enfim, tudo muda.
De onde veio essa ideia da mudança? De Heráclito de Éfeso, outro pré-socrático fundamental. Ele diz que a mudança (o devir ou vir-a-ser) é inerente a todas as coisas, como um rio que flui e no qual não se pode banhar duas vezes nas mesmas águas. Tudo encontra-se em contínuo movimento. Daí se poder entender o que é dito nos fragmentos doxográficos 5 e 6: “(5)Demócrito afirmava como única espécie de movimento o impulso. (Aet. I, 23, 3).” E o (6) acrescenta: “Por necessidade entende Demócrito o choque, o movimento e o impulso da matéria. (Aet. I, 26, 2).”. E de onde vêm o impulso (5), o choque, o movimento e o impulso da matéria? Ocorrem por necessidade. Como assim? São naturais, são inerentes ao mundo natural e cósmico, necessariamente. Ademais, vale lembrar o que diz Demócrito sobre o turbilhão (o redemoinho) no fragmento 167: “Um turbilhão de todos os tipos de formas separou-se do Todo.” Que Todo é este? Uma pista pode ser buscada em Hesíodo.
A Teogonia, livro do poeta Hesíodo, já dizia que tudo veio do Caos e deste foi-se separando. O Caos, pelo que se pode refletir a partir do texto, era a mistura indistinta de tudo (um todo misturado). Do Caos nasceu o Cosmos, o universo ordenado e harmônico (cosmos, no grego, é ordem). Isto mostra que a filosofia, em seu nascimento, ainda guardou algo da reflexão dos mitos, porém indo além destes, buscando uma explicação natural (os átomos de Leucipo e Demócrito são totalmente naturais) para os fenômenos do universo (cosmos) e da Terra que dele faz parte, fundados em causas naturais (fragmento doxográfico 9 de Demócrito, citado à p. 125 de Bornheim).
O Todo (como o Caos de Hesíodo) precisou de espaço para separar-se em partes que viriam a compor o cosmos. Um espaço cheio? Não. Pois não haveria espaço onde dispor os astros e os seres. Então, só poderia ser um espaço VAZIO! O que ajudou nessa separação? O turbilhão.
Demócrito fala de um turbilhão, isto é, de um redemoinho. Redemoinhos de vento, em dias de calor e poeira, são comuns. Em rios e até no mar, há redemoinhos e trombas d’água. Coisas que eram vistas (observáveis) e sabidas naquele tempo. Os astros giram, harmonicamente, ao redor da Terra (geocentrismo antigo). Se se pensar bem, pode-se comparar ao turbilhão que gira. Os planetas giram uniformente, sem nada que os impeça de se mover, no vazio. Outro fragmento dá igualmente pista, o fragmento doxográfico 21: “(...) E de todas as formas, as esféricas são as mais movediças, constituindo estas tanto o fogo como o espírito. (Arist. De Anima, I, 2, 405a)”. Ora, observando a Lua e os planetas, são redondos, esféricos! A redondeza também ajuda no movimento. Quando diz “E de todas as formas...” (grifo meu), pode-se perceber que, além das esféricas mencionadas, os átomos têm diferentes formas e grandezas (fragmento doxográfico 1).
Enfim, Demócrito – como seu mestre Leucipo – foi um grande observador da natureza e, com certeza, um experimentador prático, na vivência do dia a dia, vendo como objetos materiais podem ser separados em pedaços minúsculos, como sofrem geração e destruição, decomposição, queima, transformações dos mais diferentes tipos, e não se tornam um caos, apesar da destruição! Sinal de que a natureza reordena e reposiciona, reaproveitando, todos os átomos, formando novos seres, obedecendo a formas e dando-as aos seres.
