Definindo DIDÁTICA, de um modo geral:
Definição 1:
didática
Significado de Didática
s.f. Arte de ensinar; o
procedimento pelo qual o mundo da experiência e da cultura é transmitido pelo
educador ao educando, nas escolas ou em obras especializadas.
Conjunto de teorias e técnicas relativas à transmissão do conhecimento.
Conjunto de teorias e técnicas relativas à transmissão do conhecimento.
Definição de Didática
Classe gramatical: substantivo feminino
Separação das sílabas: di-dá-ti-ca
Plural: didáticas
Separação das sílabas: di-dá-ti-ca
Plural: didáticas
DICIO Dicionário Online de Português. Didática. Disponível em: http://www.dicio.com.br/didatica/ Acesso em 06 de
julho de 2016.
Definição 2:
didática | s. f.
fem. sing. de didático
di·dá·ti·ca |át|
(francês didactique)
substantivo feminino
1. Arte de ensinar com
método os princípios de uma ciência ou as regras e preceitos de uma arte.
2. Ciência que estuda os
métodos e técnicas para ensinar.
3. Obra ou manual
.didático.
Palavras relacionadas:
didático, didata,
organotáctico, biotáctico, autodidática, inexato, mórfico-sintático
.di·dá·ti·co |át|
(grego didaktikós, -ê,
-ón, apto para ensinar)
adjetivo
1. Próprio da .didática.
2. Que tem por fim
instruir (ex.: unidade didática).
3. Que facilita o ensino
ou a aprendizagem; que serve para ensinar ou aprender (ex.: jogos .didáticos).
4. Que procura educar ou
ensinar (ex.: discurso .didático).
Palavras relacionadas:
didática, didaticamente,
didata, organotáctico, autodidática, biotáctico, pedagógico
"didática",
in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013,
http://www.priberam.pt/dlpo/did%c3%a1tica [consultado em 06-07-2016].
Filósofos
e filósofas não escrevem somente para seus pares (outros filósofos e
filósofas). No transcurso dos mais de dois milênios da história da filosofia,
houve filósofos e filósofas que tiveram uma preocupação em divulgar de uma
forma que poderíamos chamar didática para um público leitor mais amplo e
não tão preparado como discípulos e estudiosos. A didática é aplicação de
métodos e recursos que podem propiciar um aprendizado maior de cada estudante, indo para além disto, incluindo arte (arte de
ensinar), diálogo, investigação, pesquisa, interrogação, problematização, além
de outros elementos fundamentais ao aprendizado.
Portanto, ela volta-se para o ensino direto, seja numa escola, numa
universidade ou ambiente formal de ensino. No entanto, o modo de escrever, de
levar o conhecimento e as discussões que se encontram na filosofia pode ser
comparado à didática. O que se quer aqui é apresentar, em linhas gerais, como o
modo de transmissão de ideias, questões e discussões filosóficas, similar à
didática, ocorreu em alguns pensadores, ao longo dos dois últimos 2,5 milênios,
aproximadamente, e como isto pode apontar elementos que auxiliem a didática
hoje, particularmente no ensino de Filosofia nas escolas.
Obs.
1:
O que está em negrito e sublinhado são recursos que podem ser observados em
cada tempo, comparáveis aos didáticos ou, de fato, didáticos. Obs. 2:
Algumas dessas marcas são apenas reforços de alguns elementos importantes.
Aprender
como filósofos e filósofas transmitiram e transmitem “didaticamente” as ideias
filosóficas pode ser, efetivamente, muito valioso para o trabalho em sala de
aula. Além da filosofia propriamente dita, feita por cada um(a), pode-se
aprender algo mais: o jeito de transmitir o conhecimento próprio da filosofia.
E, de fato, muitos deles e delas (filósofos e filósofas) souberam e sabem fazer
tal transmissão, especialmente para um público maior e as pessoas comuns. É
claro, não se quer aqui definir como acabado o que se diz de alguns recursos
didáticos usados por filósofos, aqui apresentados. Cada filósofo(a) teve e tem
recursos de transmissão da filosofia que vão além dos poucos expostos neste
texto. E conhecer alguns de tais recursos pode ser de grande valor para o
ensino-aprendizado de Filosofia nas escolas.
A
começar pelos mitos sobre deusas, deuses e outros seres divinos, sobre suas
ações e seus poderes. O poder dos mitos não advém somente do seu conteúdo, mas
também do modo como eram transmitidos: por meio da palavra, das histórias
daqueles que, “contando um conto, aumentavam um ponto” (ditado popular), num
tempo em que a escrita ainda não era muito divulgada ou comum (e até bem antes
da escrita) – sacerdotes, sacerdotisas, poetas, rapsodos, aedos, pais, mães,
entre outros. Histórias que
eram contadas com entusiasmo,
histórias que deixavam estupefatos os que as ouviam, histórias que metiam medo
nas crianças, sobre o Hades, as Górgonas, os Titãs e outros lugares ou seres
divinos perigosos, sobre a criação do mundo e outros pontos religiosos.
Histórias
míticas que eram reforçadas pelos cultos e por todos os aparatos neles
contidos, os rituais, o passo a passo, as orações, procissões e outros meios
usados para ligar homens, mulheres, deuses e deusas entre si. Histórias relatadas também pelo
movimento do corpo, das mãos, dos gestos, do rosto e de suas feições,
pela entonação das vozes e a emoção
nelas contidas, imitando as ações dos seres divinos primordiais. Histórias repetidas, contadas,
recontadas, aumentadas e revivenciadas, muitas e muitas vezes, no
transcurso dos séculos e milênios, a cada vez que eram expostas. Histórias, com
certeza, também carregadas de ideologia, mas histórias.
No
início da filosofia, curiosamente, o meio didático de transmissão do pensamento
filosófico foi o poema.
