sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

SÓCRATES EXISTIU DE FATO OU É UMA PERSONAGEM DE PLATÃO? (Prof. José Antônio Brazão.)

Uma questão que se coloca, por vezes, em reuniões de professores e professoras de Filosofia ou dentro de sala de aula, no estudo das ideias de Sócrates e de sua vida é acerca de sua real existência. Sócrates, com certeza, é mencionado em três escritores do passado grego: Platão, Xenofonte e o teatrólogo Aristófanes (As Nuvens).

Sócrates é tido, comumente, por mestre de Platão e Xenofonte, sobre os quais teria exercido influência no estilo de expor ideias, com destaque para o debate, mas também uma influência em termos de moral, de valores humanos, pois aparece, por exemplo, em Platão, constantemente debatendo questões diversas, em sua maioria de conteúdo moral. Aristófanes satiriza sua figura na peça As Nuvens.

Tomando Platão e Xenofonte. Ambos são escritores, são filósofos. Expressam-se, em seus escritos, com brilhantismo e maestria. Do primeiro temos, ainda, várias obras, do segundo, um número menor. O ato de escrever envolve, sem dúvida, conhecimento da língua, destreza para articular ideias, construir pensamentos escritos, dentre outras qualidades para que se possa ser um bom escritor. A escrita manifesta valores aprendidos e desenvolvidos, ao longo da vida, em uma pessoa, por meio das palavras, dos exemplos, das leituras, das experiências vividas, convivências. Tais valores podem ser de grupos e até mesmo da classe social a que se pertence, ainda que não estejam presos necessariamente a esta ou àqueles, podendo ir além ou aquém. Ora, é preciso, portanto, que alguém tenha ensinado àqueles escritores, filósofos, e até mesmo Aristófanes passou por aprendizado.

Platão e Xenofonte, para falar dos mais detalhados a tratar de Sócrates, passaram, desde pequenos, por aprendizados diversos, aprenderam a leitura em língua grega (talvez também línguas estrangeiras daquele tempo, pois Platão, por exemplo, conta na Carta Sétima, ter feito viagens por lugares diferentes), desenvolveram o conhecimento de muitas palavras escritas e faladas, precisaram aprender a articulá-las de forma ordenada, com certa retórica, de forma dialética (Platão, para citar novamente, criou diversos diálogos!). Tomaram contato com a música, a matemática, rudimentos de astronomia, dentre outros conhecimentos, muitos dos quais aprendidos com mestres (quem sabe, também com mestras, tias, mães, o que pode não ser impossível).

Vale lembrar que, naquele tempo (séculos V\IV a.C.), andavam pela Grécia também os sofistas, professores itinerantes de retórica, dialética e outras sutilezas no uso da linguagem, muito procurados por jovens, em sua maioria abastados, que queriam sair-se bem nas artes de falar bem e de convencer, podendo, com isto, convencer e conquistar pessoas nas assembleias e locais onde se exercia o poder. Na Grécia Antiga havia ainda os pedagogos (literalmente, do grego: condutores de crianças), escravos que conduziam as crianças às escolas. Famílias ricas punham tutores para os filhos. Portanto, para o menino e, depois, jovem Platão não faltaram mestres, professores.

 Além do mais, os livros de Platão e de Xenofonte expõem valores ético-políticos que eram ideais para a política grega. Aqueles em que Sócrates se encontra como personagem principal demonstram também bem isto. Por exemplo: A República, Apologia de Sócrates, Críton, Fédon e outros. A oposição de Platão à corrupção e sua não concordância com os erros de políticos de sua família que estavam no poder denotam a não aceitação de algumas situações degradantes da política ateniense e, por extensão, de outras cidades-estados da Grécia Antiga.

Ora, valores éticos não nascem por acaso. São aprendidos, seja pela educação familiar, pelo contato com pessoas que os ensinam e os vivem, pela observação de pessoas que os praticam, seja até mesmo por meio da educação formal e ainda por meio do testemunho de pessoas que tiveram coragem de dar a vida em defesa dos valores éticos e políticos em que acreditavam. É certo que a imagem de Sócrates que aparece nos escritos platônicos é a de um homem ético e muito preocupado com a política e o bem-estar da cidade-estado, mais especificamente, Atenas e, por extensão, de toda a Grécia, homem com o qual Platão e outros teriam aprendido muito e a quem muito respeitavam, conforme aqueles escritos. E estes escritos nos mostram que Platão cultivava aqueles valores e empenhou-se por defende-los em seus textos e que, portanto, os aprendeu, ao longo da vida, seja com um Sócrates real, seja (também) com outras pessoas preocupadas com a ética na vida política e social.