As formas estão também nos átomos. Estes são duros (indivisíveis), são muitos, em número e grandeza (tamanhos), conforme o fragmento doxográfico 1, e como se unem? Por ganchos ou encaixes ou engates, objetos e partes de peças visíveis e comuns no tempo de Demócrito e Leucipo, donde ambos devem ter tirado a imagem da presença deles nos átomos. Em O Mundo de Sofia, Jostein Gaarder compara os átomos às peças do brinquedo de Lego, que se encaixam formando objetos dos mais variados tipos e podendo ser desmontadas e encaixadas de formas diferentes, formando outros objetos e seres.
No que tange às formas, o fragmento 3 de Pitágoras (página 50 do livro de Bornheim), outro filósofo Pré-Socrático, aponta que os números estão presentes no universo (cosmos), gerando toda a harmonia e a beleza que o compõem. Universo matemático. A matemática envolve, junto com os números, formas geométricas, embora, no caso da Terra, não extremamente rigorosas como na geometria plana, por conta da matéria e das mudanças. Para se ver que Demócrito e Leucipo não foram os primeiros ou únicos a ver formas no universo e como estas interferem em sua composição e constituição. Mas, para além dos números e nas formas geométricas de Pitágoras, fundados na observação e na decomposição e composição dos seres, constituindo-os, Leucipo e Demócrito conseguiram enxergar, observando os fenômenos cotidianos, com a prática, a imaginação e a razão, os átomos e os seres de diferentes formas que são capazes de constituir e reconstituir, compor, decompor e compor novos, obedecendo as formas (ver fragmento 167, citado acima). Curiosamente, muitos séculos antes dos cientistas contemporâneos chegarem à comprovação da existência do mundo atômico, dos elementos químicos e da tabela periódica. Impressionante! Sinal do poder da razão e da capacidade humana de observar o mundo, imaginar e atravessar as barreiras do espaço e da matéria mensuráveis.
Ainda quanto às formas, dois outros fragmentos doxográficos podem ser citados:
“12 – Demócrito e Leucipo, tendo estabelecido as formas, derivam destas a mudança e a geração; pela união e pela separação, o nascimento e a destruição; pela ordenação e pela posição, a mudança. (Arist., De Gen.corr. 1, 2, 316).” (Id. Ibid., p. 126)
“13 – E como todos os corpos diferem pelas formas, e são infinitas as formas, dizem que também os corpos simples são infinitos. (Arist., De Coelo, III, 4, 303).” (Id. Ibid., p. 126)
Tomando o fragmento 12 primeiramente, a fim de o entender: “12 – Demócrito e Leucipo, tendo estabelecido as formas, derivam destas a mudança e a geração; pela união e pela separação, o nascimento e a destruição; pela ordenação e pela posição, a mudança. (Arist., De Gen.corr. 1, 2, 316).” (Id. Ibid., p. 126) Das formas, ver acima o que já foi comentado. Como elas provocam a mudança e a geração? Seguindo formas naturais, átomos de formas diferentes se unem e separam, num movimento (mudança) constante, como Heráclito acreditava. Como têm formas diferentes, ao se separarem (seres sofrem destruição), encaixam-se com outros, formando outros seres (geração/nascimento), depois outros e assim por diante, ordenando-se e posicionando-se, mudando formas de seres compostos.
Há padrões? Sim, formas naturais. Ora, o universo não é mais um turbilhão caótico, tornou-se um cosmos ordenado, harmônico, ainda que nele haja mudança, geração, nascimento e destruição contínuas. Átomos encaixam-se de formas definidas, formando uma multiplicidade de seres, diferindo-se em formas, que são infinitas (fragmento doxográfico 13), como infinitos são os átomos (“corpos simples”, frag.dox. 13), formando “mundos ilimitados, engendrados e perecíveis” (fragmento dox. 1). No fragmento 2 de Leucipo há um ponto interessante, que ajuda a entender: “Nada deriva do acaso, mas tudo tem uma razão e sob a necessidade” (BORNHEIM, 2000, p. 103). O cosmos tem uma racionalidade (razão) que lhe é inerente e necessária. Olhando-se diretamente para a natureza e os céus é possível ver ordem, apesar das mudanças e transformações que ocorrem no mundo natural.