Poemas contêm versos e estrofes,
rimas! Muitos dos primeiros filósofos pré-socráticos, senão todos,
fizeram uso desse artifício didático, no intuito de transmitir suas ideias
filosóficas e suas descobertas, seu pensamento a respeito da realidade. Por que
o poema? Naquele tempo, por volta dos séculos VII (7), VI (6) e V(5) antes de
Cristo, histórias a respeito de deusas e deuses, da origem do mundo e dos seres
já haviam sido postas na forma de poemas por aedos e rapsodos (antigos poetas,
contadores e transmissores de histórias do mundo grego antigo), tendo por destaque
Homero (Ilíada e Odisseia) e Hesíodo (Teogonia
e Os Trabalhos e os Dias). Então,
tratar da filosofia e das novas ideias que ela carregava a respeito do mundo
por meio da poesia poderia ser um meio para a divulgação daquilo que pensaram
os primeiros filósofos. Temos então a poesia
como um recurso didático de exposição e divulgação do pensamento filosófico.
Também a prosa.
Além
dos pré-socráticos, houve também os sofistas. Para transmitir o que pensaram,
além da prosa, davam aulas a respeito dos temas de que tratavam. Eles, de fato,
foram professores itinerantes (que iam de um lugar a outro) no mundo grego,
indo de uma cidade a outra oferecendo aulas,
em troca de dinheiro, sobre temas que poderiam auxiliar a todos os desejosos de
uma participação e de uma influência no âmbito político daquele tempo.
O
sofista Górgias de Leontini, em seu Elogio
a Helena, fez uso da defesa,
expondo argumentos em defesa daquela que, por muitos daquele tempo, era mal
vista, por ter se relacionado com um troiano, relação esta que desembocou na
terrível Guerra de Troia e todos os males que com esta vieram. Na verdade,
Górgias, ao fazer o papel de advogado de defesa daquela mulher, que aparece na
Ilíada, de Homero, quis também demonstrar para seus leitores e alunos o quanto
a destreza no discurso é capaz de levar ao convencimento das pessoas, quis
mostrar o poder contido no discurso, nas palavras.
Sócrates,
que viveu entre 469\468 e 399 a.C., filósofo que é tido como marco divisor na
filosofia grega (pré-socráticos\pós-socráticos), fez uso do diálogo um recurso didático
(recurso de ensino-aprendizagem), envolvendo a ironia e a maiêutica, na busca
de levar seus interlocutores, incluindo pessoas comuns, a uma reflexão mais
profunda sobre aquilo que, até então, era tido como verdade, permitindo-lhes
descobrir incoerências e dando um passo reflexivo maior, para além daquilo que
era dado e aprendido como certo.
A
primeira etapa da didática socrática, a ironia,
envolvia questionamentos seguidos, reforçados com outros após as respostas
superficiais ou prontas dos interlocutores, obrigando-os a refletir sobre o que
disseram, a descobrirem as incoerências de seus discursos, a verem que muitas
das pretensas verdades em que acreditavam eram, na verdade, muitas delas,
frutos da tradição social e da educação recebida e da pretensa (pretendida)
autoridade de certas pessoas. A segunda etapa, ocorrida quando Sócrates
percebia que o interlocutor (debatedor) entrara em muitas contradições e não
conseguia sair delas, envolvia um movimento de descoberta, de reflexão e de
busca de uma compreensão mais crítica dos conhecimentos recebidos e percepção
de verdades interiores mais profundas: a maiêutica,
arte de partejar ideias. Uma reflexão gestada a partir do interior da pessoa
com a qual o diálogo era travado, fruto do repensar, do refletir, do
desvelamento (tirada do véu) da realidade (em grego, verdade é aletheía, traduzida por desvelamento),
com a descoberta de sofismas (raciocínios falsos aparentemente verdadeiros) e
incoerências. Sócrates não gostava de dar respostas prontas. Fazia um movimento dialógico de problematização (ação de
problematizar), ao longo do qual
gestava-se e paria-se o novo.
Platão
(séc. V\IV, 5\4, a.C.), seguindo os passos do mestre, também fez uso do diálogo
como recurso didático. Além deste recurso, também fez uso do MITO. O mito é uma história, um
relato. Por muitos séculos, o mito havia sido um meio de contar histórias a
respeito de deusas, deuses e outros seres divinos (semideusas, semideuses,
etc.). Platão, observando o poder didático do mito, soube fazer uso dele
como instrumento de ensino-aprendizagem de filosofia. Em suas obras aparecem,
com efeito, muitos mitos, dentre os quais alguns são bastante conhecidos, como
o mito da caverna, o mito de Er, o mito do Andrógino e outros mais. O mito
carrega consigo o poder da palavra e, fortemente aliado a esta, o poder da
imagem. O mito mexe com a imaginação das pessoas, como o faziam os mitos sobre
as divindades gregas (e também de outros povos). A imaginação é poderosíssima.
Junto com ela e a palavra, a construção discursiva (dos discursos). Platão,
como filósofo e professor (fundou a Academia, uma escola filosófica superior,
em Atenas), como escritor, soube manejar, como poucos, a pena, no contar de
histórias fantasiosas – histórias
cheias de fantasia, imaginação e razão, de racionalidade –, de cunho
eminentemente filosófico, com a finalidade de contribuir didaticamente para um
entendimento maior do pensamento contido em sua filosofia.
