Uma questão que se coloca, por vezes,
em reuniões de professores e professoras de Filosofia ou dentro de sala de
aula, no estudo das ideias de Sócrates e de sua vida é acerca de sua real
existência. Sócrates, com certeza, é mencionado em três escritores do passado
grego: Platão, Xenofonte e o teatrólogo Aristófanes (As Nuvens).
Sócrates é tido, comumente, por
mestre de Platão e Xenofonte, sobre os quais teria exercido influência no
estilo de expor ideias, com destaque para o debate, mas também uma influência
em termos de moral, de valores humanos, pois aparece, por exemplo, em Platão,
constantemente debatendo questões diversas, em sua maioria de conteúdo moral.
Aristófanes satiriza sua figura na peça As
Nuvens.
Tomando Platão e Xenofonte. Ambos são
escritores, são filósofos. Expressam-se, em seus escritos, com brilhantismo e
maestria. Do primeiro temos, ainda, várias obras, do segundo, um número menor.
O ato de escrever envolve, sem dúvida, conhecimento da língua, destreza para
articular ideias, construir pensamentos escritos, dentre outras qualidades para
que se possa ser um bom escritor. A escrita manifesta valores aprendidos e
desenvolvidos, ao longo da vida, em uma pessoa, por meio das palavras, dos
exemplos, das leituras, das experiências vividas, convivências. Tais valores
podem ser de grupos e até mesmo da classe social a que se pertence, ainda que
não estejam presos necessariamente a esta ou àqueles, podendo ir além ou aquém.
Ora, é preciso, portanto, que alguém tenha ensinado àqueles escritores,
filósofos, e até mesmo Aristófanes passou por aprendizado.
Platão e Xenofonte, para falar dos
mais detalhados a tratar de Sócrates, passaram, desde pequenos, por aprendizados
diversos, aprenderam a leitura em língua grega (talvez também línguas
estrangeiras daquele tempo, pois Platão, por exemplo, conta na Carta Sétima, ter feito viagens por
lugares diferentes), desenvolveram o conhecimento de muitas palavras escritas e
faladas, precisaram aprender a articulá-las de forma ordenada, com certa
retórica, de forma dialética (Platão, para citar novamente, criou diversos
diálogos!). Tomaram contato com a música, a matemática, rudimentos de
astronomia, dentre outros conhecimentos, muitos dos quais aprendidos com
mestres (quem sabe, também com mestras, tias, mães, o que pode não ser
impossível).
Vale lembrar que, naquele
tempo (séculos V\IV a.C.), andavam pela Grécia também os sofistas, professores
itinerantes de retórica, dialética e outras sutilezas no uso da linguagem,
muito procurados por jovens, em sua maioria abastados, que queriam sair-se bem
nas artes de falar bem e de convencer, podendo, com isto, convencer e conquistar pessoas nas
assembleias e locais onde se exercia o poder. Na Grécia Antiga havia ainda os
pedagogos (literalmente, do grego: condutores de crianças), escravos que
conduziam as crianças às escolas. Famílias ricas punham tutores para os filhos.
Portanto, para o menino e, depois, jovem Platão não faltaram mestres, professores.
Além do mais, os livros de Platão e de
Xenofonte expõem valores ético-políticos que eram ideais para a política grega.
Aqueles em que Sócrates se encontra como personagem principal demonstram também
bem isto. Por exemplo: A República, Apologia de Sócrates, Críton, Fédon e outros. A oposição de Platão à corrupção e sua não
concordância com os erros de políticos de sua família que estavam no poder denotam
a não aceitação de algumas situações degradantes da política ateniense e, por
extensão, de outras cidades-estados da Grécia Antiga.
Ora, valores éticos não nascem por acaso. São aprendidos, seja pela educação familiar, pelo contato com pessoas que os ensinam e os vivem, pela observação de pessoas que os praticam, seja até mesmo por meio da educação formal e ainda por meio do testemunho de pessoas que tiveram coragem de dar a vida em defesa dos valores éticos e políticos em que acreditavam. É certo que a imagem de Sócrates que aparece nos escritos platônicos é a de um homem ético e muito preocupado com a política e o bem-estar da cidade-estado, mais especificamente, Atenas e, por extensão, de toda a Grécia, homem com o qual Platão e outros teriam aprendido muito e a quem muito respeitavam, conforme aqueles escritos. E estes escritos nos mostram que Platão cultivava aqueles valores e empenhou-se por defende-los em seus textos e que, portanto, os aprendeu, ao longo da vida, seja com um Sócrates real, seja (também) com outras pessoas preocupadas com a ética na vida política e social.
Ora, valores éticos não nascem por acaso. São aprendidos, seja pela educação familiar, pelo contato com pessoas que os ensinam e os vivem, pela observação de pessoas que os praticam, seja até mesmo por meio da educação formal e ainda por meio do testemunho de pessoas que tiveram coragem de dar a vida em defesa dos valores éticos e políticos em que acreditavam. É certo que a imagem de Sócrates que aparece nos escritos platônicos é a de um homem ético e muito preocupado com a política e o bem-estar da cidade-estado, mais especificamente, Atenas e, por extensão, de toda a Grécia, homem com o qual Platão e outros teriam aprendido muito e a quem muito respeitavam, conforme aqueles escritos. E estes escritos nos mostram que Platão cultivava aqueles valores e empenhou-se por defende-los em seus textos e que, portanto, os aprendeu, ao longo da vida, seja com um Sócrates real, seja (também) com outras pessoas preocupadas com a ética na vida política e social.