De onde pode Demócrito ter tirado a ideia de que existem ilimitados mundos? Da infinitude dos “corpos simples” (átomos) (frag.dox. 13). E a partir de que pode também ter extraído o pensamento de que existem outros mundos, além do mundo geocêntrico em que se acreditava na época? Olhando para os céus, à noite, a visão de estrelas dá a ver claramente que são luminosas. Mas igualmente que estão muito distantes. Se se olhar para um farol bem distante, numa noite clara, ele aparece apenas como um ponto luminoso. Aproximando-se mais e mais dele, vê-se que é grande, mais do que mostra a aparência inicial. Então, fazendo um paralelo, as estrelas, distantes, devem ser grandes e, sendo luminosas, podem ser vistas ao longe. Faróis eram comuns naquele tempo. Cidades iluminadas à noite, vistas numa planície ou num monte, de longe também parecem pequenas, tornando-se maiores à medida que se chega a elas. Naquele tempo, cinco séculos antes de Cristo, o Mediterrâneo, mares e terras adjacentes eram povoados por muitas cidades.
Tirou também de seu mestre Leucipo de Abdera. Vejamos o fragmento doxográfico 1. Diógenes Laertius diz:
1 – “Leucipo foi discípulo de Zenão. Pensava que todas as coisas são ilimitadas, e que se transformam umas nas outras; o todo seria vazio e ocupado por corpos; os mundos se formariam quando estes corpos entrassem no vazio, misturando-se uns aos outros; do seu movimento e de sua aglomeração nasceria a natureza dos astros; o Sol se moveria em um círculo maior em volta da Lua; a Terra teria sido levada ao centro por um movimento de rotação, sendo semelhante a um tambor. Foi o primeiro a afirmar os átomos como princípio de todas as coisas. (...) o universo é ilimitado, com uma parte cheia e outra vazia, que chama de elementos. Os mundos que criam são ilimitados e se desfazem nesses elementos. Os mundos se formam da seguinte maneira: muitos átomos de formas variadas reúnem-se no imenso vazio após a separação do ilimitado; uma vez unidos, formam um único turbilhão, e, ferindo-se e rolando em todos os sentidos, separam-se, unindo-se os semelhantes com os semelhantes. (...) (Diog. Laet. IX, 30 ss.)” (BORNHEIM, 2000, p. 104).
Além do mais, sendo tudo feito de átomos e vazio, para além da imensidão dos espaços vazios outros mundos são possíveis, por conta do turbilhão que espalhou átomos por todos os lados (fragmentos filosóficos 167 e 168 de Demócrito), na origem do universo, os quais foram se agregando e tomando formas – a prova disto é que o cosmos é ordem. Havendo outros mundos é preciso que haja sóis que os iluminem. Que sóis? As estrelas. O que elas têm em comum com o Sol? São astros, mas muito distantes. Têm luz. Devem ser tão grandes quanto o Sol, ainda que distantes. Se há outros seres inteligentes nesses mundos, os fragmentos existentes de Leucipo e Demócrito não permitem diretamente inferir.
Impressionante ver que Leucipo e Demócrito enxergaram, junto com os átomos, o vazio (por exemplo, nos fragmentos doxográficos 1, 2)! A física atual (séculos XX e XXI) já sabe que os átomos são divisíveis, sendo compostos de partículas ainda menores e que há entre os elétrons e o núcleo um vazio imenso! Imensas partes do universo, sabe-se hoje, são vazias. Curiosamente, os planetas, luas e outros astros, formados em bilhões de galáxias, são frutos de choques aleatórios, mas seguindo um padrão definido pelas leis da natureza, dentre elas, como Newton descobriu e Einstein revisou, a da gravidade. As subpartículas, na origem do Big Bang, se chocavam no vazio, foram-se agregando, formando átomos de Hidrogênio e Hélio, dando origem a estrelas, galáxias, nebulosas e mundos menores ao redor de estrelas. As nebulosas são verdadeiros turbilhões de matérias, mães de estrelas, de planetas e outros astros. Assim aconteceu com o sistema solar. É claro, vale lembrar que o mundo de Leucipo e Demócrito era geocêntrico, mas de uma grandeza maior do que se pensava então, constituído de “ilimitados mundos” (fragmento doxográfico 1 de Leucipo, e fragmento doxográfico 1 de Demócrito). Perecíveis (fragmento doxográfico 1 de Demócrito)! O universo do Big Bang, como se sabe hoje, é igualmente perecível, com átomos e subpartículas, matéria (grande parte) e anti-matéria. Ou como diz Einstein: energia e matéria (E = m.c2[ao quadrado]).