Um
exemplo clássico possível, dentre vários outros, da ironia e da maiêutica
socráticas, assimiladas pelo grande discípulo de Sócrates, pode ser vistos em
um livro de Platão. Em A República,
no livro VII, Sócrates dialoga com Glauco, parente de Platão, a respeito de
prisioneiros que se encontravam numa caverna, desde pequenos, presos de tal
modo que só podiam olhar para a frente e para os lados, observando o que era
passado no fundo da caverna: imagens em movimento, acompanhadas de sons, que
davam aparência de serem verdades. Atrás deles e delas, pois eram homens,
mulheres e crianças, havia um pequeno muro que separava os prisioneiros de
pessoas que passavam pela caverna, carregando objetos em suas cabeças. Mais
acima, perto da entrada, uma fogueira espargia (espalhava) sua luz pela
caverna, que chocava-se contra os objetos nas cabeças, vindo a projetar suas
sombras, em movimento, no fundo da caverna. As pessoas livres conversavam entre
si e o reverberar de suas vozes dava aparência de serem vozes das sombras
projetadas. Era um mundo sombrio e de aparências!
Certo
dia, um dos prisioneiros foi liberto e obrigado a ter que sair. Com
dificuldades, principalmente visuais, por conta do contato com a luz direta que
emanada da fogueira, ao longo do caminho foi fazendo descobertas, a ver como
era a realidade dentro da caverna: seus companheiros sentados e discutindo a
respeito das sombras, a mureta, as pessoas que passavam por trás dela com
objetos nas cabeças, o fogo da fogueira e a luz que projetava sombras, entre
outras características da caverna e dos seres que nela estavam. Viu que tudo o
que vira até então nada mais seriam do que sombras, pura aparência da verdade
que lhe era desvelada no transcurso do caminho.
Na
saída para fora da caverna, novo impacto, de uma luz ainda mais forte, a luz do
Sol, mas também, devagar e progressivamente, foi descobrindo, às noites e durante
os dias, um mundo novo, muito mais verdadeiro que que tudo o que, até tempos
atrás, estava acostumado a ver. Enfim, depois de um bom tempo fora da caverna e
bem acostumado a ver as belezas do mundo externo, o liberto resolveu voltar à
caverna, passando por dificuldades de readaptação, até chegar a seus antigos
companheiros, mas o comodismo e os interesses em jogo (havia gente que se
beneficiava com as competições em torno dos seres passados na parede da
caverna), acabaram não aceitando a proposta e, inclusive, pondo em risco a vida
do liberto.
Essa
história mítico-filosófica de Platão ilustra bem como este entendia a educação:
um movimento, nada fácil, de saída
progressiva da caverna, no decurso do qual a aparência dá lugar à verdade, a prisão dá lugar à liberdade, as
sombras à luz, a ignorância ao conhecimento, sempre numa atitude de elevação da alma e de descoberta constante do novo e da
verdade. A educação permite, com efeito, a descoberta de um mundo novo,
de um modo novo de enxergar a vida e até de compreender-se a si mesmo – o
liberto descobriu que fora prisioneiro das correntes e, principalmente, das
ilusões contidas nas sombras, mas conseguiu, com muito esforço e, às vezes, com
a tentação de desistir e voltar atrás, enxergar além e libertar-se. Eis, sem
dúvida, um dos objetivos da educação. A saída do prisioneiro é um processo
didático muito interessante: forçado
a sair, a deixar de lado a antiga vida que levava, seguindo um caminho, em um percurso cheio de descobertas, a cada momento, o
novo, na descoberta da verdade e do
saber, enxergando, a
toda hora, algo diferente, elevando-se
cada vez mais, mas também preocupando-se
com os outros e desejando liberta-los. A busca da verdade e do conhecimento verdadeiro é, como aí se
pode perceber, um movimento de
libertação, de quebra das ilusões e uma atitude altruísta (de
preocupação com os outros e com sua libertação – aqui, no caso, a libertação
das ilusões, de suas correntes e da ignorância). Socrático e didático por
excelência!
Aristóteles,
outro dos grandes filósofos gregos, senão o maior, oferecia, no Liceu (escola
filosófica que, como seu mestre Platão, fundou em Atenas), aulas exotéricas (para um público maior, de pessoas menos
entendidas em filosofia) e esotéricas
(para seus alunos e iniciados no pensamento filosófico). Sem dúvida, as
primeiras (exotéricas) deviam dispor de um linguajar mais comum e de mais fácil
entendimento da filosofia, enquanto, nas segundas (esotéricas), um linguajar
mais complexo. Mas havia, no segundo caso, para seus estudantes no Liceu, o
recurso das aulas em passeios e
caminhadas pelos espaços da escola. As pessoas, inclusive, conheciam os
discípulos do Liceu como peripatéticos, palavra advinda do grego e que
significa passeadores. E se o mito tinha um poder imaginário e discursivo muito
forte, em Platão, que poder tinham os passeios dos peripatéticos do Liceu? O
passeio sai do estilo tradicional de sala de aula ou de espaço fechado de
ensino. Apesar de ser um pouco mais exigente, permite o oferecimento de
exemplos extraídos da natureza, de experimentos simples (a física aristotélica
fala, por exemplo, de lugares naturais – sendo lugar natural dos mais pesados
embaixo e dos leves, acima–, o que
permite imaginar Aristóteles lançando pedras e pesos ou, pelo menos, apontando
fatos que fundamentassem suas ideias físicas, de materiais e seres de que
dispunham espaços do Liceu. E, se, realmente, há escritos de Aristóteles que
são compilações de aulas, por conta do estilo de exposição, aquilo que ele fala
de animais, plantas e outros seres vivos, teve embasamento em observações que ele fez e, com
certeza, mostrou a seus estudantes.
Aurélio
Agostinho, teólogo e filósofo cristão que viveu entre os séculos IV (4) e V (5)
d.C., usou como recursos didáticos de exposição escrita de suas ideias, por
exemplo, a confissão – tipo
de obra em que fala de sua vida e das vicissitudes (idas e vindas, coisas boas
e não tão boas) por ele vividas –, como no livro Confissões, e o diálogo,
no estilo platônico, entre ele e seu filho Adeodato, no livro O Mestre (De Magistro). Veja o que foi dito a respeito do debate quando aqui
se tratou de Platão. A confissão
convida cada leitor(a) a mergulhar na reflexão, na meditação e no seu próprio
interior, a fim de compreender o que as palavras dizem e o que para além delas
é dito. Aurélio Agostinho, ademais, fala de um mestre interior (neste caso, Jesus, o fundador do
cristianismo) que ensina e ilumina no caminho da verdade, ou seja, convida
leitoras e leitores a buscar perceber, dentro de si e além, algo que ultrapassa
o ensino comum, tradicional.