Grande parte dos representantes da
filosofia ocidental aceitou e aceita como fato a existência real de Sócrates.
Sem dúvida, em sua imagem, transmitida por filósofos e escritores de seu tempo
(ver os três citados, além de Aristóteles, em cuja obra, aqui e ali aparece o
nome de Sócrates) e de depois (Sêneca, por exemplo, o menciona), estão
representados ideais, valores e práticas que propunham mudanças nas práticas
políticas e nas crenças existentes no mundo grego de seu tempo. Curiosamente, a filosofia grega, antiga, tradicionalmente, tem seus filósofos pré-socráticos (anteriores a Sócrates) e pós-socráticos (posteriores a Sócrates, com destaque para os do período helenístico). Com certeza, o que aconteceu na filosofia grega entre os séculos V e IV a.C., período em que é traçada, datada, a vida de Sócrates, foi fundamental para o pensamento ocidental, deixando marcas na história da filosofia ocidental poucos séculos depois de seus primórdios e até depois, ou melhor, até hoje! Ademais, vale lembrar que tradições costumam ser fortes, mas podem ser questionáveis! Copérnico e Galileu questionaram o geocentrismo e sua tradição (transmissão) e fizeram descobertas fundamentais. Dúvidas e questões enriquecem debates, fazem pensar, refletir, levando a um entendimento maior e até a descobertas, como se pode ver. Vale lembrar que, quando se questiona a existência real de Sócrates, também se põe em questionamento toda uma tradição que a defende. Contudo, todo questionamento faz pensar, rever, buscar respostas, descobrir algo novo que enriquece o conhecimento humano!
Um fato realíssimo é que em torno da
figura de Sócrates e a partir dela formou-se, desde o passado, uma longa tradição
na filosofia ocidental, que chega aos tempos atuais, formou-se e vem se
formando. Não um super-herói, nem um ser divino, nem um mago, mas um homem:
pobre, ex-soldado, que, não aceitando orgulhosamente, com ares de
superioridade, a afirmação délfica de sábio, buscava a verdade através do
debate, da curiosidade, não aceitando também respostas prontas e pré-definidas,
mas empenhando-se para que seus interlocutores se expressassem melhor e que,
principalmente, agissem melhor, se tornassem cidadãos e cidadãs melhores,
buscando um bem maior: o da pólis, da cidade-estado. Um homem que, por sua coragem
de enfrentar de usar a ironia e a maiêutica, de querer partejar algo de novo de
dentro das pessoas, acabou entrando em choque com homens presos ao status quo,
que o acusaram e fizeram de tudo para o levarem à morte. Um homem que formou um
grupo de discípulos e amigos. Um homem que, até o fim, quis levar seus
discípulos a não se desanimarem, mas se manterem como cidadãos respeitosos às
leis e confiantes na existência da eternidade. Um homem, um grande filósofo,
uma grande tradição carregada de valores humanísticos e éticos. Essa imagem e a
própria história da filosofia apontam para a vitalidade socrática.
Nesse tempo, cidades-estados (póleis, plural de pólis - daí: política) cresciam, a agricultura continuava a base da economia, juntamente com o comércio em expansão. Com os debates políticos e a busca de ascensão no âmbito do poder, sofistas (professores-filósofos itinerantes, pagos) preparavam jovens que dispunham de condições e, particularmente, de famílias ricas e influentes (Platão era de uma dessas famílias, em Atenas), para os embates que teriam de enfrentar em assembleias e órgãos do estado (da cidade-estado), ensinando-os e aprimorando-lhes os conhecimentos da dialética, retórica e outras artes fundamentais às funções políticas. Xenofonte e, principalmente, Platão mostram Sócrates discutindo com eles, com argumentos e contra-argumentos. De acordo com a Apologia [Defesa] de Sócrates, de Platão, o mestre não cobrava pelo ensino nas ruas e locais diversos da cidade de Atenas, onde debatia com jovens e outros. É certo que, naquele contexto, homens precisaram fazer uso da palavra, da habilidade de discussão, defesa e ataque de ideias, bem como de valores. Os sofistas eram relativistas, isto é, relativizavam valores. Os grandes filósofos, que a eles chegaram a contrapor-se, tiveram que buscar a fundamentação de valores e até mesmo da verdade e do conhecimento. Platão e Xenofonte aprenderam com alguém, ou melhor, com diferentes pessoas, desde os conhecimentos elementares com a família e na educação básica, até níveis mais amplos de aprendizagem e argumentação, com certeza.