Onde Demócrito e Pitágoras, com visões diferentes, viam formas a comandar a estruturação do cosmos e da natureza, impedindo-o de ser permanente caos, hoje a ciência vê leis naturais, tanto as fundamentais, como a gravidade, quanto outras leis.
Leucipo e Demócrito nem sequer chegaram a imaginar um Big Bang, mas a ideia do turbilhão, em que o vazio e o cheio interagem, é muito interessante. Não foram visionários do futuro, apenas homens curiosos, desejosos de saber para além do que até então era ensinado pelos mitos e pelas religiões. Usando a visão, outros sentidos, a imaginação e a razão (o logos, no grego), foram capazes de irem além, de enxergar imaginariamente ÁTOMOS em todos os seres e em ilimitados mundos, em meio ao vazio. Os átomos existem de fato, ainda que, sabe-se hoje, divisíveis por fissão nuclear. Um universo em que as formas encontram-se presentes claramente. Como sugestão, veja-se um desenho simples, Donald no País da Matemágica, que menciona Pitágoras, Galileu Galilei e as formas matemáticas, presentes desde as espirais de galáxias até nas simples flores, bem como no restante do mundo natural. Além do desenho, quem se interessar, em inglês há The Great Math Mystery NOVA, além de muitos livros de filosofia, astronomia, astrofísica, etc., incluindo livros didáticos escolares.
Demócrito influenciou profundamente um filósofo helenístico posterior, Epicuro de Samos, citado no fragmento doxográfico 3 de Demócrito (BORNHEIM, op. cit., p.124), que aprendeu com seguidores do atomismo de Leucipo e Demócrito. Dante, na Divina Comédia, no mundo medieval, cita Demócrito entre outros pensadores de outros tempos. Veja-se:
“Honrarias todos vão lhe oferecer;
Sócrates vejo entre eles e Platão,
mais próximos que os outros, a o entreter.

Demócrito que o acaso faz razão
do mundo, e Annaxágoras e Tales,
Empédocles, Heráclito e Zenão;

Dioscórides que às plantas deu avales,
e Túlio, Lino, Diógenes e Orfeu;
Sêneca, que indagou do mundo os males;

o geômetra Euclides, Ptolomeu,
Hipócrates, Avicena e Galeno,
e Averróis que o Comentário nos deu.”

(Trecho da primeira parte de A Divina Comédia, intitulada Inferno, Canto IV, versos 133 a 144. Ver citação completa no Referencial Bibliográfico.)

Outro pensador fundamental dentre os pré-socráticos, que também acreditava em partículas minúsculas, as HOMEOMERIAS, foi Anaxágoras de Clazômenas. Mas este fica para outro texto.
REFERENCIAL BÁSICO:
ALIGHIERI, Dante. A Divina Comédia. (La Divina Commedia) Trad. Ítalo Eugenio Mauro. Rio de Janeiro, Editora 34 Ltda., 2009. (FNDE – MEC, PNBE, ano 2011)
BORNHEIM, Gerd (organizador). Os Filósofos Pré-Socráticos. pdf. São Paulo, Cultrix, 1998 – 2000. Disponível em: < https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=sites&srcid=ZGVmYXVsdGRvbWFpbnxpZnJqZmlsb3NvZmlhfGd4OjU0MzgwMzA2MDY0NWQ4ZDk > Acesso em 22 de fevereiro de 2020.