No
século II (2) da era cristã, o filósofo Diógenes de Enoanda (cidade da região
da Lícia, na Ásia Menor [atual Turquia]), rico discípulo de Epicuro de Samos,
admirador das ideias deste e desejoso de que as gerações futuras pudessem
também conhecer o pensamento do mestre, resolveu expor em um largo muro as principais ideias do epicurismo,
relativas à moral, à física (estudo e compreensão da natureza). Foi o modo que
encontrou de divulgar a filosofia epicurista. Com efeito, o epicurismo prega
que o prazer, de modo equilibrado, deve ser buscado pelas pessoas todos os
dias. Diz também que as pessoas não devem se preocupar com os deuses e deusas,
que tudo é feito de átomos (ideia similar à de Leucipo e Demócrito, pré-socráticos),
além de outras ideias. Por que um muro
como instrumento didático do ensino de filosofia? As pessoas passam próximas a ele, quem
sabia ler podia ler o conteúdo ali escrito em letras legíveis a certa distância,
pessoas que porventura se reunissem
para discutir e estudar aquelas ideias teriam um meio claro de leitura e
releitura, bem visível a
todos(as), e durável.
Então, Diógenes de Enoanda atentou para a visibilidade, aliada à duração e a
outro fator: a memória! Legível
diaria ou quase diariamente, repetidamente, o conteúdo mais facilmente poderia
entrar na memória das pessoas. Até mesmo quem não soubesse ler, curiosas,
poderiam pedir alguém que lesse para elas! Daí se pode ver que a dimensão didática
do muro estende-se para além dos limites do muro. Na verdade, Diógenes de
Enoanda queria que, refletindo sobre os conteúdos presentes nas doutrinas
epicuristas do muro pudessem vir a aplica-las
e vivencia-las no dia a dia, transformando seu modo de encarar o mundo e a própria
vida. Ademais, para quem não tinha acesso à filosofia fechada entre
discípulos do filósofo tornava-se possível conhece-la e coloca-la em prática na
vida: o muro estava aberto para que um
número maior de pessoas o pudessem ver e ler.
Hipácia
de Alexandria (século V d.C.), filósofa e matemática. Foi professora admirada e
sabia usar bem os recursos de que dispunha para ensinar a filosofia e as
ciências de que tinha conhecimento: objetos
concretos (esferas, modelos astronômicos e matemáticos feitos de
madeira, caixas de areia para a escrita, etc.), juntamente com livros em rolos feitos de papiro e
pergaminho, copiados e recopiados, da e na famosa biblioteca de
Alexandria, da qual a filósofa também fez parte, discussões em torno de temas candentes da filosofia, da
política e do pensamento científico e geral de sua época, questionamentos e problematizações, exercícios, entre outros meios ou recursos didáticos. Dotada
de grande cultura e habilidades excepcionais de ensino.
Tomás
de Aquino (século XIII, 13, da era cristã) fez uso, além da exposição direta (oral) dos conteúdos,
também de outros recursos didáticos comuns em seu tempo, nas escolas catedrais,
monacais e universidades, como o
debate, com posições contrárias (argumentos contra e argumentos a
favor) e conclusões. Nas universidades havia ainda a leitura (o professor leitor lia o texto que, a seguir, era
explicado (explicação) por um
ou mais professores auxiliares e por ele mesmo). Um instrumento escrito muito
didático de que fez uso foi a SUMA.
As sumas são textos que trazem argumentos contra e a favor de um tema, tirando,
ao final, soluções. Seguem bem um modo de debate comum naquela época no âmbito
acadêmico. A Suma Teológica é o livro
mais conhecido de Tomás de Aquino e traz aquele estilo de exposição. E como,
naquele tempo, cópias eram feitas à mão, Tomás dispunha de auxiliares que
faziam cópias do que escrevia e ditava, a fim de oferecer material de estudo
para seus estudantes. Como se vê, até na elaboração dos textos que viriam a ser
lidos por seus estudantes Tomás de Aquino tomou o cuidado de oferece-los de
modo didático, sem perder a profundidade e o rigor que os mesmos textos
demandavam, ainda que influenciado pela estrutura didática de ensino de seu
tempo (debates, leituras orais, explicações a partir das leituras, defesa e
contraposição de teses divergentes, demonstrações lógicas – lembrando aqui, a
lógica formal aristotélica, principalmente – do conhecimento).
No
mundo moderno, que vai, aproximadamente, dos séculos XV (15) e XVIII (18),
alguns filósofos igualmente se preocuparam com os recursos didáticos de que
fizeram uso em seus escritos, na procura da divulgação das ideias filosóficas e
das novidades e descobertas de seu tempo, tanto no campo das ciências quanto no
campo da filosofia propriamente dita. Inicialmente, podem ser apresentados Thomas
More (Thomas Morus) e Francis Bacon. O primeiro escreveu Utopia, o segundo, A Nova
Atlântida, no estilo de histórias
de viajantes de seu tempo (épocas das grandes navegações e descobertas
marítimas). Usam a imaginação e o intelecto, além da erudição simplificada para
que mais pessoas pudessem entender. Imaginam ilhas (lugares e espaços) com
sociedades muito avançadas e justas, pondo em crítica as sociedades europeias
de seu tempo e as visões ultrapassadas de ciência e de mundo.
