sábado, 21 de novembro de 2015

CALIGRAFIA COM FILOSOFIA (Prof. José Antônio Brazão.)


Uma possibilidade de recurso didático simples, no ensino-aprendizado de Filosofia é a realização de reescrita caligráfica de pequenos textos filosóficos. Atividade em cadernos de caligrafia ou comuns. Na primeira linha da página, em cada folha do caderno vai um trecho do pensamento de uma filósofa ou filósofo, podendo estender-se em outras partes ou trechos significativos nas páginas seguintes. Repete-se o trecho, por escrito, nas linhas da página, buscando acompanhar a caligrafia proposta (uma boa caligrafia). Fazendo caligrafia, além de melhorar a letra, o(a) estudante lê filosofia!!

Objetivos: (a) Aprendizado de Filosofia. (b) Contato com textos de filósofas e filósofos diretamente. (c) Melhorar a caligrafia. O texto para aprendizado caligráfico poderá ser, por exemplo, um fragmento curto e significativo de algum filósofo pré-socrático. Ou vários fragmentos, um para cada página do caderno de caligrafia. Poderá ser um pequeno aforismo de Friedrich Nietzsche ou de Blaise Pascal, versos de poemas de Voltaire, um pensamento curto de algum livro de Albert Camus, entre outros tantos textos de filósofos e filósofas a escolher. Cinco linhas enumeradas por dia. Exemplo em linhas parecidas com as de caderno de caligrafia (3 linhas para treino):

“Tales diz que a água é o princípio de todas as coisas.” (parte do fragmento 3 – Aristóteles)
 
 
 
 
 
 
 
 

A fonte da primeira linha é French Script MT, parecida com uma escrita à mão. Nas demais linhas, o treino caligráfico. Como foi dito antes, pode ser em linhas de caderno comum. Veja um exemplo abaixo:

“Eis as teorias de Demócrito. Na origem de todas as coisas estão os átomos e o vazio (...).” (Diógenes L.)
 
 
 
 

Trechos tirados de:  BORNHEIM, Gerd A. (org.). Os Filósofos Pré-Socráticos. São Paulo, Cultrix, 1998.

A atividade é livre, proposta, não pode ser obrigatória. Mas pode enriquecer o aprendizado!! Pode ser aplicada também para crianças que tenham, em seu currículo escolar, a matéria (componente curricular) Filosofia. A proposta da caligrafia filosófica poderá ser feita oralmente e por escrito, num canto do quadro. As letras e tipos modelos de escritas de palavras poderão ser escolhidos de um livro de caligrafia ou seguindo o de alguém que tenha uma letra bonita (caligrafia é uma palavra provinda do grego e que significa, justamente, escrita bonita), não para cópia imitativa, mas como meio de obtenção de uma escrita melhor, própria e mais bela, compreensível.

Pode ser positiva a repetição da frase, por cinco vezes, na escrita das linhas, para a assimilação-memorização da mesma. Entretanto, para muito além do decoreba, é preciso que também haja reflexão e problematização de cada frase, com possível discussão em sala de aula, dependendo do número de estudantes que estiverem passando pela experiência da caligrafia com filosofia. Um círculo de estudantes e professor(a), certamente, poderá ajudar na descoberta de ideias interessantes que estejam contidas em cada frase, tendo em vista que cada estudante aponta uma ideia, um pensamento reflexivo acerca do conteúdo em estudo-discussão.

No que tange à qualidade da escrita das pessoas, incluindo de professores, professoras e estudantes, vale lembrar que ela é fundamental para uma boa compreensão dos conteúdos escritos, nelas expostos. Uma boa escrita é mais facilmente compreensível. E mesmo em um mundo em que há computadores, tablets, celulares e outros aparelhos eletroeletrônicos que dispõem de sistemas de escrita, nos quais se pode escolher até o tipo de escrita, em algum momento da vida e do dia a dia faz-se necessário o uso da escrita manual (manuscrita): aquele bilhete, aquele lembrete, aquele rascunho, entre outras possibilidades de uso da escrita com a(s) mão(s), caneta ou lápis e papel. Portanto, melhorar a escrita manual é uma boa ideia! Isto serve para docentes também. Professores e professoras devem buscar escrever inteligivelmente bem, inclusos(as) estudantes. O recurso didático aqui proposto dirige-se, particularmente, a cada estudante, aliando-se ao aprendizado de Filosofia!

Em sala de aula poderão ser trocadas experiências e ideias presentes nos trechos utilizados na atividade. A cada bimestre, conforme o conteúdo em estudo em Filosofia, poderão renovar-se os trechos de livros e textos escritos por filósofos e filósofas de cada período, relacionados. Os livros didáticos costumam trazer trechos e pequenos textos de filósofos e filósofas. Verifique e faça bom uso deles. Professor(a), fale dos aspectos positivos desta atividade. Com certeza, você encontrará estudantes e turmas que topem a proposta. Faça você também!