EPICURO. Pensamentos. Trad. Johannes Mewaldt e outros. São Paulo, Martin Claret, 2006.
HESÍODO. Teogonia – A Origem dos Deuses. Trad. Jaa Torrano. São Paulo, Iluminuras, s/ data. (Biblioteca Pólen, s/ número.) Disponível em: < https://www.assisprofessor.com.br/documentos/livros/hesiodo_teogonia.pdf > Acesso em 22 de fevereiro de 2020.

SUGESTÃO DE VÍDEOS:
COSMOS, Episódio 7: A Espinha Dorsal da Noite. De Carl Sagan. Disponível no Youtube. Trata os filósofos pré-socráticos gregos. (Em português e em inglês.)
DONALD NO PAÍS DA MATEMÁGICA – Disponível no Youtube. Trata da matemática presente na natureza, como Pitágoras a via, nos jogos, nas máquinas, em tudo no universo. Aí as formas geométricas! (Em português, inglês e até em espanhol.)
BBC/NOVA. THE GREAT MATH MYSTERY. Disponível no Youtube em: < https://www.youtube.com/watch?v=mpcpzXuzdQk > Acesso em 25 de fevereiro de 2020. Similarmente ao desenho de Donald, trata da matemática presente em tudo. (Em inglês.)

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

QUARTA QUESTÃO COMENTADA DE FILOSOFIA DO ENEM 2018. (Professor José Antônio Brazão.)


QUARTA QUESTÃO COMENTADA DE FILOSOFIA DO ENEM 2018 (Prof. José Antônio Brazão.)
Questão 67 do caderno branco do ENEM 2018 FILOSOFIA:
A quem não basta pouco, nada basta. (Epicuro. Os pensadores. São Paulo, Abril Cultural, 1985.)
Remanescente do período helenístico, a máxima apresentada valoriza a seguinte virtude:
(A)  Esperança, tida como confiança no porvir.
(B)  Justiça, interpretada como retidão de caráter.
(C)  Temperança, marcada pelo domínio da vontade.
(D)  Coragem, definida como fortitude na dificuldade.
(E)   Prudência, caracterizada pelo correto uso da razão.
RESPOSTA: (C) Temperança, marcada pelo domínio da vontade.
(ENEM 2018. Questão 67 do caderno branco [Questão de Filosofia]. Disponível em: http://portal.inep.gov.br/web/guest/provas-e-gabaritos . Acesso em 05 de fevereiro de 2020.)
COMENTÁRIO:
A resposta é a letra C, por quê? Porque a vontade é que domina os desejos. O desejo que querer ter mais que guarda o perigo de se querer mais e mais, numa ambição sem fim. Daí, nada, de fato, basta a quem acredita que o pouco não basta, isto é, a quem o pouco não é suficiente.
Epicuro viveu entre 341 e 270 antes de Cristo, de acordo com a Wikipédia. Ou seja, entre os séculos IV e III a.C. No período da filosofia grega conhecido como período helenístico. Este foi um período em que o Império Macedônico estendeu seu domínio por vastas regiões do mundo antigo, incluindo a Grécia. Por influência dos macedônicos, principalmente de Alexandre Magno e seus generais, a cultura helênica (grega) estendeu-se por aquelas regiões. Epicuro foi um filósofo helenístico!
De acordo com o Dicio – Dicionário Online de Português:
 helênico
Significado de Helênico
substantivo feminino
Pessoa que nasceu na Grécia antiga (Hélade).
[Linguística] Tronco linguístico do qual se originou o grego moderno e o coiné.
adjetivo
Relativo à Grécia antiga, ao seu povo, aos seus costumes.
Etimologia (origem da palavra helênico). Do grego hellenikós.