René
Descartes (século XVII, 17) usou como instrumento de pesquisa e exposição a DÚVIDA, tanto como método
(caminho) quanto exagero, radicalização (hiperbólica) – dúvida metódica e
hiperbólica –, na busca da verdade, o que acabou levando-o à descoberta do Cogito e das verdades que a ele se
seguiram. No campo do ensino, a dúvida pode ser e é um recurso didático
precioso no trabalho de ensino-aprendizagem. Descartes soube usá-lo muito bem.
Blaise
Pascal (1623 – 1662), filósofo francês, e Friedrich Nietzsche (século XIX, 19),
alemão, fizeram uso dos aforismos,
isto é, textos curtos e densos, na exposição de parte de suas ideias. Com
certeza, um recurso didático. Nietzsche também fez uso do romance (obra mais ampla), como Assim Falou Zaratustra, que conta a história de um filósofo,
Zaratustra, que, caminhando por diversos lugares, era o expositor do
super-homem e do eterno retorno do mesmo.
No
século XVIII (18), o filósofo iluminista Voltaire fez uso do conto filosófico (Cândido, Zadig, A Princesa da
Babilônia, uma pluralidade de contos), a fim de levar a filosofia e a
ciência, além das denúncias e sátiras, relativas ao seu tempo, para um público
leitor mais amplo. Usou também o teatro,
o dicionário (Dicionário Filosófico), além de cartas e
outros meios de divulgação do pensamento filosófico, que são, sem sombra de
dúvidas, também recursos didáticos, instrumentos ricos e poderosos de
ensino-aprendizagem de filosofia. Nos contos mesclam-se a histórias de viajantes, a imaginação, a arte de contar histórias, a denúncia que leva à reflexão a respeito da realidade
sócio-política, a criatividade). Voltaire, como Platão, More, Bacon e outros,
soube fazer excelente uso da arte de
contar histórias filosóficas. E como essa arte é tão necessária nos
tempos de hoje!
Ainda
no tempo de Voltaire, o também iluminista Jean-Jacques Rousseau fez uso da
confissão, seguindo o exemplo de Agostinho, e escreveu romances, dos quais o mais conhecido e destacado é Emílio ou Da Educação, no qual faz uso
do recurso didático da arte de contar
histórias, trata do experimento
prático (exemplo, o do ímã), da observação
e do contato com a natureza,
diretamente, como recursos de ensino-aprendizado, entre outros tantos que
aparecem nessa magnífica obra filosófico-literária-educacional. No Emílio, a didática encontra-se também
nas viagens, nos caminhos
percorridos, nos percursos medidos, ao longo dos quais a percepção do mundo ia
se abrindo, se alargando, com o diálogo, a troca de experiências entre mestre
(Rousseau) e aprendiz (Emílio). Se Aristóteles passeava com seus alunos no
Liceu, Rousseau caminhou imaginariamente com Emílio por caminhos diversos, num contato direto e profundo com o objeto
primeiro de aprendizagem: o mundo. O uso dos sentidos e o seu
aguçamento, o trabalho educativo com as mãos, entre outros elementos didáticos,
aparecem claramente no referido livro. A partir do aprendizado direto do mundo,
tempos depois, o aprendizado da leitura e da escrita.
Além
de Nietzsche, no século XIX (19), já mencionado e exemplificado, um texto de
Karl Marx e Friedrich Engels, muito conhecido, o Manifesto do Partido Comunista
expõe, num linguajar que busca ser
simples, sem ser simplório, para trabalhadores e até intelectuais, as
principais ideias e descobertas deles a respeito da história e de sua estrutura
dialética, da luta de classes, do capitalismo, do socialismo e temáticas a
estes afins e de seu partido e suas lutas em favor de mudanças benéficas a
trabalhadores e trabalhadoras. É um texto didático pela sua maneira de abordar
os temas e pela linguagem usada, sem tecnicismo nem rigorismo. Didático
igualmente no encadeamento das
diferentes partes que compõem o opúsculo, formando uma certa unidade,
capaz de ampliar os horizontes da visão de seus leitores e leitoras,
trabalhadores(as), gente comum então (e depois) explorada pelo sistema
capitalista. Marx e Engels também foram homens extremamente cultos, mas que
souberam traduzir numa linguagem didática, para trabalhadores(as) e outros(as),
o pensamento filosófico, econômico e histórico, traduzindo a dialética
hegeliana na prática concreta da história.
Curiosamente,
antes de Marx e Engels, o filósofo, também alemão, Hegel (George Wilhelm
Friedrich Hegel) usou, em alguns momentos de seus pesados (densos) escritos, a
ilustração, isto é, exemplo(s) prático(s) que poderia(m) ajudar na compreensão
de suas ideias. A Dialética do Senhor e
do Escravo, contida na Fenomenologia
do Espírito, é um bom exemplo disto. Imagina dois homens que lutam entre
si, um vence, um perde, mas aos quais o tempo e a relação com a natureza por
meio do trabalho mostrarão uma dependência, síntese dos contrários, meio
didático interessante para explicar exemplificando o que é dialética e o poder
desta. O modo de tratar da dialética, com o exemplo de um senhor e um escravo,
uma história imaginada, traz consigo um modo didático de ensinar, de falar
ou tratar da filosofia, mais especificamente, da dialética.
A
respeito de Hegel, um fato curioso é que, como professor, além de filósofo,
conta-se que ele tinha uma capacidade muito grande de atrair estudantes para
suas aulas. Schopenhauer, outro filósofo alemão, também foi professor na
universidade em que Hegel ensinou, mas que não tinha (não teve) o mesmo público
de Hegel. O estilo didático de ensino de Hegel, com certeza, devia ser muito
rico, sabendo manejar bem as palavras,
aliadas a uma vasta cultura de que dispunha, tornando-as um instrumento
poderoso de comunicação de ideias filosóficas. Palavras que se constituíam em discursos ricos de uma oratória didática
capaz de levar a um conhecimento claro a respeito das ideias filosóficas.