Grande parte dos representantes da filosofia ocidental aceitou e aceita como fato a existência real de Sócrates. Sem dúvida, em sua imagem, transmitida por filósofos e escritores de seu tempo (ver os três citados, além de Aristóteles, em cuja obra, aqui e ali aparece o nome de Sócrates) e de depois (Sêneca, por exemplo, o menciona), estão representados ideais, valores e práticas que propunham mudanças nas práticas políticas e nas crenças existentes no mundo grego de seu tempo. Curiosamente, a filosofia grega, antiga, tradicionalmente, tem seus filósofos pré-socráticos (anteriores a Sócrates) e pós-socráticos (posteriores a Sócrates, com destaque para os do período helenístico). Com certeza, o que aconteceu na filosofia grega entre os séculos V e IV a.C., período em que é traçada, datada, a vida de Sócrates, foi fundamental para o pensamento ocidental, deixando marcas na história da filosofia ocidental poucos séculos depois de seus primórdios e até depois, ou melhor, até hoje! Ademais, vale lembrar que tradições costumam ser fortes, mas podem ser questionáveis! Copérnico e Galileu questionaram o geocentrismo e sua tradição (transmissão) e fizeram descobertas fundamentais. Dúvidas e questões enriquecem debates, fazem pensar, refletir, levando a um entendimento maior e até a descobertas, como se pode ver. Vale lembrar que, quando se questiona a existência real de Sócrates, também se põe em questionamento toda uma tradição que a defende. Contudo, todo questionamento faz pensar, rever, buscar respostas, descobrir algo novo que enriquece o conhecimento humano!

Um fato realíssimo é que em torno da figura de Sócrates e a partir dela formou-se, desde o passado, uma longa tradição na filosofia ocidental, que chega aos tempos atuais, formou-se e vem se formando. Não um super-herói, nem um ser divino, nem um mago, mas um homem: pobre, ex-soldado, que, não aceitando orgulhosamente, com ares de superioridade, a afirmação délfica de sábio, buscava a verdade através do debate, da curiosidade, não aceitando também respostas prontas e pré-definidas, mas empenhando-se para que seus interlocutores se expressassem melhor e que, principalmente, agissem melhor, se tornassem cidadãos e cidadãs melhores, buscando um bem maior: o da pólis, da cidade-estado. Um homem que, por sua coragem de enfrentar de usar a ironia e a maiêutica, de querer partejar algo de novo de dentro das pessoas, acabou entrando em choque com homens presos ao status quo, que o acusaram e fizeram de tudo para o levarem à morte. Um homem que formou um grupo de discípulos e amigos. Um homem que, até o fim, quis levar seus discípulos a não se desanimarem, mas se manterem como cidadãos respeitosos às leis e confiantes na existência da eternidade. Um homem, um grande filósofo, uma grande tradição carregada de valores humanísticos e éticos. Essa imagem e a própria história da filosofia apontam para a vitalidade socrática.

Nesse tempo, cidades-estados (póleis, plural de pólis - daí: política) cresciam, a agricultura continuava a base da economia, juntamente com o comércio em expansão. Com os debates políticos e a busca de ascensão no âmbito do poder, sofistas (professores-filósofos itinerantes, pagos) preparavam jovens que dispunham de condições e, particularmente, de famílias ricas e influentes (Platão era de uma dessas famílias, em Atenas), para os embates que teriam de enfrentar em assembleias e órgãos do estado (da cidade-estado), ensinando-os e aprimorando-lhes os conhecimentos da dialética, retórica e outras artes fundamentais às funções políticas. Xenofonte e, principalmente, Platão mostram Sócrates discutindo com eles, com argumentos e contra-argumentos. De acordo com a Apologia [Defesa] de Sócrates, de Platão, o mestre não cobrava pelo ensino nas ruas e locais diversos da cidade de Atenas, onde debatia com jovens e outros. É certo que, naquele contexto, homens precisaram fazer uso da palavra, da habilidade de discussão, defesa e ataque de ideias, bem como de valores. Os sofistas eram relativistas, isto é, relativizavam valores. Os grandes filósofos, que a eles chegaram a contrapor-se, tiveram que buscar a fundamentação de valores e até mesmo da verdade e do conhecimento. Platão e Xenofonte aprenderam com alguém, ou melhor, com diferentes pessoas, desde os conhecimentos elementares com a família e na educação básica, até níveis mais amplos de aprendizagem e argumentação, com certeza.