Comentário do primeiro trecho caligráfico dado como exemplo: “Tales diz que a água é o princípio de todas as coisas.” (parte do fragmento 3 – Aristóteles). Os primeiros filósofos gregos, que viveram entre os séculos VII e início do IV, aproximadamente, chamados pré-socráticos ou físicos (físicos por estudarem a physis, isto é, a natureza, conforme o grego), buscaram compreender o mundo (o cosmos – palavra grega que indica harmonia, beleza, referindo-se, aqui, à harmonia de todos os astros e seres) para além do modo como os mitos o explicavam, chegando a divergir destes.

Os pré-socráticos foram imprescindíveis para um salto no conhecimento do universo e das realidades terrestre e humana, empenhando-se por entender a realidade natural a partir dela mesma, fugindo dos modelos religiosos. Anaxágoras, um deles, por exemplo, era ateu. Simplício, citado no texto de Gerd Bornheim, no fragmento 4 citado, diz que Tales “parece ter sido ateu” (BORNHEIM, G. Op. Cit., p.23). Ainda que nem todos os pré-socráticos tivessem sido ateus, os passos que deram na busca da compreensão do universo foram fundamentais para o nascimento da filosofia e das ciências ocidentais. Tales foi o primeiro filósofo grego e, observando a quantidade imensa de água na Terra – nos mares, rios, riachos, lagos, corpos dos seres, nos frutos, etc. – concluiu que esta foi o princípio originário (a arqué ou arché, em grego) de tudo que existe, estando presente em tudo. Hoje, a ciência sabe que todos os seres vivos tiveram sua origem inicial na água! Fósseis e outras descobertas mostram bem isto.

O segundo trecho, de Demócrito (séc. V\IV a.C.), diz o seguinte: “Eis as teorias de Demócrito. Na origem de todas as coisas estão os átomos e o vazio (...).” (Diógenes L.). Demócrito foi discípulo de Leucipo, na cidade de Abdera, e ambos, com base, certamente, em experimentos simples, muita observação e racionalização, aliados à imaginação, concluíram que tudo é feito de átomos, ou seja, partículas minúsculas e indivisíveis (átomo é uma palavra grega que significa indivisível, que não pode ser dividido). Uma experiência que você pode fazer: rasgue uma folha de papel ao máximo que puder, até onde for possível, podendo usar tesoura. Use uma lupa para ver. Você verá que aqueles pedaços minúsculos de papel podem ser ainda mais divididos, até chegar ao que Leucipo e Demócrito definiram como átomos (hoje divisíveis)! E junto com os átomos, o VAZIO! Hoje se sabe que o universo tem grandes espaços vazios! O espaço vazio foi o que possibilitou o resfriamento das subpartículas originais, provindas do Big Bang (a grande explosão que deu origem ao universo). Neste ponto, o da existência e convivência dos átomos e do vazio, intuitiva e imaginariamente, Leucipo e, particularmente, Demócrito, do qual se sabe mais, deram um grande passo, seguido, posteriormente, por muitos outros homens e mulheres cientistas e filósofos(as)!

Veja quantas coisas puderam ser tiradas de dois trechos curtos, propostos aqui como ponto de apoio para o aprendizado de caligrafia e Filosofia! Outras tantas ideias poderão ser descobertas em textos curtos e trechos ou frases de outros filósofos e filósofas! Imagine o quanto um simples trabalho com a CALIGRAFIA pode, de repente, ajudar no aprendizado rico da FILOSOFIA, além de ajudar a melhorar a letra e a escrita manual de estudantes que topem a proposta!

E quem é professor(a) sabe muito bem o quanto é difícil decifrar a escrita de certos(as) estudantes, presente em questões abertas e em redações. Isto não vale só para quem tem letra feia. Também serve para quem tem uma letra, ou melhor, uma escrita de boa qualidade, bonita e a queira aprimorar. O ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio, por exemplo, cobra, em suas avaliações, uma redação. Escrever bem, corretamente, dentro das normas da língua portuguesa formal, padrão, e com uma escrita bonita (caligrafia boa), demonstrando conhecimento e capacidade de argumentar, pode(m) ajudar muito na hora de fazer a tal redação do ENEM! Professor(a) de Filosofia, pense nisto na hora de conversar com as turmas a respeito da proposta de caligrafia filosófica. Todo mundo terá muito a ganhar! O aprendizado de Filosofia, igual e demasiadamente!

Só reforçando: atividade livre, não obrigatória, mas que, bem conduzida e bem feita, tem grande potencial de enriquecimento de aprendizado. Em termos de avaliação, você, professor(a) de Filosofia, poderá até dar uns pontos extras a quem participar da proposta, ainda que não sejam necessários, pois uma escrita bonita (caligrafia) tem validade para a vida toda, juntando ao que se pode aprender em termos de conhecimentos filosóficos!


Semanalmente você, professor(a), poderá propor cinco ou seis (talvez sete) frases significativas de filósofos e filósofas  em estudo (ou aleatoriamente, mas para discussões) – uma para cada dia útil da semana e uma página do caderno de caligrafia. Enumere cada uma – 1 para a segunda-feira, 2 para a terça, e assim por diante. Faça uma boa pesquisa e as escolha. Bons debates e excelente proveito a todos(as)!