No
século XX (20), Jean-Paul Sartre, em suas obras para um público maior, geral,
como as peças teatrais e os romances, procurou transmitir as
ideias básicas, essenciais, do existencialismo de um modo que muitas pessoas,
leitoras, pudessem entender, assimilar, apelando para a razão e a imaginação,
de modo a tornar-se melhor entendido. Modo que se compara ao da didática
praticada nos processos de ensino-aprendizagem, modo rico de transmitir o
conhecimento filosófico. Jean-Paul Sartre também fez uso de cartas, como forma de
transmissão e esclarecimento de suas ideias.
Albert
Camus (séc. XX [20]), outro filósofo francês, existencialista, de modo similar
a Sartre, também expõe de uma maneira mais comum, em seus romances, a visão
existencialista. Essa exposição é carregada da preocupação de ensinar e ensinar
a cada leitor, de um modo inteligível (compreensível e claro), igualmente
didático, com histórias, discussões, questionamentos
e exemplos, as ideias e os
valores que permeiam a visão existencialista de mundo.
No
Brasil, um exemplo do século XX (20), Paulo Freire, nordestino, pensador da
educação, filósofo e professor (inclusive professor universitário), fez largo
uso de uma didática própria no seu método de ensino e alfabetização, chamado Método Paulo Freire. Começando
pela leitura da vida, ou
seja, da realidade concreta das comunidades e do contexto maior em que vivem,
econômico, social, político e cultural, nos círculos de cultura eram expostas,
inicialmente, situações diversas, vividas pelos trabalhadores e trabalhadoras
em alfabetização. Algum tempo depois, inseriam-se as primeiras palavras,
nascidas de um levantamento prévio, chamadas palavras geradoras – por exemplo:
campo, plantio, colheita, comunidade, trabalho, hora-extra, entre muitas outras
palavras, com as quais aquelas pessoas conviviam no dia a dia e das quais faziam
um uso frequente. Fazia-se, então, uma leitura
da vida e, com ela, a leitura
da palavra, o aprendizado das palavras, a alfabetização em si, mas num
constante diálogo com a leitura da vida. Junto com a leitura das palavras vinha
a conscientização. Freire
deixou muitos livros, riquíssimos, a respeito da educação, além de artigos e
outros escritos.
Ainda
que o trabalho didático com a formação de sílabas e de palavras não fuja do
tradicional, há elementos didáticos do Método Paulo Freire que trazem mudanças
e questionamentos profundos em termos de visão e compreensão do trabalho
educacional:
(a)Pesquisa do universo vocabular:
O grupo de educadores(as), ao chegar à comunidade que será alfabetizada, não
traz cartilhas e livros prontos, acabados. Pelo contrário, fazem todo um
trabalho de pesquisa e discussão conjunta e com a comunidade a respeito dos
costumes, da realidade, do mundo do trabalho, da exploração a que as pessoas
estão sujeitas no trabalho, etc., buscando em suas falas palavras e expressões
que são comuns, relacionadas a essas realidades.
(b)O levantamento das palavras geradoras:
A pesquisa inicial do universo vocabular leva ao levantamento de palavras
geradoras, isto é, de palavras da própria comunidade que virão a servir como
material gerador das discussões nos círculos de cultura, bem como a desenhos e
palavras escritas no quadro ou em cartazes após os debates naqueles círculos.
As palavras são obtidas através de conversas com as pessoas da comunidade, em
debates com grupos que dela fazem parte, com o auxílio de gravações em gravador
ou anotações e, enfim, escolhidas e definidas pelo grupo de
educadores-educandos. Palavras carregadas de sentidos vitais e da experiência
cotidiana das pessoas da comunidade de educandos-educadores.
(c)O círculo de cultura: Em vez da
sala de aula tradicional, com todas as carteiras enfileiradas, o Método Paulo
Freire propõe o círculo de cultura, que pode ser em um salão paroquial, em
alguma sala da comunidade, em um espaço disponível ou até mesmo em qualquer
espaço que permita o trabalho educativo. Círculo, porque as pessoas educandas e
educadoras são postas em roda, de tal modo que possam olhar diretamente nos
olhos de todas as outras e com elas falar da vida, problematizar a vida,
aprender e educar ao mesmo tempo. De cultura: não uma cultura livresca,
definida de cima para baixo, mas aquela cultura que se encontra na vida da
comunidade, a cultura da comunidade, do povo, juntamente com a cultura geral,
da humanidade, relida a partir das situações concretas vividas pelas pessoas e
das contradições socioeconômicas.
(d)A leitura da vida e da realidade em que
ela está envolta: No círculo de cultura, antes de aprender a fazer a
leitura da palavra escrita, as pessoas educandas e educadoras falam da vida,
tratam de temas relacionados ao seu dia a dia, adentrando nos aspectos
econômico, social, político, cultural e outros, pondo assim em questionamento e
problematização os fundamentos injustos da realidade por elas vivida.
(e)A leitura da palavra, que se segue à
leitura da vida: Feita, por algum tempo, a leitura da vida, segue-se a
leitura da palavra propriamente dita. Uma palavra geradora é apresentada, posta
em discussão, desmontada e remontada, com suas sílabas e seus fonemas,
permitindo que cada participante possa ver que o aprendizado do ato de ler não
é estanque, separado, do viver concreto e nas lutas do dia a dia, mas que neste
se insere e com ele dialoga. Uma palavra segue a outra, possibilitando a
formação maior de frases, ideias, textos.
(f)Conscientização: Tomada a
consciência coletiva da vida e de suas contradições e de seus fundamentos
reais, injustos, é hora de agir (conscientiza + ação), buscando coletivamente
transformar a realidade, fazendo um movimento dialético contínuo entre o aprendizado consciente e a transformação da
realidade onde se toda a comunidade se encontra.