Um outro fato, a ágora, espaço público de debates que havia em Atenas e em outras cidades da antiguidade grega e, depois, helenística, dava espaço para que pensadores, como o Sócrates que aparece nos diálogos daqueles filósofos (Xenofonte e, especialmente, Platão) e nas Nuvens, peça teatral de Aristófanes (teatrólogo), surgissem, sendo ouvidos por jovens e adultos, incluindo, certamente, mulheres. Ademais, debates dos mais diversos tipos eram feitos em festas, reuniões e encontros, em casas de famílias abastadas, naquele tempo - Sócrates, por exemplo, aparece debatendo em casas de amigos, com sofistas e outras pessoas (ex.: Diotima, uma pensadora, no Banquete, de Platão, sobre o amor); depois de um culto, Sócrates encontra-se com amigos, em uma casa, onde debate sobre a justiça e outros temas éticos-políticos, na República, de Platão. Esses registros, literários-filosóficos, apontam para o fato de que debates daqueles tipos eram comuns na Grécia antiga e Platão - até mesmo Xenofonte e outros - foi (foram) participante(s), como ouvinte(s) de debatedores (como foi dito, o Sócrates de Platão foi um grande debatedor) e devem ter entrado em tais debates.

Não há, aqui, qualquer interesse em pôr fim à discussão, muito rica, posta, de tempos em tempos, pela questão acima. Apenas acrescentar elementos que possam ajudar professores e professoras do Ensino Médio, em sala de aula, em seus debates com as turmas de estudantes. E vale a pena uma boa pesquisa de livros que tratam de Sócrates ou se referem a ele, desde livros didáticos até mais complexos, além, é claro, dos filósofos e escritores da história da filosofia que o apresentam. Ademais, é fundamental que a referida discussão continue, possibilitando assim o acréscimo de novidades e descobertas ricas para o pensamento filosófico.

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

JOGO DA MEMÓRIA FILOSÓFICO (Prof. José Antônio Brazão.)