Um outro fato, a ágora, espaço público de debates que havia em Atenas e em outras cidades da antiguidade grega e, depois, helenística, dava espaço para que pensadores, como o Sócrates que aparece nos diálogos daqueles filósofos (Xenofonte e, especialmente, Platão) e nas Nuvens, peça teatral de Aristófanes (teatrólogo), surgissem, sendo ouvidos por jovens e adultos, incluindo, certamente, mulheres. Ademais, debates dos mais diversos tipos eram feitos em festas, reuniões e encontros, em casas de famílias abastadas, naquele tempo - Sócrates, por exemplo, aparece debatendo em casas de amigos, com sofistas e outras pessoas (ex.: Diotima, uma pensadora, no Banquete, de Platão, sobre o amor); depois de um culto, Sócrates encontra-se com amigos, em uma casa, onde debate sobre a justiça e outros temas éticos-políticos, na República, de Platão. Esses registros, literários-filosóficos, apontam para o fato de que debates daqueles tipos eram comuns na Grécia antiga e Platão - até mesmo Xenofonte e outros - foi (foram) participante(s), como ouvinte(s) de debatedores (como foi dito, o Sócrates de Platão foi um grande debatedor) e devem ter entrado em tais debates.
Não há, aqui, qualquer interesse em pôr fim à discussão, muito rica, posta, de tempos em tempos, pela questão acima. Apenas acrescentar elementos que possam ajudar professores e professoras do Ensino Médio, em sala de aula, em seus debates com as turmas de estudantes. E vale a pena uma boa pesquisa de livros que tratam de Sócrates ou se referem a ele, desde livros didáticos até mais complexos, além, é claro, dos filósofos e escritores da história da filosofia que o apresentam. Ademais, é fundamental que a referida discussão continue, possibilitando assim o acréscimo de novidades e descobertas ricas para o pensamento filosófico.
Nesse tempo, cidades-estados (póleis, plural de pólis - daí: política) cresciam, a agricultura continuava a base da economia, juntamente com o comércio em expansão. Com os debates políticos e a busca de ascensão no âmbito do poder, sofistas (professores-filósofos itinerantes, pagos) preparavam jovens que dispunham de condições e, particularmente, de famílias ricas e influentes (Platão era de uma dessas famílias, em Atenas), para os embates que teriam de enfrentar em assembleias e órgãos do estado (da cidade-estado), ensinando-os e aprimorando-lhes os conhecimentos da dialética, retórica e outras artes fundamentais às funções políticas. Xenofonte e, principalmente, Platão mostram Sócrates discutindo com eles, com argumentos e contra-argumentos. De acordo com a Apologia [Defesa] de Sócrates, de Platão, o mestre não cobrava pelo ensino nas ruas e locais diversos da cidade de Atenas, onde debatia com jovens e outros. É certo que, naquele contexto, homens precisaram fazer uso da palavra, da habilidade de discussão, defesa e ataque de ideias, bem como de valores. Os sofistas eram relativistas, isto é, relativizavam valores. Os grandes filósofos, que a eles chegaram a contrapor-se, tiveram que buscar a fundamentação de valores e até mesmo da verdade e do conhecimento. Platão e Xenofonte aprenderam com alguém, ou melhor, com diferentes pessoas, desde os conhecimentos elementares com a família e na educação básica, até níveis mais amplos de aprendizagem e argumentação, com certeza.
Um outro fato, a ágora, espaço público de debates que havia em Atenas e em outras cidades da antiguidade grega e, depois, helenística, dava espaço para que pensadores, como o Sócrates que aparece nos diálogos daqueles filósofos (Xenofonte e, especialmente, Platão) e nas Nuvens, peça teatral de Aristófanes (teatrólogo), surgissem, sendo ouvidos por jovens e adultos, incluindo, certamente, mulheres. Ademais, debates dos mais diversos tipos eram feitos em festas, reuniões e encontros, em casas de famílias abastadas, naquele tempo - Sócrates, por exemplo, aparece debatendo em casas de amigos, com sofistas e outras pessoas (ex.: Diotima, uma pensadora, no Banquete, de Platão, sobre o amor); depois de um culto, Sócrates encontra-se com amigos, em uma casa, onde debate sobre a justiça e outros temas éticos-políticos, na República, de Platão. Esses registros, literários-filosóficos, apontam para o fato de que debates daqueles tipos eram comuns na Grécia antiga e Platão - até mesmo Xenofonte e outros - foi (foram) participante(s), como ouvinte(s) de debatedores (como foi dito, o Sócrates de Platão foi um grande debatedor) e devem ter entrado em tais debates.
Não há, aqui, qualquer interesse em pôr fim à discussão, muito rica, posta, de tempos em tempos, pela questão acima. Apenas acrescentar elementos que possam ajudar professores e professoras do Ensino Médio, em sala de aula, em seus debates com as turmas de estudantes. E vale a pena uma boa pesquisa de livros que tratam de Sócrates ou se referem a ele, desde livros didáticos até mais complexos, além, é claro, dos filósofos e escritores da história da filosofia que o apresentam. Ademais, é fundamental que a referida discussão continue, possibilitando assim o acréscimo de novidades e descobertas ricas para o pensamento filosófico.