Há
outros elementos didáticos. Os seis citados são alguns desses elementos. Um
estudo mais pormenorizado dos livros de Paulo Freire pode ajudar na observação
e obtenção de outros elementos e recursos didáticos do referido método. Há
livros de autores e autoras que também tratam de Paulo Freire. E há livros
escritos por ele que relatam experiências interessantes de alfabetização de
adultos tanto no Brasil quanto em outros lugares onde Freire trabalhou (p. ex.:
no Chile). Na internet encontra-se muita coisa sobre ele. Um site interessante
que pode ser pesquisado é o Paulo Freire: Projeto Memória, em: http://www.projetomemoria.art.br/PauloFreire/biografia/05_biografia_exilio.html
.
O
Método Paulo Freire foi fruto de influências históricas efetivamente vividas
por seu criador, como a observação da situação da classe trabalhadora, do
conhecimento e das vivências de cada educador(a), da bagagem cultural de
educadores(a), do desejo de transformação da realidade, das leituras freireanas
do pensamento marxista, do pensamento cristão (Paulo Freire era católico,
cristão), do conhecimento da dialética etc.
Viviane
Mosé (nascida em 1964), entre as décadas de 1990 e 2000, trabalhou em um
programa de televisão
(Fantástico, da Rede Globo), aos domingos, com o quadro SER OU NÃO SER (audiovisual), no qual tratou de maneira
muito didática da história da filosofia, desde a antiguidade até o século XX,
além de questões filosóficas, como a ética, a política. Os vídeos dessa série
encontram-se, hoje, no Youtube, na internet.
Forma interessante de exposição do pensamento filosófico, o audiovisual exige trabalho em equipe (é claro, no
caso do quadro, a equipe era grande), levantamento
de imagens, por meio de fotografias e gravações, recursos de som e outros
tantos. Porém, o resultado de todo esse trabalho valeu a pena: a
transmissão, de uma maneira diferente do comum, do pensamento filosófico para
uma grande parte da população, a nível nacional. Além de filósofa, Mosé é
professora universitária e escritora. Uma dica: o trabalho com vídeo também é
possível ser feito em sala de aula. Há recursos de vídeo, nos computadores, que
permitem a elaboração. Demanda trabalho em grupos e muita pesquisa, empenho
redobrado de todas as pessoas envolvidas (estudantes, professor, professora,
dinamizador[a] de tecnologias educacionais, caso haja este[a] na escola).
Possuidores
de grande cultura e de erudição, muitos(as) dos(as) filósofos(as) mencionados,
além de outros(as) aqui não expostos(as), souberam conciliar a vastidão dos
conhecimentos ao modo didático de os expor, de os apresentar. Exemplos muito
atuais do que é preciso que seja feito por profissionais da educação, no Brasil
e em todo o mundo, por professoras e professores de Filosofia. Há, com grande
certeza, muito que aprender com a didática de filósofos e filósofas, por meio
de leituras diretas dos livros destes(as), da observação atenta do modo como
procuram transmitir didaticamente o conhecimentos e os valores próprios da
filosofia, em cada época da história. E aplicar em sala de aula. Cultura e
erudição são algo a que cada professor(a), tanto de Filosofia quanto de
quaisquer componentes curriculares (matérias escolares), pode ter acesso e que
deve ser, indubitavelmente, buscado diariamente, juntamente com uma preocupação
constante no saber transmitir os conhecimentos e, muito mais que a transmissão,
fazer reflexões sobre eles, questionando-os, problematizando-os. A filosofia é
arte da reflexão, da crítica (problematização,
questionamento). A reflexão e a crítica estiveram e estão muitíssimo
presentes no pensamento filosófico e na história da filosofia, a cada época, em
cada século.
A reflexão e a crítica,
por sua vez, são frutos de observações, do aprendizado, do conhecimento e de
questionamentos postos diante do mundo e das verdades comumente aceitas como
acabadas ou secularmente tidas como fatos incontestáveis. A observação aguçada, a curiosidade e a crítica (problematização,
questionamento), junto com as novas condições históricas, contribuíram
eficazmente para que filósofos de diversos cantos das antigas colônias gregas
pusessem em dúvida as verdades até então contidas e aceitas nos mitos e
asseguradas pela religião politeísta grega. O debate em torno de ideias de Hegel e da Economia Política,
juntamente com as condições históricas do capitalismo em expansão no século XIX
(19), com a exploração de trabalhadores(as) e até mesmo de crianças,
contribuíram para o estudo mais acurado, a investigação e a crítica
(problematização, questionamento) fossem levados avante por Karl Marx e
Friedrich Engels a respeito do capitalismo, suas bases e sobre a história
humana, surgindo daí as conclusões a respeito de modos de produção, mais valia,
entre outros elementos do mundo econômico, político e ideológico.
Muitas
vezes, estudamos os filósofos e as filósofas sob a luz das teorias que
escreveram e ideias que defenderam. Mas também se pode observar, ao ler cada
um(a) deles(as), que dispõem de um modo de expressar-se para públicos restritos
(intelectuais) e públicos gerais (pessoas comuns). E, nos dois casos, pode-se
observar uma preocupação "didática", isto é, no modo de transmitir e
compartilhar os conhecimentos filosóficos. Uma didática que tem por fim o
aprendizado e uma maior compreensão de quem lê, comparável, de certa maneira, à
preocupação didática de educadoras e educadores de diversos tempos e de hoje. Há,
com grande certeza, muito que aprender com os filósofos e as filósofas de todos
os tempos: desde o que escreviam até a didática que usaram e usam para exprimir
seu pensamento filosófico, suas reflexões sobre o mundo circundante e a
realidade humana.