Sinônimos de Helênico
Helênico é sinônimo de: grego, heleno” (IN: https://www.dicio.com.br/helenico/ )
A cultura grega, de fato, neste tempo, já havia alcançado grande desenvolvimento, o que pode ser visto na arquitetura e na engenharia extraordinárias, com precisão matemática, na própria matemática (vale citar Tales de Mileto, Pitágoras, Platão e seus sólidos, entre outros), na arte, na religião, na astronomia, na filosofia (pré-socráticos, por volta dos séculos VII e VI a.C., sofistas, Sócrates, Platão e Aristóteles, do período chamado clássico, além dos helenísticos posteriores). A própria língua grega. A admiração dos macedônicos foi enorme. Diferentes correntes filosóficas surgiram no período helenístico (que vai, por volta, do século IV a.C. ao V ou VI d.C., aproximadamente), podendo ser citadas: o epicurismo, o estoicismo, o cinismo, o neoplatonismo, além de outras.
O epicurismo, como o nome aponta, foi fundado por Epicuro de Samos, o da questão acima. Ensinava a busca do prazer, de forma equilibrada, ao longo da vida. Para os epicuristas tudo é feito de átomos e tudo se desfaz, voltando os átomos a constituírem novos seres. O estoicismo, de Zenão de Cítio (Citium), propunha o controle dos desejos e das paixões. O cinismo, fundado por Antístenes de Atenas (444 – 365 a.C.) e que teve Diógenes de Sínope (413 – 323 a.C.) como grande representante, desprezava riquezas e o apego a coisas efêmeras. Diógenes levou a ideia tão a sério que viveu em um barril, em Atenas.
Os epicuristas não eram radicais. Pelo contrário, propunham a busca do prazer, pois para eles não existia vida além desta vida humana. Mas o prazer precisa ser equilibrado, caso contrário, em vez de bem, pode fazer mal. “A quem não basta pouco, nada basta.”, conforme Epicuro. Pois uma pessoa que não aprende a contentar-se com o pouco, pode perder o controle sobre seus desejos, entrar numa ambição desenfreada e maléfica para ela própria e para outras pessoas. A vontade deve controlar o desejo, a busca de prazer, não perdendo esta, mas educando-a, a fim de que o prazer, sendo buscado quotidianamente, seja tão equilibrado que seja continuamente benéfico, reduzindo os sofrimentos e as dores quase a nada.
A temperança é uma grande virtude. É aquela que ensina à vontade o controle sobre os desejos, não permitindo nem a falta nem o excesso. Nem ser anoréxico, nem ser guloso, mas alimentar-se prazerosamente de modo equilibrado, beneficiando e mantendo a saúde e a vitalidade do corpo. Nem a falta de bens ou de dinheiro nem a ambição desenfreada que é capaz de levar alguém até a pisar sobre os outros para conseguir o que quer e que quer cada vez mais. O prazer do ter é resultante do desejo e da busca temperante dos bens. Aí a resposta “(C) Temperança, marcada pelo domínio da vontade.” ser a correta. Nesse sentido, a afirmação de Epicuro adequa-se ao que propõe sua filosofia.
Uma curiosidade: Paulo apóstolo, o cristão, discutiu com filósofos estoicos e epicureus (epicuristas) no Areópago, em Atenas, de acordo com o capítulo 17 (dezessete) do livro bíblico Atos dos Apóstolos, do Novo Testamento. O fato de terem saído da discussão, no momento em que Paulo, em sua fala, apresentou a ressurreição, é porque não criam na imortalidade da alma. Tudo é feito de átomos (teoria aprendida com seguidores de Leucipo e Demócrito) e tudo se desfaz.
Outra curiosidade: um rico seguidor de Epicuro e do epicurismo, chamado Diógenes de Enoanda, do século II da era cristã, amava tanto essa filosofia e queria tanto que outras pessoas a aprendessem a ponto de mandar inscrever em muros de Enoanda, “na Lícia (atual sudoeste da Turquia )” (Wikipédia), as doutrinas epicuristas! Muitas dessas inscrições ainda existem por lá, umas inteiras, outras em parte.