Uma atividade interessante, que pode ser trabalhada no ensino de Filosofia, é o jogo da memória. Abaixo vai um exemplo.
JOGO DA MEMÓRIA FILOSÓFICO – OPOSTOS:
LIBERALISMO
Sistema ou proposta econômica e política que defende a liberdade de mercado e a mínima intervenção do Estado na economia capitalista.
SOCIALISMO
Sistema econômico e político que opõe-se ao capitalismo, é favorável à intervenção do Estado na economia e propõe uma sociedade igualitária.
IDEALISMO
Filosofia para a qual as ideias (formas/espírito) são o fundamento do real. Ex.: a filosofia platônica, que afirma a realidade do mundo das Ideias; Hegel.
MATERIALISMO
Filosofia para a qual tudo é resultado de interações da matéria, inclusive o ser humano. Marx aplicou a dialética ao materialismo.
RACIONALISMO
Filosofia ou corrente filosófica para a qual o conhecimento verdadeiro baseia-se na razão. Ex.: René Descartes.
EMPIRISMO (ex.: Locke)
Filosofia ou corrente filosófica para a qual o conhecimento verdadeiro tem por base a experiência (empiria, gr) sensível.
ATEISMO
Tendência de pensamento que crê na inexistência de Deus. A = não. Theós = Deus. Para os ateus Deus não existe de verdade.
RELIGIOSIDADE
Tendência de pensamento dos que creem na existência real de Deus ou de deuses, do transcendente.
REALISMO DOS UNIVERSAIS
No mundo medieval, os realistas defendiam a existência real dos conceitos/termos gerais, universais. Eles têm uma existência própria ou na mente de Deus.
NOMINALISMO DOS UNIVERSAIS
No mundo medieval, para os nominalistas os conceitos/termos universais seriam apenas nomes, emissões de voz, não existindo em realidade separada.
TEOCENTRISMO
Colocação de Deus no centro das reflexões e como fundamento da realidade. Tudo depende de Deus, que é a realidade primeira e última de todas as coisas.
ANTROPOCEN-
TRISMO
Valorização do homem (antropo, em grego), como ser capaz de elaborar o conhecimento, de conhecer e de agir sobre o mundo.
ABSOLUTISMO MONÁRQUICO
Governo em que o poder absoluto é exercido pelo monarca (rei ou rainha). O poder é supremo e é transmitido por meio da descendência, dentro da família real (rei/rainha).
REPUBLICANISMO
Sistema de governo em que o poder é exercido por representantes escolhidos pelo povo de cada país. O poder é temporal, disputável e não é transmitido, por descendência, de pai para filho.
EXPLICAÇÃO MITOLÓGICA DA REALIDADE
Tudo é explicado através dos mitos, relatos sagrados que falam de deuses, deusas e seres transcendentes.
EXPLICAÇÃO FILOSÓFICA DA REALIDADE
Tipo de explicação que apela para a observação e a explicação da realidade fundamentada na pesquisa racional.
PLATONISMO
Corrente filosófica que tem suas raízes nas ideias do filósofo grego Platão (séc. V/IV a.C.). Platão apontava para a existência do Mundo das Ideias. Em A República propôs uma cidade ideal.
ARISTOTELISMO
Corrente filosófica que tem suas raízes nas ideias do filósofo grego Aristóteles (séc. IV a.C.). Criticava o idealismo do mestre e não cria na possibilidade de cidade ideal, como Platão.
EVOLUCIONISMO
Teoria e descoberta que afirma que todos os seres vivos evoluíram a partir de formas vivas primitivas. A vida surgiu, há bilhões de anos, como resultado de interações moleculares, na água, e vem evoluindo.
CRIACIONISMO BÍBLICO
Crença religiosa, baseada na Bíblia, que afirma a criação do mundo e dos seres vivos, tal como existem hoje, por Deus. Ex.: Gênesis 1 – 3.
VERDADE DOS ARGUMENTOS
Verdade que ocorre quando os argumentos apresentados correspondem à realidade e a premissas (cada parte do argumento, as quais desembocam em uma conclusão) verdadeiras.
FALSIDADE DOS ARGUMENTOS
Falsidade que ocorre quando os argumentos apresentados não correspondem à realidade nem a premissas  verdadeiras. Cada premissa é uma parte do argumento e elas desembocam em uma conclusão.
CETICISMO
Para os céticos não é possível haver o conhecimento da verdade, pondo sua possibilidade em dúvida (sképsis, em grego).
Exemplos: Filósofos do grupo dos sofistas, Pirro de Élis (ceticismo radical), Hume (não radical).
 
DOGMATISMO
Doutrinas que se impõem como verdades (dogmas) inques-tionáveis e que não aceitam contestação. Há dogmas, por exemplo, nas religiões, mas também pode ocorrer o dogmatismo na ciência e na filosofia.
Recortar as pequenas fichas. Para ficarem iguais em tamanho, poder-se-á colá-las em folhas com quadrados de mesmo tamanho e, a seguir, fazer o recorte.
1) Distribuir a turma em duplas ou trios. Um jogo para cada uma: misturam-se os papéis recortados; cada um(a), por sua vez, escolhe dois, formando pares. Quem fizer mais pares vence a brincadeira. Leva de dez a quinze minutos, talvez menos, dependendo de cada pequeno grupo e da quantidade de pares a formar.
2) Sugestão ao professor e à professora de Filosofia: peça que estudantes leiam, um a um, cada quadrinho, após terminada a primeira parte. Peça que expliquem o que entenderam e, a seguir, você mesmo(a) poderá fazer as explicações devidas e necessárias.
3) É um recurso rico de aprendizado e foge um pouco do quadro e da aula puramente expositiva. Bom proveito!