Curiosamente,
a tal didática na transmissão das ideias filosóficas não é pura invenção do
filósofo, da filósofa, mas um recurso que pode nascer do modo de ensinar de seu
tempo – Tomás de Aquino, por exemplo, fez uso da estrutura argumentativa de
debates universitários, filosóficos e teológicos, de seu tempo – ou
criticando-o, como ocorre, por exemplo, em Rousseau, que busca fugir da
didática tradicional e rígida de sua época, ou usando modos de escrever
expressivos e chamativos que aparecem em poetas e escritores, como é o caso de
Thomas More e de Francis Bacon, que tratam de viagens de navegantes por terras
novas, desconhecidas e civilizações justas e muito avançadas, foram
influenciados pelo seu tempo histórico, com as grandes navegações e o
Renascimento cultural-científico, além de escritores antigos e próximos, que
descreveram viagens fantásticas e até imaginárias.
Voltaire
foi fortemente influenciado até mesmo por fatos de sua própria vida – volta e
meia tinha que viajar para algum lugar, seja fugindo de perseguições, como a
ida à Inglaterra, onde esteve exilado por um tempo, seja por convite, como
quando aceitou um convite do rei Frederico II, da Prússia, entre outras. O
texto “didático” do Manifesto Comunista, de Marx e Engels, nasceu de uma
solicitação do Partido Comunista, do qual fizeram parte, escrito para que
trabalhadores e trabalhadoras pudessem compreender melhor as ideias comunistas
e suas propostas de mudança. E assim por diante.
Os
modos didáticos de transmissão do pensamento filosófico, isto é, de filósofos e
filósofas, enraízam-se, como se pode ver, em condições determinadas, contudo,
seguramente, são carregados de algo novo – novas ideias, novas reflexões, novos
questionamentos, novos problemas aos quais se propõem responder, um novo modo
de ver as coisas, de ver e interpretar o mundo e a realidade humana. Modos didáticos
de ensino-aprendizagem de filosofia que podem ser aprendidos, revistos e
discutidos, ainda hoje, por professoras e professores de filosofia das escolas
de nosso tempo. Didática que pode, inclusive, enriquecer o ensino-aprendizado
escolar da Filosofia!
MATERIAL
PESQUISADO:
DICIO Dicionário Online de Português. Didática. Disponível em: http://www.dicio.com.br/didatica/ Acesso em 06 de
julho de 2016.
"didática",
in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013,
http://www.priberam.pt/dlpo/did%c3%a1tica [consultado em 06-07-2016].
NOVA CULTURAL. OS PENSADORES: Pré-Socráticos, Sócrates,
Platão, Aristóteles, Santo Agostinho, Tomás de Aquino, (Thomas) More, Francis
Bacon, René Descartes, Pascal, Jean-Jacques Rousseau, Hegel, Nietzsche, Marx.
São Paulo, Nova Cultural, 1996. (Coleção Os Pensadores.)
FREIRE, Paulo. Ação cultural para a liberdade, Extensão ou
comunicação?, Medo e Ousadia, e outros. Disponíveis, gratuitamente, em PDF,
em: http://bibliotecauergs.blogspot.com.br/2011/05/livros-de-paulo-freire-disponiveis-para.html
Acessos ao longo de junho e julho de 2016.
GORINA, Harold Roig i. Diogenes of Oinoanda: The Epicurean
Inscription. Disponível em: < http://www.english.enoanda.cat/welcome.html
> Acesso em 04 de setembro de 2016. (Site em inglês e também em catalão, uma
língua neolatina que tem afinidades e certa proximidade com o espanhol e o
português. Em todo caso, pode-se usar tradutores online, que, mesmo não seja
uma tradução perfeita, o que permite ter uma boa ideia do conteúdo. Contém
fotos e a inscrição dos textos dos muros e da antiga cidade de Enoanda, além de
outras informações.)
MOSÉ, Viviane. Ser ou Não Ser? Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=rHp5GXpbd0Q
> Acesso
em 10 de julho de 2016.
VOLTAIRE. Contos. São Paulo, Abril Cultural, 2002.
VOLTAIRE. Dicionário Filosófico. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/cv000022.pdf> Acesso em 10 de
julho de 2016.
WIKIPÉDIA. Hipátia Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Hip%C3%A1tia> Acesso em 08 de julho de 2016.
Sobre a filósofa Hipácia (Hipatia) de Alexandria, a Enciclopédia Ágora (em francês) traz algumas informações e cita uma carta enviada por um amigo (que estava acamado, adoentado, entristecido pela morte dos filhos, mas encorajado a viver) a ela, em:
http://agora.qc.ca/thematiques/mort/dossiers/hypatie
(Pode ser usado o Google Tradutor e\ou outro tradutor online para traduzir o texto francês.)
Ainda sobre Hipácia, o filme ÁGORA (no Brasil com o nome ALEXANDRIA), é muito interessante e pode, inclusive, ser trabalhado em sala de aula no ensino médio. Muito rico. Neste site há um comentário sobre ele. Procure sobre o uso de vídeo no ensino de filosofia, filme Alexandria, em Postagens Antigas.
Sobre a filósofa Hipácia (Hipatia) de Alexandria, a Enciclopédia Ágora (em francês) traz algumas informações e cita uma carta enviada por um amigo (que estava acamado, adoentado, entristecido pela morte dos filhos, mas encorajado a viver) a ela, em:
http://agora.qc.ca/thematiques/mort/dossiers/hypatie
(Pode ser usado o Google Tradutor e\ou outro tradutor online para traduzir o texto francês.)
Ainda sobre Hipácia, o filme ÁGORA (no Brasil com o nome ALEXANDRIA), é muito interessante e pode, inclusive, ser trabalhado em sala de aula no ensino médio. Muito rico. Neste site há um comentário sobre ele. Procure sobre o uso de vídeo no ensino de filosofia, filme Alexandria, em Postagens Antigas.