quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

QUARTA QUESTÃO COMENTADA DE FILOSOFIA DO ENEM 2018. (Professor José Antônio Brazão.)


QUARTA QUESTÃO COMENTADA DE FILOSOFIA DO ENEM 2018 (Prof. José Antônio Brazão.)
Questão 67 do caderno branco do ENEM 2018 FILOSOFIA:
A quem não basta pouco, nada basta. (Epicuro. Os pensadores. São Paulo, Abril Cultural, 1985.)
Remanescente do período helenístico, a máxima apresentada valoriza a seguinte virtude:
(A)  Esperança, tida como confiança no porvir.
(B)  Justiça, interpretada como retidão de caráter.
(C)  Temperança, marcada pelo domínio da vontade.
(D)  Coragem, definida como fortitude na dificuldade.
(E)   Prudência, caracterizada pelo correto uso da razão.
RESPOSTA: (C) Temperança, marcada pelo domínio da vontade.
(ENEM 2018. Questão 67 do caderno branco [Questão de Filosofia]. Disponível em: http://portal.inep.gov.br/web/guest/provas-e-gabaritos . Acesso em 05 de fevereiro de 2020.)
COMENTÁRIO:
A resposta é a letra C, por quê? Porque a vontade é que domina os desejos. O desejo que querer ter mais que guarda o perigo de se querer mais e mais, numa ambição sem fim. Daí, nada, de fato, basta a quem acredita que o pouco não basta, isto é, a quem o pouco não é suficiente.
Epicuro viveu entre 341 e 270 antes de Cristo, de acordo com a Wikipédia. Ou seja, entre os séculos IV e III a.C. No período da filosofia grega conhecido como período helenístico. Este foi um período em que o Império Macedônico estendeu seu domínio por vastas regiões do mundo antigo, incluindo a Grécia. Por influência dos macedônicos, principalmente de Alexandre Magno e seus generais, a cultura helênica (grega) estendeu-se por aquelas regiões. Epicuro foi um filósofo helenístico!
De acordo com o Dicio – Dicionário Online de Português:
 helênico
Significado de Helênico
substantivo feminino
Pessoa que nasceu na Grécia antiga (Hélade).
[Linguística] Tronco linguístico do qual se originou o grego moderno e o coiné.
adjetivo
Relativo à Grécia antiga, ao seu povo, aos seus costumes.
Etimologia (origem da palavra helênico). Do grego hellenikós.
Sinônimos de Helênico
Helênico é sinônimo de: grego, heleno” (IN: https://www.dicio.com.br/helenico/ )
A cultura grega, de fato, neste tempo, já havia alcançado grande desenvolvimento, o que pode ser visto na arquitetura e na engenharia extraordinárias, com precisão matemática, na própria matemática (vale citar Tales de Mileto, Pitágoras, Platão e seus sólidos, entre outros), na arte, na religião, na astronomia, na filosofia (pré-socráticos, por volta dos séculos VII e VI a.C., sofistas, Sócrates, Platão e Aristóteles, do período chamado clássico, além dos helenísticos posteriores). A própria língua grega. A admiração dos macedônicos foi enorme. Diferentes correntes filosóficas surgiram no período helenístico (que vai, por volta, do século IV a.C. ao V ou VI d.C., aproximadamente), podendo ser citadas: o epicurismo, o estoicismo, o cinismo, o neoplatonismo, além de outras.
O epicurismo, como o nome aponta, foi fundado por Epicuro de Samos, o da questão acima. Ensinava a busca do prazer, de forma equilibrada, ao longo da vida. Para os epicuristas tudo é feito de átomos e tudo se desfaz, voltando os átomos a constituírem novos seres. O estoicismo, de Zenão de Cítio (Citium), propunha o controle dos desejos e das paixões. O cinismo, fundado por Antístenes de Atenas (444 – 365 a.C.) e que teve Diógenes de Sínope (413 – 323 a.C.) como grande representante, desprezava riquezas e o apego a coisas efêmeras. Diógenes levou a ideia tão a sério que viveu em um barril, em Atenas.
Os epicuristas não eram radicais. Pelo contrário, propunham a busca do prazer, pois para eles não existia vida além desta vida humana. Mas o prazer precisa ser equilibrado, caso contrário, em vez de bem, pode fazer mal. “A quem não basta pouco, nada basta.”, conforme Epicuro. Pois uma pessoa que não aprende a contentar-se com o pouco, pode perder o controle sobre seus desejos, entrar numa ambição desenfreada e maléfica para ela própria e para outras pessoas. A vontade deve controlar o desejo, a busca de prazer, não perdendo esta, mas educando-a, a fim de que o prazer, sendo buscado quotidianamente, seja tão equilibrado que seja continuamente benéfico, reduzindo os sofrimentos e as dores quase a nada.
A temperança é uma grande virtude. É aquela que ensina à vontade o controle sobre os desejos, não permitindo nem a falta nem o excesso. Nem ser anoréxico, nem ser guloso, mas alimentar-se prazerosamente de modo equilibrado, beneficiando e mantendo a saúde e a vitalidade do corpo. Nem a falta de bens ou de dinheiro nem a ambição desenfreada que é capaz de levar alguém até a pisar sobre os outros para conseguir o que quer e que quer cada vez mais. O prazer do ter é resultante do desejo e da busca temperante dos bens. Aí a resposta “(C) Temperança, marcada pelo domínio da vontade.” ser a correta. Nesse sentido, a afirmação de Epicuro adequa-se ao que propõe sua filosofia.
Uma curiosidade: Paulo apóstolo, o cristão, discutiu com filósofos estoicos e epicureus (epicuristas) no Areópago, em Atenas, de acordo com o capítulo 17 (dezessete) do livro bíblico Atos dos Apóstolos, do Novo Testamento. O fato de terem saído da discussão, no momento em que Paulo, em sua fala, apresentou a ressurreição, é porque não criam na imortalidade da alma. Tudo é feito de átomos (teoria aprendida com seguidores de Leucipo e Demócrito) e tudo se desfaz.
Outra curiosidade: um rico seguidor de Epicuro e do epicurismo, chamado Diógenes de Enoanda, do século II da era cristã, amava tanto essa filosofia e queria tanto que outras pessoas a aprendessem a ponto de mandar inscrever em muros de Enoanda, “na Lícia (atual sudoeste da Turquia )” (Wikipédia), as doutrinas epicuristas! Muitas dessas inscrições ainda existem por lá, umas inteiras, outras em parte.


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